Dilma começa batalha no TCU para tentar fechar porta ao impeachment
Em defesa do caso das 'pedaladas fiscais', gestão diz que antecessores fizeram o mesmo
A batalha do Governo Dilma Rousseff para se defender de um eventual impeachment começou oficialmente nesta semana. Na quarta-feira, o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, protocolou a defesa da gestão petista no caso das pedaladas fiscais em 2014 que serão julgadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no mês que vem — um veredito que dá status inédito para a corte, mais conhecida por ser um órgão repleto de técnicos comandado por políticos aposentados do que por ter relevância suficiente para jogar ainda mais gasolina em crises como a atual.
No documento, que foi lido e constantemente revisado pela presidenta, Adams justifica que todos os gastos do Governo foram lícitos, não feriram a Lei de Responsabilidade Fiscal, e que as supostas irregularidades já foram utilizadas por gestões anteriores, mas nunca foram questionadas.
O que está sendo discutido no caso das pedaladas é uma manobra fiscal utilizada pela gestão Rousseff para pagar benefícios como o Bolsa Família e destinar recursos para o seguro desemprego. No ano passado, conforme consta de sua prestação de contas, a União utilizou dinheiro de bancos públicos para bancar parte desses benefícios sociais. A razão foi a falta de caixa do Tesouro Nacional.
O próprio Banco Central já havia entendido que a manobra era irregular e alertou o Governo sobre isso. Mas ela não deixou de ser feita. Na interpretação do ministro do TCU que relatou o caso, Augusto Nardes, houve uma operação de crédito entre os bancos públicos e a União, o que é vetado pela Constituição Federal.
Cunha e a crise
No mês passado, em uma primeira análise, o tribunal sinalizou que rejeitaria as contas de Rousseff, mas estendeu o prazo para a defesa da administração federal, antes de tomar qualquer decisão e apontar os culpados pela suposta irregularidade. O prazo acabou nesta quarta-feira e a oposição começa a contar os dias para, conforme o resultado do julgamento, apresentar um pedido de impeachment da presidenta. Isso só ocorreria se as contas fossem declaradas irregulares. “Aí, ela [Dilma] poderia ser responsabilizada administrativamente”, diz o deputado Bruno Araújo, do oposicionista PSDB.
Em Brasília já é dado como certo que as contas serão rejeitadas, embora a AGU ainda resista à ideia. Adams justifica que não há uma operação de crédito, conforme analisou o TCU. “Fácil perceber que esse entendimento das coisas não se sustenta como instrumento de apreciação, sejam as contas do passado, seja as contas do Governo da República no exercício de 2014, na medida em que todas as anteriores, construídas sob as mesmas premissas e com base nas mesmas metodologias, vieram a ser aprovadas e jamais tiveram responsabilizados quaisquer dos agentes políticos ou públicos que as apresentaram ou subscreveram”, diz trecho da defesa, assinada pelo advogado Rafaelo Abritta e endossada por Adams.
No documento apresentado ao TCU, o Governo alegou que a Caixa, o banco que paga o Bolsa Família, recebeu 140 milhões de reais a mais do que gastou com o pagamento do benefício. Ou seja, ela seria devedora da União, e não o contrário. Para especialistas no assunto, as contas eventualmente rejeitadas não significam que a tese do impeachment vingue, até porque falta consenso entre os próprios deputados da oposição se vale a pena encarar um processo desses. Haveria um desgaste por serem tratados como golpistas por parte da opinião pública, e ainda, contribuir para uma piora ainda maior da economia num momento de fragilidade.
Cunha e o olho do furacão
O problema para o Governo é que o agora inimigo declarado do Planalto e presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já deu sinais bastante claros de que o veredito do TCU, que ele pretende votar no plenário da Casa pela primeira vez em anos, não terá tratamento técnico, mas "político". Assim, Cunha pretende assombrar Dilma Rousseff com a interpretação de que as pedaladas são suficientes, sim, para embasar um pedido impeachment. Trata-se de uma mudança de posicionamento que reflete o novo estágio da crise política. Meses atrás, o mesmo Cunha dizia que as pedaladas não poderiam referendar uma impugnação. O peemedebista repetia os argumentos dos defensores da presidenta e constitucionalistas: que os desvios do mandato passado não são suficientes para contaminar o atual, iniciado em janeiro. "O que você chama de pedalada é a má prática da coisa pública. Isso vem sendo praticado nos últimos dez, doze, quinze anos. É um erro que eu condeno, mas a princípio, eu, sinceramente, não vejo isso como motivo para suportar um pedido de impeachment", disse em abril.
Como atenuante para Dilma Rousseff, além do histórico brando do tribunal, está o fato de que o próprio TCU se viu no meio de uma crise política alavancada pela operação Lava Jato. O advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do TCU, Aroldo Cedraz, foi acusado por um dos réus e delatores da operação de receber 50.000 reais por mês para manter a empreiteira UTC informada sobre os processos que a envolvia no órgão. O delator também acusou o pagamento de 1 milhão de reais para que o caso da usina Angra 3, que estava sendo analisado pelo vice-presidente do TCU, Raimundo Carreiro, “fluísse” e não houvesse nenhum impedimento para que as obras fossem tocadas pela empreiteira. Tiago Cedraz teria intermediado esse pagamento. O advogado, que defende vários políticos, negou defender a UTC no tribunal e afirmou que irá processar o delator Ricardo Pessoa.
Nesta semana, quatro associações que representam auditores fiscais emitiram uma nota conjunta cobrando uma investigação dos ministros citados na investigação da Lava Jato. O Tribunal ainda não se manifestou sobre essa questão.
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