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Coluna
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O Brasil aos olhos de Tim Burton

Com quatro pinceladas e outros tantos instantâneos, o cineasta fotografou o melhor dos brasileiros

Juan Arias
@samara7days (Twitter / Reproducción)

Um país e sua gente podem ser vistos com olhares diferentes. Todos serão subjetivos, como os do coração.

O olhar do cineasta Tim Burton sobre o Brasil, que visitou nos últimos dias, é emblemático porque com quatro pinceladas, e outros tantos instantâneos, fotografou o melhor dos brasileiros: sua empatia, sua criatividade, sua capacidade de expressão e sua forma peculiar de expressão artística.

O autor de Batman está habituado a ver a escuridão desde a juventude, quando já lia Edgar Allan Poe, que mergulhava no terror, provocador e inovador até a irreverência. Ao aterrissar no Rio, poderia ter colocado o foco de suas câmeras no lado mais sombrio da Cidade Maravilhosa: a crueldade da violência, o extermínio policial dos marginalizados, a sujeira da baía, a epidemia do zika vírus, a corrupção dos políticos.

Não foi o que chamou sua atenção, mas essa inegável empatia que os brasileiros sabem despertar; sua capacidade inata de se expressar e comunicar, o que faz com que ninguém se sinta sozinho nesse país, a força de sua arte popular (“Se respira em todos os lados”, disse Burton) e o brilho de sua capacidade criativa.

O cineasta norte-americano, com sua sensibilidade artística, viu tudo isso dos brasileiros. Não sabemos o que teria visto através de suas lentes se tivesse colocado o foco na política, certamente o lugar mais sombrio e perigoso deste país e deste momento.

Olhando para o que hoje se move no planeta dos políticos, Burton certamente não teria captado em seus olhos essa empatia dos brasileiros. Menos ainda a criatividade, porque eles apresentam, neste momento, uma grave ausência de ideias e de gênio; nem teria visto lampejos de arte, a não ser os da corrupção e do proveito pessoal.

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O Brasil não goza hoje de boa imprensa no mundo. Me consta que isso é doloroso para as pessoas comuns, talvez porque percebam que é injusto porque, como veio a dizer Tim Burton, certamente sem intenção, as trapaças que abalam até os mais famosos e populares não representam o verdadeiro Brasil.

O país de que o mundo gosta é esse que o cineasta desenha com suas pinceladas de artista.

É o Brasil de suas raízes, o que foi engendrado pela mistura de culturas, todas elas ricas de humanidade e criatividade.

O outro Brasil, o da política, é artificial, o que vai e vem, enquanto o verdadeiro continua vivo, às vezes sangrando, humilhado ou enfurecido e até adormecido. Mas real.

O Brasil de mentira, o artificial, é incapaz de expressar empatia e criatividade, mas sim rejeição e desgosto, às vezes tristeza.

É o Brasil estéril. Infelizmente é o que mais se esforça em aparecer e que pode acabar enganando o mundo. Não é o real, é o das máscaras.

O Brasil autêntico, o que se impôs ao olhar de Burton, é mais invisível, mas corre nas veias das pessoas.

É esse o que acabará se impondo pela força que tem dentro de si.

É o Brasil que sempre despertou simpatia mundo afora, hoje mortificado e adulterado pelo Brasil da política que desencanta e fere.

O Brasil, enquanto isso, continua à espera de uma nova epifania.

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