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O papa Francisco, a paz e a divisão da Igreja na Colômbia

Francisco visita país latino com o desafio de unir a sociedade e os católicos

O papa Francisco na chegada à Colômbia
O papa Francisco na chegada à ColômbiaRicardo Maldonado Rozo (EFE)

O papa Francisco chegou à Colômbia nesta quarta-feira com o desafio de apoiar o processo de reconciliação da sociedade e da classe política, muito divididas em torno do acordo de paz com a antiga guerrilha das FARC, que abandonou as armas após mais de meio século de conflito e se tornou um partido legal. Mas essa meta de convivência começa precisamente na Igreja do país e na própria comunidade católica, que vive essa nova etapa em meio a uma profunda polarização. A Colômbia possui, pelo menos segundo as estatísticas, uma pocentagem muito elevada de fiéis. De seus 49 milhões de habitantes, mais de 45 milhões são batizados. Na hierarquia católica e nas bases, contudo, as sensibilidades são conflitantes e as opiniões divergem sobre a integração da organização insurgente ao sistema. Nesse contexto, Jorge Mario Bergoglio porá seus seguidores diante do espelho.

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“Este é um país que vive um catolicismo majoritário. O Papa vem nos interpelar como membros da Igreja, falar duro conosco e nos dizer coisas que achamos convenientes”, avalia Jorge Restrepo, diretor do Centro de Recursos para a Análise de Conflitos (CERAC) e especialista em religião. A Igreja, em sua opinião, tem um papel na reconciliação. “Estou certo de que vai nos dizer mais coisas que vão nos comover como membros da Igreja, vão nos incomodar”.

Alguns setores católicos ultraconservadores rechaçaram abertamente esta visita, que começou quarta-feira em Bogotá e termina no domingo em Cartagena. Nos últimos meses, a rede de televisão Teleamiga transmitiu mensagens contra o Pontífice. Por trás do protesto está o diretor da emissora, José Galat, que tentou concorrer à presidência em 2010 pelo Partido Conservador e é reitor da Universidade Gran Colombia. “O canal é católico, os que não são católicos são os que negam a fé católica, isto é, os bispos que seguem um Papa que nega as verdades da fé”, declarou. A posição da Teleamiga provocou a reação da Conferência dos Bispos da Colômbia, que recomendou aos fiéis não verem esse canal sob o argumento de que não representa o ensinamento da Igreja Católica. Em carta, os mais altos representantes do catolicismo no país acusaram o canal de “ferir gravemente a comunhão da Igreja”.

A unidade da Igreja saiu abalada do plebiscito sobre os acordos de paz com as FARC convocado pelo Governo de Juan Manuel Santos, católico praticante, no ano passado. Mesmo sem pronunciamentos explícitos durante a campanha, foram alguns setores da comunidade católica e os votos dos evangélicos, que representam 10 milhões de colombianos, que inclinaram a balança a favor do não. O processo de paz não parou, o Governo assinou um novo acordo com a guerrilha e agora a Colômbia procura virar a página. Mas representantes políticos especialmente influentes entre os fiéis, como o ex-presidente Álvaro Uribe, continuam contrários ao pacto. O próprio Uribe, por exemplo, escreveu uma carta a Bergoglio em que lamenta “a impunidade total aos responsáveis por crimes atrozes, sua elegibilidade política, a autorização legal que receberam para gastar dinheiro ilícito em suas atividades políticas”.

“De qualquer maneira, é um respaldo ao Governo”, opina Ariel Ávila, analista da Fundação Paz e Reconciliação, que acredita que o papa adotará um tom prudente e diplomático para não agitar a sociedade e aumentar a polarização em vez de revertê-la”. “O papa sabe muito do processo de paz com as FARC e sobretudo com o ELN”, continua Ávila, que considera que o importante desta viagem é o conteúdo político.

Muitos católicos que apoiaram a paz e próximos a setores progressistas comemoram a visita do Papa. Stephanie Salazar é uma das porta-vozes do movimento Católicas pelo Direito de Decidir (CDD) Colômbia. Para ela, a visita do papa Francisco é a oportunidade de abrir um debate do catolicismo sobre o papel da mulher na Igreja e a defesa de seus direitos. “Esse é um papa que finalmente tocou num tema que outros não se atreveram, apesar das críticas”. Pedem à hierarquia eclesiástica da Colômbia que acolha, durante a visita de seu mais alto representante, a mensagem sobre a necessidade de acabar com a violência e a discriminação contra as mulheres. “É um papa que se manifestou sobre a equidade salarial entre homens e mulheres. É um representante da Igreja diferente. Esperamos que se pronuncie contra a violência de gênero”, diz Salazar. Só no ano passado, 731 mulheres foram assassinadas na Colômbia.

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