Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo celebra olhar feminino
Começa nesta quarta mais uma edição do evento, com forte presença do México e mais de 100 filmes da região
São Paulo vira tela da América Latina a partir desta quarta-feira, 20 de julho, quando começa mais um Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo – dedicado há 11 anos a projetar aos olhos brasileiros filmes que retratam a região. O evento, com uma seleção de 118 obras de 13 países (incluindo o Brasil), espalhadas em oito salas da cidade, tem desta vez uma edição de destaque ao audiovisual produzido por elas, as mulheres.
Espalhada por toda a seleção, a homenagem começa com uma mostra especial dedicada à trajetória da cineasta paulista Anna Muylaert (Que horas ela volta?), que estreia na abertura do festival o seu novo filme, Mãe só há uma. Anna, que foi recentemente convocada para integrar a Academia de Ciências Cinematográficas de Hollywood (responsável pelo Oscar), apresenta ao público sua primeira grande retrospectiva, com um total de 23 trabalhos que dirigiu ou roteirizou, incluindo vídeos de rara circulação.
Enquanto isso, novíssimas diretoras do México – o país com maior índice de mulheres diretoras de filmes na região (elas dirigiram 25% dos longas mexicanos de 2015, segundo dados oficiais) – encabeçam a mostra Mulheres atrás das câmeras. Entre as cineastas destacadas aí, está Betzabé García, que exibe Os reis de um povo que não sabia, sobre cidadãos que dão as costas para sua cidadezinha imersa em ruínas.
Para Francisco César Filho, diretor do evento ao lado de Jurandir Müller e um dos responsáveis pela programação, não se trata, no entanto, de homenageá-las. “A presença feminina no festival este ano reflete o atual estado das coisas. O maior acesso das mulheres à direção cinematográfica é um fato contestável em vários observatórios de cinema”, afirma o curador.
De maneira geral, uma das mostras mais aguardadas é a Contemporâneos, que a cada ano apresenta aqui as produções latino-americanas mais recentes – algumas celebradas em vitrines internacionais prestigiosas, como Cannes, Berlim e Roterdã, outras, apostas do próprio festival – mais afim do que outros às ousadias narrativas. Entre os hispânicos, merecem atenção títulos como Aqui não aconteceu nada, do chileno Alejandro Fernández Almendras, sucesso no último Festival de Berlim que representa a solidez do novo cinema do Chile, história de uma investigação policial sobre um acidente envolvendo jovens bêbados que evolui para um retrato da sociedade chilena; Forasteiro, da argentina Lucía Ferreyra, sobre três adolescentes que parecem ser os únicos a habitar um vilarejo de veraneio; e A última terra, do paraguaio Pablo Lamar – um especialista em som que trabalhou com o brasileiro Kleber Mendonça em seu cultuado O som ao redor –, sobre a finitude e as relações humanas.
Da Contemporâneos participam também títulos brasileiros. São sete novos longas-metragens nacionais, a maioria deles produzida em São Paulo. Segundo César Filho, por um lado, eles estão presentes para reforçar a importância da integração brasileira na América Latina. Por outro, “porque o festival latino está sendo cada vez mais buscado como plataforma de lançamento de filmes de São Paulo”. Na sua visão, “cineastas paulistas ou que produzem aqui se sentem atraídos pela radicalidade da programação. Gostamos da ousadia, e isso nem sempre acontece em outros festivais de cinema do país”. Nessa seara mais radical, estão obras inéditas de Cristiano Burlan (Estopô balaio) e Dellani Lima (Planeta escarlate), entre outras.
Por fim, reforçando que é o México o país que mais brilha nesta edição, vale citar duas mostras históricas mexicanas. A primeira é Divas, com filmes da década de 1940 – época em que o México domina o mercado de filmes em espanhol – estrelados por ícones do porte de Maria Félix (Que Deus me perdoe, de Tito Davison) e Dolores del Río (María Candelaria, de Emilio El Indio Fernández). A outra é Cine Negro, com obras com características do film noir norte-americano, porém fundidas com a realidade local, como Irmãs malditas, de Roberto Gavaldón, e A riqueza do diabo, de Alejandro Galindo.
A programação, que inclui encontros e debates e chega ao fim no próximo dia 27, é ampla como nas edições anteriores, apesar do orçamento mais magro da história do evento. Relevante esforço de um festival que, no mínimo, mudou a percepção dos paulistanos sobre o cada vez mais potente cinema latino-americano.
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