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Depois dos ataques, Paris se resigna ao estado de sítio

Em meio ao medo de novo atentado, população aceita as restritivas medidas de segurança

Daniel Verdú
Polícia no centro de Paris.
Polícia no centro de Paris.B. PÉREZ

Sophie M. termina às pressas de fazer as malas, pois seu trem parte dentro de uma hora. Ela vai embora de Paris, na companhia dos dois filhos, com destino à pequena casa dos seus pais na Bretanha. Seu marido ficará na capital, mas ela não aguenta mais. “Comecei a ter paranoia com pessoas na rua, e não sou assim. Fico o tempo todo pensando na segurança dos meus filhos e se eles estão bem na creche. Já decidi: vou embora”, conta ela em seu apartamento, vizinho do Museu do Louvre. Muitas amigas suas se viram na mesma situação, mas não podem fazer as malas tão facilmente quanto ela.

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O sentimento de ameaça e a psicose provocada pela possibilidade de um novo atentado se espalham por Paris. As declarações feitas nesta manhã pelo primeiro-ministro Manuel Valls não ajudam a mitigá-los. “Não podemos descartar nada. Digo isso com a devida cautela, mas há risco de armas químicas e bacteriológicas”, afirmou Valls. “Estamos diante de uma nova guerra – externa e interna – em que o terrorismo é o primeiro alvo e a primeira arma”, acrescentou. Também nesta quinta-feira, policiais foram autorizados a andar armados fora do expediente de trabalho.

Sophie M. vai embora de Paris. “Comecei ter paranoia com pessoas na rua, e não sou assim”, conta ela, enquanto faz as malas

Ninguém sabe quando nem como, mas todos admitem que um novo atentado acabará por acontecer. Talvez por causa dessa inquietude, desde sexta-feira – dia do múltiplo atentado que matou 130 pessoas e feriu mais de 300 – o Exército francês recebeu cerca de 1.500 consultas de jovens interessados em se alistar, o que na França é facultativo. “Um fenômeno completamente inédito”, disse o chefe de comunicação do Exército ao Le Monde.

Ao entrar na loja de departamentos H&M da Rue de Rivoli, Marcel precisa esperar dois minutos para que a pequena fila ande e ele possa abrir a sua mochila e desabotoar a jaqueta diante dos guardas. Não se impacienta nem faz cara feia. “Estamos em estado de emergência. Era só o que faltava não me revistarem. Aqui dentro eu poderia levar uma bomba”, diz, enquanto o agente examina um tupperware com uma salada de tofu. Isso é o mais surpreendente: a tolerância dos cidadãos diante das medidas de segurança extremas que pouco a pouco vão “limitando” algumas das suas liberdades, como admitiu Valls. Para isso, entre outras coisas, seu Governo mobilizou 60.000 policiais e 50.000 gendarmes (força semimilitar) em todo o país.

No acesso aos museus, os visitantes são submetidos a medidas de segurança semelhantes às dos aeroportos

O Exército patrulha as ruas – e, de acordo com as novas medidas aprovadas, também poderá estabelecer pontos de controle –, e a polícia vigia muitos dos acessos ao metrô. Também é fácil encontrar nas plataformas duplas de policiais da CRS (tropa de choque) armados com submetralhadoras. A vigilância ostensiva se multiplica na saída do metrô Champs-Élysées, onde se encontra a residência do presidente François Hollande e a sede do Ministério do Interior. Lá, as ruas adjacentes estavam interrompidas nesta manhã e o número de policiais que controlava o acesso à área era impressionante. O gesto de sacar uma caderneta e uma caneta imediatamente atraía a atenção de algum dos agentes que controlam a zona: “Quem é você e o que está fazendo aqui?”. Na Rue Bassy d’Anglais, onde fica a Embaixada dos EUA, os alto-falantes de uma loja de departamentos tocam a todo volume a canção I’ve Got You Under My Skin, na voz de Frank Sinatra, enquanto os gendarmes fazem sua ronda portando metralhadoras com um metro de comprimento. “Estamos em guerra”, comenta o porteiro da loja de onde sai a música.

Os museus também estão fortificados. Para entrar no Louvre ou no Pompidou é preciso passar pelas mesmas medidas de segurança habituais nos aeroportos, incluindo a revista de objetos pessoais. A britânica Lucy, que viaja com seu marido, aguarda pacientemente. “Estivemos a ponto de cancelar a viagem. Minha irmã mora em Paris e outro dia viveu uma situação de pânico no metrô só por causa de um ruído estranho. Todos saíram correndo desordenadamente pelas plataformas. Acho que o medo está começando a impregnar os parisienses”, observa. Na noite de quarta-feira, o sofisticado Hôtel du Louvre foi desalojado durante três horas por uma ameaça de bomba. A polícia isolou o quarteirão inteiro, impedindo a passagem dos transeuntes. Tratava-se apenas de um pacote que um hóspede havia esquecido no saguão. Após alguns instantes, voltou para buscá-lo, sem entender bem o que estava acontecendo.

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