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Argentina sela acordo com ‘fundos abutre’ para encerrar 14 anos de conflito

Mediador anuncia o pacto de 4,65 bilhões de dólares com o investidor mais duro

O presidente da Argentina, Mauricio Macri.Foto: reuters_live | Vídeo: Getty Images | Reuters Quality
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A batalha entre a Argentina e os fundos abutres terminou em um princípio de acordo após 14 anos de disputas e processos judiciais. O mediador do conflito, Daniel A. Pollack, anunciou nesta segunda-feira o pacto entre o Governo e o mais duro dos investidores envolvidos no conflito, o fundo Elliott Management, dirigido pelo Paul E. Singer. Essa era a parte mais difícil, mas agora falta uma segunda etapa, também complexa: o presidente Mauricio Macri trabalha há dias para obter o apoio obrigatório do Congresso para aprovar o acordo. Macri está em minoria na Câmara e no Senado, mas a divisão da oposição e a sua promessa aos governadores peronistas de que esse acordo permitirá às províncias contrair novas dívidas parecem abrir as portas para uma solução definitiva de um conflito que nos últimos anos mantém a Argentina fora dos grandes circuitos de financiamento internacional.

Tal exclusão, muito polêmica num país onde os fundos abutres são um assunto permanente nas conversas, teve uma consequência positiva: o país tem um dos menores níveis de endividamento público da sua história. Mas, após quatro anos com a economia praticamente estancada, Macri quer procurar investimentos e está aberto a endividar o Governo para financiar grandes projetos que reativem a economia. O pacto com os fundos abutres é o primeiro grande passo nessa nova estratégia. A Argentina romperá assim seu isolamento e voltará de forma definitiva à ortodoxia econômica, uma guinada que é muito polêmica neste país – onde Macri já começa a enfrentar as primeiras mobilizações e greves de funcionários públicos –, mas tem um forte respaldo internacional, em especial na União Europeia, nos EUA e em organismos como o Fundo Monetário Internacional.

O memorando assinado no domingo à noite, após três meses de intensas negociações em Nova York, afeta dívidas no valor de 4,65 bilhões de dólares (18,52 bilhões de reais). O Executivo de Macri havia chegado até agora a acordos com investidores menores, mas o de Singer era o grupo mais difícil. Se consumado, o acordo levará esse fundo e outros a receberem apenas 75% da dívida dos títulos com pagamento suspenso, incluindo juros, além de alguns gastos derivados dos últimos 15 anos. É uma paz obtida em troca de 85% das exigências. Ao todo, para cobrir todas as dívidas com os fundos, não só os mais exigentes, Macri oferece 6,5 bilhões de dólares.

"Este é um passo gigante neste longo processo, mas não o último passo", alertou Pollack no comunicado. Pollack se refere expressamente à necessidade de o Congresso da Argentina revogar a norma sobre os pagamentos de dívida soberana aprovados pelo Governo anterior, de Cristina Kirchner. Foi batizada de Lei Ferrolho e concebida para que nenhum Governo consiga um acordo com os fundos abutres. As partes esperam que o processo não dure mais do que seis semanas, e Macri, que abre na terça-feira as sessões parlamentares com um grande discurso anual, tem sua equipe trabalhando a todo vapor para buscar o acordo voto a voto. Os simpatizantes de Cristina Kirchner rejeitam o acordo, mas fontes do setor reconhecem que Macri muito provavelmente conseguirá os votos, porque está pressionando bastante os governadores. Muitos deputados e senadores obedecem ao governador de sua província, antes do líder do grupo parlamentar.

Este acordo inicial é o ponto final de uma batalha da Argentina com um grupo de investidores minoritários, mas com poder decisivo, que se recusaram a fazer parte dos acordos que o Governo da Argentina fechou em 2005 e em 2010 com quase 93% dos credores, e que representaram perdões da dívida significativos. São fundos como o de Singer, especializados na compra de dívida de países com problemas, que em seguida movem processos para obter o máximo retorno possível. Por isso são chamados de abutres.

Agora, Buenos Aires terá de recorrer aos próprios mercados financeiros para pagar essas dívidas, numa tentativa de levantar recursos que os fundos do acordo prometeram não interferir. A Argentina calcula que, para pagar todos seus credores, incluindo os detentores italianos de bônus que aceitaram o acordo há um mês, terá de levantar no mercado cerca de 12 bilhões de dólares (cerca de 48 bilhões de reais) com emissões de títulos.

Com o pagamento, as ordens judiciais decretadas pelo juiz de Nova York Thomas Griesa contra a Argentina serão automaticamente anuladas, disse Pollack. Além da Elliott Management, o acordo inclui a Aurelios Capital, Davidson Kempner e Bracebridge Capital. O acordo acontece antes do discurso de Macri no Congresso e antes da visita do presidente dos EUA, Barack Obama, a Buenos Aires, em 22 de março. A viagem é particularmente simbólica porque representa o apoio definitivo ao giro de 180 graus dado por Macri na política externa da Argentina. O apoio indireto do Governo Obama à negociação com os abutres tem sido fundamental, segundo fontes do Executivo argentino.

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