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Lula: “O exercício do poder acaba fragilizando um partido”

Com o PT no divã em sua festa de 35 anos, o ex-presidente faz um mea culpa sobre erros

Dilma e Lula no aniversário de 35 anos do PT.
Dilma e Lula no aniversário de 35 anos do PT.Paulo Fonseca (EFE)

A festa de 35 anos da criação do Partido dos Trabalhadores, celebrada nesta sexta-feira em meio ao agravamento dos escândalos de corrupção que mancham o partido, funcionou como uma espécie de terapia coletiva. No divã, a direção da legenda e seu nome mais proeminente, Luiz Inácio Lula da Silva, refletiram sobre o distanciamento da sigla de suas origens e pediram a união da esquerda e a defesa, nas ruas, do “projeto eleito pelo povo”. Também analisaram que o partido precisa se reaproximar dos movimentos sociais, dos quais se distanciou ao assumir posições vistas como conservadoras, o que levou a um discurso de defesa das polêmicas medidas econômicas adotadas pela presidenta Dilma Rousseff desde que assumiu o segundo mandato, em janeiro deste ano.

No palco onde estavam nomes importantes do quadro político do partido, João Vaccari Neto, tesoureiro do PT suspeito de receber dinheiro de desvios da Petrobras para o caixa dois de campanha, foi aplaudido e defendido. “Querem criminalizar o dinheiro honesto que o partido arrecadou. Não há nenhuma prova contra o partido. Se algo de concreto vier a ser encontrado, se alguém tiver traído a nossa confiança, que seja julgado e punido dentro da lei. Porque o PT não compactua e nem compactuará com a impunidade”, afirmou Lula, que se disse “indignado” com o fato de a Polícia Federal ter buscado Vaccari Neto em casa para depor no dia anterior. “Teria sido muito mais simples ter convidado o nosso tesoureiro para se apresentar.” Depois, desabafou, segurando um papel onde estava escrito seu discurso: “Não gosto de ler discurso, mas se eu for falar tudo o que penso, vai ser muito ruim. Vai parecer que estou falando com o fígado e eu não quero estragar meu fígado.” Falou, então, por 31 minutos, de forma contida e pausada, como alguém que precisa passar uma mensagem importante e não pode esquecer de nenhuma palavra.

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A mensagem era clara e repetia o conteúdo do que havia sido dito minutos antes pelo presidente da sigla, Rui Falcão: o PT precisa voltar às suas origens. Não pode ignorar o "desgaste" e tem que ter "humildade para reconhecer que precisa mudar”, nas palavras de Lula. Uma fala que animou os militantes presentes. O sindicalista destacou a crise institucional do partido, uma sigla que tem tido  dificuldades para encontrar novos nomes que empolguem e para repor a militância jovem perdida nos últimos anos. Para ele, a chegada da legenda ao poder há 12 anos burocratizou sua estrutura. Seus quadros passaram a entrar na “disputa por cargos em gabinete”. "Ao invés de irem para a porta da fábrica, vão para uma repartição pública", afirmou. Afastaram-se, assim, da vida interna do partido, das ruas, da participação nos movimentos sociais. “O exercício do poder ao invés de fortalecer acaba fragilizando um partido. O PT precisa ouvir e dialogar com uma geração que não conhece a nossa história, que era criança quando chegamos ao poder e não se lembra como era o país antes de a gente governar. Precisamos de um novo pacto político com a sociedade.”

Rui Falcão já havia ressaltado essa necessidade minutos antes. “Precisamos nos unir com os partidos de esquerda para desencadear um amplo projeto. É com essa convicção que devemos sair às ruas. É hora de sermos cada vez mais o PT”, afirmou.

Na mesa principal do palco, sentaram ao lado de Lula, de Rousseff, do ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, e de governadores da sigla, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, e o coordenador nacional do Movimento dos Sem-Terra (MST), Alexandre Conceição, grupos que nos últimos anos fizeram críticas à política adotada pelo partido. Era um recado simbólico da importância dos movimentos sociais naquela comemoração. A militância, ”a alma do partido”, estava conclamada a se mobilizar. O primeiro ato foi anunciado ali mesmo. No próximo dia 24, a CUT sairá às ruas em defesa da Petrobras. O argumento da central é que a série de denúncias que envolvem a petroleira neste momento faz parte de uma estratégia para enfraquecê-la e facilitar a venda de ativos a empresas privadas.

Querem criminalizar o dinheiro honesto que o partido arrecadou. Não há nenhuma prova contra o partido Lula, ex-presidente do Brasil

Rousseff, que chegou ao encontro do PT no final do dia, também mencionou a empresa em seu discurso. “Há um reconhecimento de que a Petrobras é a empresa mais estratégica do país. Temos que fechar as portas da corrupção. Os pescadores de águas turvas não vão acabar com o modelo de partilha”, disse a presidenta, em referência ao modelo adotado durante seu Governo para garantir recursos da petroleira à saúde e educação.

Imerso na pior crise desde que nasceu, composta pelas denúncias de corrupção na maior empresa estatal brasileira e pela falta de apoio no Congresso, o partido enfrenta ainda a mágoa de muitos dos saíram às ruas para eleger Rousseff durante a campanha polarizada de outubro passado. Na época, a fragmentada esquerda se uniu, com o objetivo de derrotar o projeto de Aécio Neves (PSDB), visto como mais conservador. Esperava-se que, em resposta à mobilização, o partido desse uma guinada à esquerda, rumo, justamente, às suas origens, o que não ocorreu. Planejando a governabilidade diante de um Congresso hostil, Rousseff escolheu ministros como Kátia Abreu (Agricultura), acusada de defender os interesses dos grandes proprietários de terra, Gilberto Kassab (Cidades), ex-prefeito de São Paulo rejeitado pela esquerda, e Joaquim Levy (Fazenda), um nome neoliberal. As primeiras medidas tomadas pela presidenta reempossada afetavam os trabalhadores e levavam a área econômica em direção ao que era proposto pelo próprio Neves. Um gosto amargo para os eleitores que tinham esperança numa maior aproximação com a esquerda.

Pedir para que todos saiam às ruas, mais uma vez, para defender o partido e o Governo, não é, portanto, uma tarefa simples. Por isso, em um discurso que durou 55 minutos, o mais longo da noite, Rousseff fez questão de explicar cada ponto de suas decisões. “Os ajustes que estamos fazendo são necessários para que a gente amplie as oportunidades dos brasileiros e tenha força para priorizar as nossas políticas sociais”, disse ela. O próprio ex-presidente Lula, que segundo a imprensa tem se distanciado dela por discordar de parte das medidas, tocou na questão. “A companheira Dilma teve que tomar algumas medidas necessárias (...) mesmo que esse povo reclame nos corredores, ele tem certeza de que você vai nos entregar o que a gente precisa, Dilma”, afirmou ele. Para tentar desfazer a imagem de que os dois estão afastados, Rousseff e Lula conversaram durante todo o evento, alheios aos discursos. Só pararam para ouvir o recado de Mujica. “Essa é uma luta muito dura, muito difícil. Sempre foi. Há momentos de grande glória e de vitórias. Há momentos de derrotas. Há momentos de recomeçar. Mas os únicos derrotados são os que deixam de lutar.”

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