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Começa a batalha do impeachment de Dilma com julgamento do TCU

Tribunal vota contas do Governo de 2014, que devem ser rejeitadas por manobras contábeis

O ministro Nardes, no TCU.
O ministro Nardes, no TCU.F. R. Pozzebom (Ag. Brasil)

Esta quarta-feira poderá ser um divisor de águas para a gestão Dilma Rousseff (PT), que ainda enfrenta uma de suas maiores crises políticas. A razão é o possível julgamento das contas do Governo de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Caso as finanças sejam rejeitadas, confirmando a tendência ventilada nos últimos dias, os opositores da petista ganharão argumentos para ingressar com mais um pedido de impeachment presidencial. O julgamento acontece sob um um clima político belicoso, com o próprio relator do processo das contas sob suspeita. Segundo informações da Folha de São Paulo, Augusto Nardes, é alvo de investigação da Polícia Federal e o Ministério Público Federal por indícios de ter recebido 1,65 milhão de reais de uma empresa investigada por fraudes fiscais.

Nardes, um ex-vereador e ex-deputado gaúcho que iniciou sua carreira no partido que dava sustentação à ditadura militar, a Arena, e ingressou no TCU em 2004. Desde que assumiu o caso,  vem dando declarações de que há uma série de irregularidades nas finanças de Rousseff. A cada fala dele havia dois tipos de reações, os opositores aplaudiam, e os governistas demonstravam preocupação. Nas últimas semanas, ele deixou claro de que seria favorável à rejeição das contas ao dizer que o TCU estava prestes a fazer história. Este tribunal jamais rejeitou as finanças de um presidente, o que tornaria a decisão inédita, e ao mesmo tempo, coloca o próprio TCU como alvo de críticas por seguir uma atuação orquestrada com a oposição.

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O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, chegou a afirmar, durante um evento público no final de agosto, que não acredita no TCU "como um órgão sério, desencadeador de um processo de tal gravidade", Para ele, aliás, o Tribunal de Contas não passa de um "playground de políticos fracassados" e não teria "estatura institucional" para originar um impeachment presidencial. Mas, o julgamento está marcado para começar as 17 horas desta quarta-feira, e selar o destino do Governo Rousseff.

Atualmente, há dez pedidos em tramitação na Câmara dos Deputados, além de quatro representações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um dos mais barulhentos, apresentado pelo ex-petista Helio Bicudo, deve ser arquivado por falta de provas. Mas, a oposição já está pronta para entrar com um novo pedido, que teria mais embasamento jurídico, pois o seu fio condutor é a alegação de que Rousseff cometera um crime de improbidade administrativa ao usar das manobras que foram batizadas de “pedaladas fiscais” para garantir o pagamento de programas sociais com recursos que não eram dos cofres do Governo, mas de bancos estatais. A suspeita do TCU é que a manobra tenha sido feita sobre 40 bilhões de reais em recursos públicos só no ano passado.

O Governo decidiu, nesta semana, partir para o ataque a fim de se defender das investidas dos defensores do impeachment. No domingo, a Advocacia Geral da União convocou uma coletiva de imprensa para anunciar que pediria o afastamento de Nardes do TCU.  “A partir do debate público promovido pelo relator [Nardes] temos visto uma disposição à reprovação, algo que não concordamos”, afirmou ao EL PAÍS o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams. Ele avalia que o tribunal estaria iniciando um claro processo de politização de um caso que deveria ser apenas técnico.

Por essas razões, o Governo apresentou um pedido de suspeição contra o ministro alegando que ele não teria imparcialidade para julgar o caso e que teria ferido a lei orgânica da magistratura. Esta legislação impede qualquer juiz de se manifestar sobre um caso que ainda irá julgar. Até a tarde desta terça-feira, porém, no colegiado formado por nove magistrados (incluindo Nardes) a solicitação governista não havia prosperado.

Agora, a gestão Rousseff recorre ao Supremo Tribunal Federal (STF), a última instância judicial brasileira, para derrubar o julgamento, caso o relator não seja impedido de votar no TCU. A tentativa é de protelar ao máximo possível a análise dessas contas para que Rousseff consiga recompor sua base de apoio no Congresso Nacional. Na semana passada a presidenta fez uma reforma ministerial cedendo mais espaços a aliados exatamente para garantir sustentação nas votações no parlamento.

Em sua defesa, o ministro Nardes disse que não antecipou sua decisão e que as entrevistas concedidas por ele, foram embasadas em decisões anteriores do próprio tribunal. Além disso, afirmou que a gestão petista estava tentando intimidá-lo. No mês passado, o ministro teve sua segurança reforçada depois de identificar mensagens ameaçadoras por e-mail. Uma delas segundo o próprio Nardes relatou ao jornal O Globo, dizia: “Vamos acabar com você”.

Em tese, juristas afirmam que um Governo só poderia sofrer impeachment se houvesse erros cometidos durante o mandato em curso. As contas de 2014 se referem ao último ano do primeiro mandato de Dilma e não ao atual. Mas, por tratar-se de um julgamento político, feito pela Câmara, onde a presidenta coleciona arqui-inimigos, a preocupação é que a votação seguirá critérios subjetivos e não técnicos, em meio a uma crise política que paralisou o Brasil, e que tem como protagonistas

Técnica X política

O debate entre critérios técnicos versus políticos tem embasado toda a defesa jurídica do Governo Rousseff. Ao mesmo tempo em que seus advogados apresentam argumentos judiciais de que as pedaladas sempre foram praticadas, mas nunca punidas, a tropa de choque dela concede entrevistas e faz discursos confrontando o relatório do ministro no TCU.

A linha de frente é conduzida pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Na segunda-feira, ele afirmou que Nardes e a oposição brasileira querem ganhar a eleição no “tapetão”, promovendo um terceiro turno eleitoral.

Nas tribunas, o discurso é similar. “O ex-deputado Nardes e agora ministro não tem se portado como um magistrado. É uma postura, no meu entender, golpista, somando-se aos esforços de grupos e partidos que militam pelo afastamento da presidenta da República. O ex-deputado Nardes tem conspirado contra o governo eleito”, afirmou a senadora Gleisi Hoffman (PT-PR), ex-ministra da Casa Civil do Governo Rousseff.

A oposição, por sua vez, diz que as reações governistas são “chicanas fadadas ao fracasso”. “É um desejo do governo, que gostaria que as contas dos presidentes da República continuassem se acumulando nas gavetas do Senado ou da Câmara dos Deputados, sem apreciação do Congresso depois de receberem parecer prévio do TCU”, discursou o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) na noite de segunda-feira.

As pedaladas

Na gestão Rousseff as manobras que foram batizadas de “pedaladas fiscais” ocorreram da seguinte maneira. Ao invés de repassar mensalmente os recursos para os bancos públicos (Caixa e Banco do Brasil) pagarem benefícios sociais, o Governo solicitava que esses bancos usassem seus próprios recursos para pagarem os beneficiários e com ao menos um mês de atraso fazia o repasse às instituições financeiras. Era uma espécie de empréstimo entre dois entes públicos federais sem autorização legal.

O objetivo dessas “pedaladas” era maquiar as contas, porque ao transferir as despesas de um mês para o outro, o Tesouro apresenta mensalmente gastos inferiores às receitas e cumpre a lei de responsabilidade fiscal, que prevê gastos apenas de acordo com a receita disponível do órgão público.

O passo a passo do julgamento das contas do Governo

1. Os nove ministros do Tribunal de Contas da União analisam todas as receitas e despesas do Governo no ano de 2014.

2. Um dos ministros elabora um relatório com um parecer técnico sugerindo a aprovação das contas, a aprovação parcial ou a rejeição. Os nove ministros julgam esse relatório.

3. Esse parecer é levado para a Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional e depois ao plenário

4. Caso rejeitem as contas, os congressistas podem atribuir a presidenta o crime de improbidade administrativa. Essa caracterização pode resultar em um pedido de impeachment

5. A última discussão, em caso de rejeição das contas é mais jurídica do que política. Há quem entenda que não caberia impeachment de Rousseff por crimes cometidos em mandato anterior. Porém, estuda-se se as pedaladas não ocorreram até fevereiro deste ano, já no atual mandato.

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