Zavascki engrossa coro do STF que rejeita avaliar mérito do impeachment
Além de rejeitar liminar do Governo, ministro afirma que "juiz constitucional" do processo é o Senado
Dilma Rousseff sofreu duas derrotas nesta quarta-feira (11): uma já esperada e crucial, que se desenhava no Senado, e outra estratégica, no Supremo Tribunal Federal (STF). No começo da tarde, o ministro Teori Zavascki indeferiu o pedido de liminar, encaminhado ontem pela Advocacia Geral da União (AGU), que solicitava a anulação de todo o processo do impeachment, com base no argumento de que ele foi impetrado por "vingança" do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha.
Era o apelo final do Governo para tentar impedir o afastamento da presidenta, mas pela contundência das palavras de Zavascki, que descartou papel do Supremo na análise do mérito do impeachment, acabou por sinalizar que vão diminuindo as chances de sucesso da estratégia de judicialização do impeachment no futuro. Ao justificar sua decisão, Zavascki disse: “Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário. O juiz constitucional dessa matéria é o Senado Federal que, previamente autorizado pela Câmara dos Deputados, assume o papel de tribunal de instância definitiva”, defendeu no relatório. O caso ainda será apreciado em Plenário por todos os onze ministros do STF.
O principal argumento do Governo ao solicitar a anulação do processo foi o “desvio de finalidade” que teria movido o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, no acolhimento do impeachment. De acordo com a defesa do advogado-geral José Eduardo Cardozo, Cunha aceitou a abertura do processo como forma de retaliar o Governo. Para Zavascki, contudo, qualquer desvio de finalidade é “um ato de difícil demonstração probatória, ainda mais quando se trata de ato também revestido de natureza política”. Segundo o ministro do STF, a oposição política de um parlamentar “é legítima” e não interfere a validade do processo.
“O desvio de poder reclama imersão no plano subjetivo do agente público responsável pelo ato, atividade que é praticamente – se não de todo – inviável quando o ato sob contestação representa a vontade conjugada de quase 370 parlamentares, que aprovaram um relatório circunstanciado produzido por Comissão Especial”, destaca Zavascki em relatório.
Sobre o mérito
O mais significativo, no entanto, foi a manifestação do ministro rejeitando a possibilidade de o Supremo avaliar o mérito do impeachment - ou seja, se a Corte poderia discutir se as pedaladas fiscais e os decretos suplementares das quais Dilma é acusada no processo de impeachment podem ser tipificados como crime de responsabilidade. A AGU ainda não questionou o Supremo sobre esse ponto, mas não descarta fazê-lo na fase do julgamento do processo propriamente dito no Senado.
"Não há base constitucional para qualquer intervenção do Poder Judiciário que, direta ou indiretamente, importe juízo de mérito sobre a ocorrência ou não dos fatos ou sobre a procedência ou não da acusação. O juiz constitucional dessa matéria é o Senado (...). Admitir-se a possibilidade de controle judicial do mérito da deliberação do Legislativo pelo Poder Judiciário significaria transformar em letra morta o artigo 86 da Constituição, que atribui, não ao Supremo, mas ao Senado Federal, autorizado pela Câmara, a competência para julgar o presidente da República nos crimes de responsabilidade''.
O tema não é consenso no Supremo, mas a tese da não intervenção no mérito vai ganhando, com Zavascki, mais adeptos. Para além da polêmica estéril é "golpe" ou não "golpe", é isso que, no fim das contas, pode ser o ponto relevante em mais uma participação dos magistrados na crise.
O que os ministros do STF já disseram sobre o impeachment
Ricardo Lewandowski (presidente)
A última declaração do magistrado sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff foi dada na segunda-feira (9), quando indicou que o STF pode acabar julgando o mérito da matéria. “Uma questão que vai ser examinada oportunamente é saber se o STF pode ou não ingressar em juízo de natureza política, se vai conhecer ou não esse questionamento. Mas isto é um tema a ser futuramente examinado pelos 11 ministros do Supremo”. A declaração foi dada em reunião com o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, Luis Almagro, e o presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Roberto Caldas. Em julgamento antes da votação do impeachment na Câmara, Ricardo Lewandowski, presidente da Corte, encerrou votação, mas deixou aberta a porta para analisar a tipificação do do crime de responsabilidade de Dilma "no momento oportuno".
Carmen Lúcia (vice-presidente)
“Impeachment não é golpe porque é previsto na Constituição. O que não pode acontecer é que não se observe as regras constitucionais". As últimas declarações públicas da ministra datam do final de março. “O processo do impeachment é político-penal, no sentido de que há uma previsão e a necessária e imprescindível observância das leis e da Constituição para se instalar. Crime é uma prática que precisa ser comprovada. Só que, como tem o conteúdo político, o julgamento se faz por uma outra Casa que não o Poder Judiciário. O Senado se transforma em órgão de julgamento presidido pelo presidente do Supremo”. Indicada por Lula, a ministra foi dura com petistas no julgamento do Mensalão.
Celso de Mello
É o ministro mais antigo do STF. “Ainda que a senhora presidente da República veja, a partir de uma perspectiva eminentemente pessoal, a existência de um golpe, na verdade, há um grande e gravíssimo equivoco, porque o Congresso Nacional, por intermédio da Câmara dos Deputados, e o Supremo Tribunal Federal, deixaram muito claro que o procedimento destinado a apurar a responsabilidade política da presidente da República, respeitou até o presente momento, todas as fórmulas estabelecidas na Constituição".
Marco Aurélio Mello
Conhecido por tomar decisões divergentes da maioria do Plenário, o ministro é primo do ex-presidente Fernando Collor, que sofreu impeachment em 1992. “Se não houver fato jurídico que respalde o processo de impedimento, esse processo não se enquadra em figurino legal e transparece como golpe. Agora, precisamos aguardar o funcionamento das instituições. Precisamos nesta hora é de temperança. Precisamos guardar princípios e valores e precisamos ter uma visão prognostica”, disse o ministro durante um evento em março. E foi além: “Nós não teremos a solução e o afastamento das mazelas do Brasil apeando a presidenta da República”. Marco Aurélio foi o ministro que deferiu processo que obrigava a Câmara a abrir um processo de impeachment contra Temer. A medida irritou o Movimento Brasil Livre, que recorreu ao STF para tentar cassar o ministro. "Eu não conhecia impeachment de vice-presidente. É tudo novo para mim. Mas o ministro Marco Aurélio está sempre nos ensinando", ironizou o colega de STF, Gilmar Mendes, dias depois.
Gilmar Mendes
A mais recente declaração do ministro, em geral alinhado com a oposição, em torno do impeachment foi dada há apenas dois dias, quando a AGU enviou recurso ao STF. "Ah, eles podem ir para o céu, o Papa ou o diabo". Quando o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão, decidiu anular a votação do impeachment na Casa – voltando atrás 24 horas depois – Mendes alcunhou a medida de "ato circense" e "operação tabajara". Segundo Mendes, não cabe ao STF definir se a presidente cometeu crime de responsabilidade. "Isso é uma competência política, da Câmara e do Senado, que faz o julgamento. A Câmara aparentemente não teve dúvidas quanto a isso, e aí nós não temos como fazer esse tipo de exame, que agora é algo que teria que ser discutido no âmbito do Senado".
Dias Toffoli
"O processo de impeachment é previsto na Constituição e nas leis brasileiras. Não se trata de um golpe. Todas as democracias têm mecanismos de controle e o processo de impeachment é um tipo de controle". O ministro limitou-se a declarar o óbvio: "Aqueles que se sentirem atingidos podem recorrer à Justiça brasileira. O que ocorre hoje é a democracia. É muito melhor vivermos desta forma, do que sob uma ditadura". Toffoli foi alvo de um pedido de impeachment no Senado, por suposto crime de responsabilidade. A denúncia foi feita por um procurador da Fazenda, mas foi negada no Senado.
Luiz Fux
Há apenas dois dias, o ministro declarou, em evento em Porto Alegre, que é contra a "judicialização da política. O Parlamento tem que resolver os seus próprios problemas. E ele não o faz, evidentemente, para não assumir nenhuma postura social que desagrade o eleitorado. Ele então 'empurra' esta solução para o Judiciário, que é uma delegação espúria na medida em que nós, juízes, não fomos eleitos”. No último dia 6, o ministro rejeitou mandado de segurança pelo deputado Paulo Teixeira (PT), que pedia a anulação da sessão em que a Câmara dos Deputados decidiu pelo encaminhamento ao Senado do processo do impeachment. No relatório, defendeu que a análise do crime de responsabilidade “não se trata de ato sujeito ao controle jurisdicional”.
Rosa Weber
Assim como Zavascki, a ministra foi indicação de Dilma. De atuação discreta na Corte, evita se posicionar sobre o impeachment. Sua última aparição" no noticiário foi na segunda-feira, quando rejeitou análise de mandado de segurança, protocolado pelo advogado Rafael Fachinello, para questionar a anulação da tramitação do processo de impeachment. “O mandado de segurança não é via processual adequada para que particulares questionem decisões tomadas no âmbito do processo legislativo.
Luis Roberto Barroso
Para deputados da Comissão Especial do Impeachment na Câmara, o magistrado chegou a afirmar há pouco mais de um mês, que “o Supremo não tem nenhuma pretensão de juízos de mérito da matéria. Eu acho quer o impeachment não é um golpe. É um mecanismo previsto na Constituição para afastamento de um presidente da República”. Na ocasião, o ministro fez analogia a um jogo de futebol. “Nesse Fla-Flu o Supremo não tem lado. O Supremo é o árbitro desse jogo. Portanto se o Flamengo fizer um gol legítimo, ele vai ser validado. E se Fluminense fizer um gol legítimo, ele vai ser validado".
Edson Fachin
Durante votação em Plenário do STF de matéria que definiria rito do impeachment, realizada em dezembro, o ministro declarou que o impeachment decorre "do regime republicano e democrático", pela "possibilidade de responsabilização do mandatário máximo da nação". “Ao Supremo Tribunal Federal compete o controle da estrita legalidade procedimental do processo de impeachment, assegurando que o juízo jurídico-político de alçada do Parlamento, passível de controle judicial apenas e tão somente para amparar as garantias judiciais do contraditório e ampla defesa se desenvolva dentro dos estritos limites do devido processo legal”, afirmou.
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