Aliados acusam Putin de apoiar al-Assad e atacar oposição
A crise síria irrompe em uma cúpula convocada para discutir o conflito na Ucrânia
A Rússia materializou na quinta-feira um terceiro dia consecutivo de bombardeios contra diferentes grupos na Síria em meio à perplexidade da aliança liderada por Washington. Em uma tensa reunião em Paris oficialmente dedicada à Ucrânia, François Hollande acusou o líder russo Vladimir Putin de apoiar o ditador sírio, Bashar al-Assad, e de bombardear “áreas controladas pela oposição” e não pelo Estado Islâmico. “Os ataques devem afetar o EI e apenas o EI”, disse Hollande. Sete aliados disseram o mesmo em um comunicado conjunto.
O encontro no Eliseu, que também contou com a presença da chanceler Angela Merkel e do presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, foi precedido por uma reunião bilateral entre Putin e Hollande. Os sorrisos com que o presidente francês recebeu o russo mudaram para gestos frios durante a reunião entre ambos. Putin deixou Paris sem falar com os jornalistas. Sintoma da tensão com que concluiu sua visita à capital francesa. Pouco antes de começar, aviões russos haviam lançado sua terceira onda diária de bombardeios na Síria, para espanto da aliança liderada pelos EUA.
Para Paris, a saída de al-Assad do poder é condição indispensável para uma solução política
Antes de receber Putin, tanto Hollande como Merkel assinaram um comunicado, também assinado por cinco países – Estados Unidos, Arábia Saudita, Catar, Reino Unido e Turquia – no qual exigem que Moscou “cesse imediatamente seus ataques contra a oposição síria e os civis e concentre seus esforços em combater o Estado Islâmico”. Para os signatários, a irrupção da Rússia no barril de pólvora sírio só contribuirá para uma “escalada”. Hollande disse que essa radicalização ameaça a “integridade” do país, porque pode levar a uma divisão do território entre o regime de al-Assad e o Estado Islâmico.
Novos bombardeios em áreas sem o Estado Islâmico
A Rússia bombardeou a Síria na quinta-feira pelo terceiro dia consecutivo, principalmente as áreas controladas por grupos insurgentes rivais do Estado Islâmico (EI), de acordo com o Observatório Sírio para os Direitos Humanos.
Moscou disse que fez 14 voos sobre a Síria na quinta-feira, dos quais seis atingiram objetivos do EI, de acordo com o Ministério da Defesa. Nesses ataques foi destruído um centro de operações militares do EI na província de Idlib.
Mas o Observatório Sírio para os Direitos Humanos explica que a influência do EI na maioria das áreas bombardeadas, no norte e no oeste do país, é pouca ou nenhuma.
Para o presidente francês, é óbvio que, “desde o começo”, a Rússia “apoia o regime de Bashar e agora aumenta esse apoio”. Hollande é o líder ocidental que mais insiste em que, embora aposte por uma “solução política” para o conflito, a solução não pode passar pelo ditador.
Hollande se sente apoiado nessa estratégia. “Não pode haver uma solução política com Bashar al-Assad. Oponho-me. E Obama se opõe. E outras potências se opõem. Os russos devem tirar as consequências”, disse antes de ver Putin.
Em relação a essa solução política, Hollande insistiu que está disposto a participar de negociações com a Rússia e o Irã, o outro principal aliado de Assad, mas, “se Bashar é o interlocutor, não haverá progressos”, afirmou.
A reunião entre Putin e Hollande, os dois últimos líderes que decidiram intervir militarmente na Síria com uma margem de apenas três dias, destacou a guerra de informação que acontece paralelamente em relação a quais objetivos concretos os aviões russos estão atacando.
Depois dos primeiros bombardeios russos de quarta-feira, Laurent Fabius, ministro das Relações Exteriores francês, afirmou que toda adesão à aliança militar na Síria será “bem-vinda”, se for dirigida “contra o Daesh [acrônimo do Estado Islâmico] e só contra grupos terroristas” e, ao mesmo tempo, cessarem os ataques contra civis e for realizado um processo político que implique a saída de al-Assad. É a mesma mensagem que Hollande transmitiu a Putin, segundo as autoridades francesas.
Paris deseja que, se os acordos sobre a Ucrânia forem cumpridos, a Europa levante as sanções contra a Rússia
A chanceler alemã deixou claro que “não há nenhuma diferença entre a Alemanha e a França” ao abordar a crise síria. “Ambos salientamos o fato de que o Estado Islâmico é o inimigo a ser batido”, acrescentou Merkel durante uma aparição conjunta com Hollande.
Tanto Hollande como Merkel, que também realizou uma reunião bilateral com Putin, rejeitaram o tempo todo que exista “um nexo, uma relação” entre o conflito na Síria e o da Ucrânia. Rejeitaram assim as hipóteses cogitadas por altos funcionários ocidentais segundo as quais o papel de destaque do líder russo no Oriente Médio, onde se tornou um interlocutor inevitável, pode implicar em concessões na Ucrânia. Merkel é a líder europeia mais afetada agora pela crise síria, uma vez que é para a Alemanha onde todos os dias milhares de refugiados se dirigem. Se a guerra se intensifica, aumentará também a saída de refugiados para a Europa.
Os quatro líderes reunidos conseguiram avanços positivos na crise na Ucrânia. Hollande e Merkel disseram que os mandatários concordaram com novas retiradas de armas pesadas e leves da frente de batalha, uma vez que o cessar-fogo seja respeitado “globalmente”.
Eles também concordaram que as eleições que se realizarão nas regiões Donetsk e Lugansk, controladas pelos separatistas russos, aconteçam sob uma nova lei eleitoral aprovada por Kiev. Paris deseja que, se os avanços continuarem, a Europa levante as sanções impostas a Moscou depois de sua anexação da Criméia.
Apesar desses avanços, e apesar de que a maior parte da reunião tenha sido dedicada à Ucrânia, a atualidade na Síria tirou toda a proeminência da crise naquele país, que agora passa a um terceiro plano em benefício de Putin.
Obama: estratégia russa na Síria é uma “receita para o desastre”
O presidente Barack Obama disse na sexta-feira que os bombardeios da Rússia na Síria são “contraproducentes” e que o plano de Putin de atacar quem se opõe ao regime de al-Assad, inclusive a oposição moderada, é uma “receita para o desastre”. Se Moscou não mudar sua estratégia e cooperar com o resto da comunidade internacional, vai se meter num “pântano” do qual será muito difícil sair, advertiu Obama em uma entrevista coletiva na Casa Branca.
“Qualquer tentativa de Rússia e Irã de apoiar al-Assad e tentar pacificar a população vai metê-lo num pântano, não vai funcionar”, disse o presidente norte-americano.
Embora não descarte novas negociações com Moscou para buscar uma saída conjunta, que passa necessariamente por uma “transição” em Damasco, Obama rejeitou que a estratégia russa seja a estratégia a seguir.
“Não vamos cooperar com uma campanha russa para tentar destruir qualquer um que estiver farto com o comportamento de al-Assad”, disse Obama. Ele lembrou que, enquanto a Rússia só conta com Damasco e o Irã, “o resto do mundo faz parte da nossa coalizão”.
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