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Rússia admite que ataques na Síria não se limitam ao Estado Islâmico

EUA consideram que intervenção militar de Moscou não abalou o Estado Islâmico

Fragmento de um vídeo que mostra um ataque russo em Homs.
Fragmento de um vídeo que mostra um ataque russo em Homs.Uncredited (AP)

A Rússia informou nesta quinta-feira que seus aviões voltaram a atacar alvos “terroristas” em território sírio, no segundo dia de uma ofensiva em apoio ao regime sírio. Segundo Moscou, caça russos mobilizados nas províncias de Idlib, Hama e Homs atingiram instalações do Estado Islâmico previamente localizadas por drones (aviões não tripulados). Apesar da insistência russa em dizer que o alvo dessas operações são os jihadistas – também combatidos pelos EUA no norte da Síria –, as três províncias mencionadas no comunicado têm escassa presença do EI, embora sejam reduto de milícias ligadas à Al Qaeda. Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, admitiu na quinta-feira que a lista de objetivos dos caças russos não se restringe a posições do EI.

“As organizações [alvos dos ataques] são conhecidas, e os objetivos são escolhidos em coordenação com as Forças Armadas da Síria”, disse Peskov a jornalistas. Fontes da inteligência síria citadas pela agência France Presse e por um canal libanês de TV revelaram que, também nesta quinta-feira, aviões russos atingiram posições da coalizão islâmica Exército da Conquista, formada, entre outros, pela Frente Al Nusra (braço sírio da Al Qaeda) e pela milícia Ahrar al Sham.

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O primeiro bombardeio russo na Síria aconteceu na quarta-feira, tendo como alvo posições de grupos insurgentes inimigos do regime de Bashar al Assad. O ataque elevou a tensão entre Moscou e Washington, apesar de o ministério russo da Defesa ter insistido na quarta-feira que apenas alvos do EI haviam sido atingidos. O secretário de Defesa norte-americano, Ashton Carter, afirmou no entanto que os primeiros indícios indicam que “provavelmente” os bombardeios russos atingiram áreas sem presença do EI. “Esse tipo de ação pode inflamar a guerra civil”, lamentou.

Fontes norte-americanas citadas pelo jornal The New York Times observaram que, entre os objetivos atingidos pelos russos, está um grupo rebelde treinado pela CIA. Tanto Carter como o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, criticaram a Rússia por ter informado sobre o ataque com pouca antecedência.

Na noite de terça-feira, o presidente Vladimir Putin, recém-chegado dos EUA, se reuniu com o Conselho de Segurança do Kremlin para debater o combate antiterrorista. Após obter o aval da Câmara Alta do Parlamento russo para usar a força militar na Síria, Putin disse em uma reunião governamental que não pretendia “mergulhar de cabeça” no conflito sírio, salientando que a intervenção ocorreria dentro de “parâmetros previamente estabelecidos” e se limitaria a prestar assistência aérea ao Exército de Assad, “sem participação em operações terrestres”.

A duração da missão, segundo Putin, estaria limitada “ao prazo de execução das operações ofensivas do Exército sírio”. O presidente acrescentou que o envolvimento russo na operação antiterrorista na Síria se baseia no direito internacional e significa uma resposta à solicitação oficial de ajuda feita por Assad. Ele observou também que EUA, Austrália e França, cujos aviões bombardeiam posições do EI atualmente, tampouco receberam um mandato para isso do Conselho de Segurança da ONU nem um pedido de Damasco.

A Rússia “considera possível e indicado unir os esforços de todos os Estados interessados” na luta contra o Estado Islâmico, apoiando-se nos Estatutos da ONU, segundo Putin. “O único caminho correto” na luta contra o terrorismo internacional, disse ele, é “atuar com antecipação, lutar e aniquilar os combatentes e os terroristas no território que já conquistaram, não esperar que venham até a nossa casa”.

Críticas dos EUA

Carter considerou nesta quarta-feira que a estratégia russa na Síria está “fadada ao fracasso”. O secretário de Defesa argumentou que o objetivo russo de lutar contra o EI enquanto apoia ao regime de Assad é “contraditório” e só aumenta o risco de deterioração da guerra civil síria, porque reforçaria os grupos extremistas sem procurar uma solução política para o conflito.

A Rússia afirma que os ataques estão sendo coordenados numa recém-inaugurada instalação do Iraque, com a participação de autoridades iranianas e iraquianas. Não está claro, no entanto, o grau de informação mútua que flui entre Moscou e as potências ocidentais que bombardeiam os militantes islâmicos na Síria. A julgar por informações ocidentais, a Rússia se antecipou às conversações militares com representantes norte-americanos. Nesse contexto, o secretário Kerry e seu homólogo russo, Serguei Lavrov, anunciaram na quarta-feira à imprensa, após uma reunião do Conselho de Segurança da ONU, que militares de ambos os países em breve manterão contato para evitar possíveis incidentes.

O acordo tem como objetivo “evitar incidentes indesejados”, disse Lavrov ao lado de Kerry, após o terceiro encontro entre eles nos últimos dias, segundo a agência Efe. Kerry disse ter reiterado as “preocupações” de Washington sobre os objetivos da intervenção russa na Síria e acrescentou que contatos entre militares russos e norte-americanos poderiam começar já nesta quinta-feira.

Segundo o jornal russo Novaia Gazeta, os militares russos consultaram os representantes do setor petroleiro, perguntando sobre a localização de oleodutos e sobre as estações de bombeamento que deveriam ser inutilizadas para impedir o transporte e o contrabando de petróleo bruto. As empresas petroleiras, segundo o jornal, forneceram ao Ministério de Defesa informações minuciosas sobre as instalações controladas pelo EI. O contrabando de petróleo é uma das principais fontes de financiamento do grupo terrorista.

Putin recordou que o EI “há muito tempo declarou o nosso país como inimigo”. Antes, o chefe do gabinete presidencial, Serguei Ivanov, havia dito que a missão atende à defesa de interesses nacionais e que o número de cidadãos russos e de outras repúblicas ex-soviéticas que aderem ao Estado Islâmico “aumenta não com o passar dos dias, e sim com o passar das horas”.

Uma pesquisa feita em setembro pelo instituto Levada mostrou que 69% dos russos não desejavam que Moscou desse ajuda militar direta ao Governo sírio. No entanto, o presidente da república autônoma da Chechênia, Ramzan Kadirov, lamentou que Moscou não tivesse enviado a infantaria para lutar contra o EI.

A Rússia emprega na Síria caças Su-30, aviões-Su-24 e Su-34, helicópteros Mi-24 e aviões de transporte Tu-154, Tu-155, Il-76 e An-124, que procedem em sua maioria da base da Latakia. Alguns dos aparelhos russos que participaram dos ataques de quinta-feira eram pilotados por sírios.

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