Raquel Dodge assume PGR em meio a uma forte divisão interna pela Lava Jato
Em sua posse, procuradora-geral diz que órgão tem de agir em outras áreas além do combate à corrupção

Raquel Dodge assume a Procuradoria-Geral da República em um momento de divisão da principal instituição responsável por investigar a corrupção da cúpula política do Brasil. A cerimônia de posse da nova procuradora-geral nesta segunda-feira, testemunhada por dezenas de parlamentares e pelo presidente e investigado Michel Temer (PMDB), deixou ainda mais claro esse racha. Seu antecessor no cargo, Rodrigo Janot, e alguns de seus assessores não compareceram ao evento, algo incomum nesse tipo de solenidade no Ministério Público Federal. Ele alegou não ter sido convidado. Ao que ela diz que o cerimonial o chamou, sim.
Seu primeiro desafio será tentar unificar os procuradores e blindar sua equipe da influência de Janot, de quem ela é adversária política. Alguns dos aliados dela dizem que Raquel Dodge até poderia abrir uma apuração interna para apurar a conduta de seu antecessor. Janot ficou marcado no fim do mandato por apresentar duas denúncias criminais contra o presidente Temer, por ter revogado um dos mais bombásticos acordos de delação premiada (o feito pelos executivos da JBS) e por também ter agido contra um procurador, Ângelo Goulart Vilela, e um ex-procurador, Marcelo Miller. Ambos já foram do grupo mais próximo do ex-chefe do Ministério Público. Vilela chegou a ser preso sob a suspeita de receber propina da JBS para repassar informações sobre apurações – o que ele nega. Já Miller, pediu exoneração do Ministério Público e é investigado por ter orientado os executivos da mesma empresa a gravarem autoridades para assinarem a delação premiada.
Um sinal de mudança de rumo foi dado antes mesmo de Dodge assumir a função. Assim que foi escolhida por Temer para a função, ela anunciou que previa alterar o organograma da instituição, criando quatro novas secretarias e trocar ao menos dois procuradores membros da Lava Jato: Rodrigo Telles de Souza e Fernando Alves de Oliveira Júnior. Outros três, com experiência em operações como Zelotes, Mensalão e Greenfield, ocuparão funções em seu gabinete. Sua escolha, foi vista por analistas políticos como uma resposta de Temer aos avanços da operação Lava Jato. Cabe ao presidente nomear o procurador-geral e, geralmente, o escolhido é o mais votado na eleição interna da Associação Nacional dos Procuradores da República. Dodge foi a segunda colocada.
Em carta de despedida enviada aos colegas, Janot desejou sorte à sua sucessora e afirmou que não estaria na posse por questões protocolares, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo. Sem citar nomes, o ex-procurador-geral afirmou que escroques ainda ocupam cargos no país e que é necessário acreditar que o combate à corrupção sirva como inspiração para todas as gerações. "Precisamos acreditar nessa ideia e trabalhar incessantemente para retomar os rumos deste país, colocando-o a serviço de todos os brasileiros, e não apenas da parcela de larápios egoístas e escroques ousados que, infelizmente, ainda ocupam vistosos cargos em nossa República.
Além da corrupção
No seu discurso, a nova procuradora-geral reforçou a necessidade do combate à corrupção, mas disse que outras atribuições constitucionais também devem ser levadas em conta pelo Ministério Público. Citou especificamente a defesa da democracia, dos direitos dos índios, das minorias, da sociedade, do meio ambiente e de zelar pelo respeito aos poderes públicos. Defendeu ainda a existência de harmonia entre os poderes.
“O Ministério Público, como defensor constitucional do interesse público, posta-se ao lado dos cidadãos para cumprir o que lhe incumbe claramente a Constituição de modo a assegurar que todos são iguais e todos são livres, que o processo legal é um direito e que a harmonia entre os poderes é um requisito para a estabilidade da nação”.
A fala dela agradou a Temer. Que disse que a procuradora deu uma “aula”. Ele ainda defendeu a preservação da “dignidade humana”. Emparedado pelas acusações, o presidente reclama constantemente que tem sido investigado sem ter sido ouvido. Sua versão dos fatos, dizem ele e seus advogados, não são levadas em conta pelos procuradores.
Na cerimônia de sua posse, Raquel Dodge também pediu que o Congresso Nacional e o Poder Executivo deem o “apoio indispensável ao aprimoramento das leis e das instituições republicanas”. Desde que a Lava Jato atingiu o núcleo político, com 66 acusações contra pessoas com foro privilegiado, os congressistas têm sugerido leis que possam enfraquecer o poder dos investigadores. A principal proposta é a lei de abuso de autoridade, em tramitação no Senado.
Tentando passar uma imagem de que tem esperança em dias melhores, a procuradora encerrou seu discurso citando a sua conterrânea, a poetisa goiana Cora Coralina ao dizer que espera contribuir para que no Brasil haja “mais esperança em nossos passos do que tristeza em nossos ombros”.
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