Depois de Cunha, Maranhão, Renan...
Enfim, nos livramos de Eduardo Cunha. Mas, com a linha sucessória que se desenha, um pesadelo nos aguarda
A suspensão do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) pelo Supremo Tribunal Federal põe fim a uma excrescência – o exercício da presidência da Câmara por um réu processado por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro – ao mesmo tempo em que deixa a nu o nível de degradação da política brasileira. Com o impeachment da presidente Dilma Rousseff, quem poderá ser o próximo na linha de sucessão, após o vice Michel Temer? Essa resposta é relevante porque define o nome do parlamentar que assumirá o cargo na ausência temporária (viagens ao exterior, problemas de saúde) ou definitiva (cassação do mandato) do presidente da República.
O sucessor constitucional de Temer deveria ser o presidente da Câmara dos Deputados, mas o afastamento de Cunha trouxe um novo problema jurídico. A secretaria-geral da Casa julga que o patético deputado Waldir Maranhão (PP-MA), por exercer o cargo interinamente, não se qualifica para a linha sucessória – o lugar então caberia ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Mas esse não é um entendimento consensual. Alguns ministros do Supremo alegam que é a presidência da Câmara dos Deputados que se encontra na linha de sucessão, e não o parlamentar que esteja à frente dela num determinado momento. Portanto, possivelmente esse assunto ainda suscitará ampla discussão.
O veterinário Waldir Maranhão, um dos principais aliados de Cunha, chegou à Câmara dos Deputados apoiado em 66.000 votos e teve sua prestação de contas rejeitada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Maranhão por recebimento de recursos de fonte não identificada. Ele é acusado pelo doleiro Alberto Yousseff de participar do esquema de desvio de dinheiro da Petrobras. Yousseff trata Maranhão como um parlamentar “de menor relevância” do PP, partido com mais expressivo número de parlamentares implicados no escândalo da Operação Lava Jato. O deputado responde ainda a dois outros inquéritos no Supremo por crimes de ocultação de bens e desvio de recursos de um fundo de pensão, que teria movimentado cerca de R$ 300 milhões em um ano e meio. O nome de Maranhão constará em um rodapé dos compêndios de história do Brasil como aquele que revogou a votação da admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff por sua própria conta e risco – e por sua própria conta e risco revogou a revogação algumas horas depois.
Já Renan Calheiros tem uma história mais longa, mais atribulada, e, por conseguinte, uma lista de denúncias mais extensa. Exercendo seu terceiro mandato como senador, o ex-ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso responde a 12 inquéritos no Supremo, nove deles ligados a denúncias de corrupção no âmbito da Operação Lava Jato. Ele ainda é investigado em um inquérito na Operação Zelotes que apura um esquema formado por empresas e pessoas físicas destinado à sonegação fiscal e previdenciária.
Renan é o filho mais velho de uma família que manda na política alagoana há pelo menos duas décadas. Seu pai, Olavo, foi vereador por quatro mandatos e prefeito de Murici – cargo exercido atualmente pelo irmão de Renan, Remi, que deverá ser sucedido pelo vice, Olavo Neto, seu sobrinho, filho de Olavo Filho, deputado federal por cinco mandatos consecutivos e agora deputado estadual. O governador de Alagoas é Renan Calheiros Filho, ex-prefeito de Murici (tinha como vice o tio, Remi, que ficou em seu ao afastar-se para candidatar à Assembleia Legislativa), ex-deputado estadual e ex-deputado federal.
O presidente do Senado começou a ganhar visibilidade quando, em fins de 1989, ainda deputado federal, assessorou a candidatura de seu conterrâneo Fernando Collor de Melo à Presidência da República. Com a vitória de Collor, Renan tornou-se líder do governo na Câmara dos Deputados, tendo sido, nesse cargo, responsável pela divulgação e defesa do pacote de medidas governamentais conhecido como Plano Collor, que incluía, entre outras coisas, o confisco de depósitos bancários e das cadernetas de poupança.
Em outubro de 1994, Renan elegeu-se para o primeiro mandato de senador. Quatro anos depois foi convidado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso a assumir o Ministério da Justiça, cargo que exerceu até julho de 1999. Em 2005, já em seu segundo mandato como senador, foi eleito presidente da Casa, renunciando dois anos mais tarde -ao cargo, mas não ao mandato -, pressionado por uma série de escândalos conhecidos como Renangate, que incluíam desde mesada paga pela Construtora Mendes Junior a uma ex-amante até compra de rádios em Alagoas em nome de laranjas, passando por uso de notas fiscais frias, tráfico de influência, desvio de dinheiro público, espionagem... Agora, em terceiro mandato, seu nome aparece envolvido em denúncias de corrupção na Operação Lava-Jato – em dezembro do ano passado, o Supremo autorizou a quebra de sigilo fiscal e bancário do senador.
Enfim, nos livramos momentaneamente de Eduardo Cunha – que vem ameaçando Deus e o mundo –, e em breve seremos comandados por Michel Temer, o político medíocre que por méritos próprios nunca alcançaria o cargo que ocupará, secundado pelo inconsequente Waldir Maranhão e pelo astuto Renan Calheiros. É esse pesadelo que nos aguarda...
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