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Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Liderança de Dilma Rousseff desmorona

Rejeição a seu discurso se deve ao acúmulo de dados negativos em três frentes de seu Governo: a econômica, a política e a ética

Juan Arias

O primeiro discurso à nação da presidenta Dilma Rousseff, aos dois meses do início de seu segundo mandato, recebido na noite de domingo em uma dúzia de cidades, entre elas as emblemáticas São Paulo e Brasília, com vaias e um panelaço, pode ter sido uma prévia das manifestações de protesto contra ela anunciadas para o próximo domingo, dia 15.

A rejeição ao discurso da presidenta foi mais significativa por ter se dado no momento de começar a falar, antes de se saber o conteúdo de suas palavras. Era um sinal de que para uma parte da população, em especial a classe média mais bem informada, sua credibilidade está seriamente comprometida.

Mais que contra sua pessoa, já que ninguém a considera uma política corrupta, a rejeição a seu discurso se deve ao acúmulo de dados negativos em três frentes de seu Governo: a econômica, a política e a ética.

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Desde a redemocratização do país o Brasil não vivia um momento tão crítico. O anúncio de cortes que afetam tanto a classe média quanto os mais pobres, com o país à beira da recessão, onde só crescem a inflação, o valor do dólar, o déficit público, os juros dos bancos e até o fantasma do desemprego, junto com os escândalos de corrupção política, criou um curto-circuito entre a opinião pública e a Presidência da República.

Dilma, bode expiatório ou talvez vítima? Pouca diferença faz para uma população desencantada e irritada. A ela se atribui falta de traquejo político, dificuldade de delegar, falta de tato e de vontade de lidar com um Congresso no qual acabou perseguida e encurralada inclusive por boa parte de sua ampla maioria de dez partidos.

A isso se junta o fato de a presidenta nunca ter contado, menos ainda neste momento, com o apoio pleno de seu partido (PT), e a sua relação com seu criador e tutor, o ex-presidente Lula da Silva, ter acabado por se deteriorar.

Se um dia se falava do dilmismo como continuação gloriosa do lulismo e dos anseios não confessos da presidenta de empreender um voo político próprio, sem a muleta do carismático Lula, hoje o escândalo da Petrobras, que viveu sua maior virulência nos governos Lula-Dilma, perpetrada pelas figuras por eles colocadas na empresa, que acabou saqueada para financiar fundamentalmente os partidos governistas, isso parece ter se tornado um sonho já apagado.

As ruas pedem a saída de Dilma do governo e gritam “fora PT”. Talvez ainda não saibam o que querem em seu lugar. Não sabem o que desejam para amanhã, mas sim o que exigem para hoje.

O próximo teste serão as duas manifestações anunciadas: uma do PT contra as medidas de austeridade de seu próprio Governo, na próxima sexta-feira, e outra no domingo, convocada nas redes sociais para exigir a saída de Dilma. Nelas a presidenta levará tiros pelas duas frentes.

Segundo analistas, o modelo econômico de Rousseff fracassou, como apontam todos os índices negativos. Nesse ponto Dilma se distanciou do modelo Lula, que disse aos senadores do PT e dos outros partidos aliados, segundo vazou um dos presentes, que Dilma deveria “pedir perdão ao país pelo fracasso de sua crise econômica, reconhecer que seu modelo fracassou, comprometer-se a mudá-lo e explicar como pensa em fazer isso”.

No domingo, em seu discurso, Rousseff pintou, em vez disso, um país cor-de-rosa, golpeado apenas por uma pequena vaga passageira, culpa da crise internacional.

Até quando irá a resistência de Dilma, já que quem a conhece assegura que não cairia sozinha?

Ninguém quer hoje ser profeta de um futuro econômico que parece para os especialistas em economia e política cada dia mais incerto e emaranhado.

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