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O jardim suspenso da Babilônia paulistana

Sancionado nesta quinta-feira, o Plano Diretor prevê a criação de uma lei para transformar o Minhocão em um parque

Marina Rossi
lustração de como seria um parque no Minhocão
lustração de como seria um parque no MinhocãoAss. Amigos do Parque Minhocão

Depois de quase um ano entre idas e vindas na Câmara dos Vereadores, discussões acaloradas e manifestações públicas, o Plano Diretor de São Paulo finalmente foi sancionado, nesta quinta-feira, pelo prefeito da cidade Fernando Haddad (PT). E entre as diretrizes que regularão a cidade até 2030 estão algumas vitórias para o paulistano. Uma delas é a previsão da criação de uma lei para desativar o Elevado Costa Silva, paulistaneamente conhecido como Minhocão, e transformá-lo parcialmente ou integralmente em um parque. Se aprovada, a via expressa de quase três quilômetros e meio, que liga a Praça Roosevelt no centro da cidade, ao largo Padre Péricles, em Perdizes, pode se transformar em uma área inspirada no parque suspenso High Line, em Nova York.

O projeto de lei já existe. Publicado em fevereiro deste ano e com coautoria de sete vereadores - tanto da oposição quanto do Governo - o Projeto de Lei 10/2014 prevê uma desativação gradual do Elevado ao longo de quatro anos. Para o presidente da Associação Parque Minhocão, Athos Comolatti, o Plano Diretor é um passo a mais em direção à construção do parque. “Estou esperançoso. A prefeitura não pode ser esquizofrênica ao ponto de aprovar uma sanção e, ao mesmo tempo, não aprovar a desativação (do elevado)”, diz.

Ass. Amigos do Parque Minhocão

Hoje, o Minhocão fica desativado para a passagem de veículos aos domingos e feriados, durante o dia todo, e nos outros dias, das 21h30 às 6h30, quando reabre para a passagem dos mais de 70.000 veículos que trafegam pela via diariamente. De acordo com o texto do projeto de lei, primeiramente o local seria fechado aos sábados também. Em um segundo momento, no período de férias escolares. Posteriormente, seria restrito o horário de circulação de veículos entre as 20h e as 7h. Numa penúltima fase, a circulação de veículos só seria permitida no sentido bairro-centro pela manhã e somente no sentido centro-bairro à tarde, até ser, finalmente, desativado por completo, 24 horas por dia, sete dias por semana. Segundo um dos coautores do projeto, o vereador Nabil Bonduki (PT), a discussão dessa lei deve entrar na pauta da Câmara dos Vereadores neste segundo semestre.

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O projeto do parque ainda não existe concretamente. Embora em 2006 a Prefeitura tenha feito um concurso público para eleger o melhor projeto para transformar o local, o trabalho eleito foi engavetado. De autoria dos arquitetos Juliana Corradini e José Alves, a proposta era manter o elevado quase que “encaixotado”, utilizando a parte de cima dessa “caixa” para parques e áreas de convivência. “A ideia do parque existe desde 1987, lançada pelo arquiteto Pitanga do Amparo. Na época, talvez porque não exista nenhuma referência externa, foi considerado um projeto um tanto exótico e não foi pra frente”, explica Comolatti. “Com a construção do High Line em Nova York, esse projeto começou a se transformar em algo mais palpável”.

O projeto do parque ainda não existe concretamente. Embora em 2006 a Prefeitura tenha feito um concurso público para eleger o melhor projeto para transformar o local, o trabalho eleito foi engavetado

De acordo com Comolatti, o maior obstáculo para que o local se transforme em um parque é a falta de mobilização, tanto do poder público, quanto das pessoas. “Tudo tende a ficar como é. O Minhocão funciona há décadas e as pessoas estão acostumadas com isso e preferem não mexer”, diz. Outro aspecto importante é o escoamento dos veículos que trafegam por lá. “Desativar o Minhocão causaria um caos no trânsito muito grande”, diz Bonduki. “Até por isso, a proposta é gradativa”. Já para o arquiteto Abílio Guerra, essa não seria uma questão tão importante assim. “Imagino que, para acomodar um pouco a opinião pública, desativar aos poucos seria a maneira mais adequada. Mas também não vejo problema de desativar de um dia para o outro”, diz. “O trânsito em geral sempre vai pra algum outro ponto e sempre estará congestionado”.

Segundo Guerra, a maioria dos arquitetos defende a demolição do Minhocão, mas, de acordo com ele, isso sim traria problemas para a região. “O problema da demolição, além de ser algo caríssimo e ter questões ambientais enormes envolvidas, como o ruído e a poeira que levantaria, é a certeza de que haverá um processo de especulação imobiliária e a retirada da população que hoje vive no entorno”, diz. “Acho que a maneira mais adequada de tratar essas pessoas que moram lá há décadas e sofrem com o barulho seria construir um parque”.

Acho que a maneira mais adequada de tratar essas pessoas que moram lá há décadas e sofrem com o barulho seria construir um parque” Arquiteto Abílio Guerra

A cicatriz da ditadura

O controverso Elevado Costa Silva é uma via expressa inaugurada em 1971 pelo então prefeito de São Paulo, Paulo Maluf. Batizada com o nome de um general que presidiu o país nos anos da ditadura militar, o Elevado é chamado também de “a cicatriz de São Paulo”. Com a construção da via, os prédios do entorno tiveram seus valores reduzidos devido ao imenso barulho e à poluição causada pelo tráfego.

Devido ao barulho e aos acidentes que ocorriam principalmente durante a noite, em 1976 o Minhocão passou a ser interditado das 21h30 às 6h30. Hoje, é fechado também aos domingos e feriados. Caminhar pelo Minhocão em um domingo é tomar o lugar dos carros ao longo do viaduto. Dezenas de pessoas frequentam o local para uma corrida ou um passeio de bicicleta dominical. É possível encontrar, sem muito esforço, famílias fazendo churrasco em uma grelha improvisada, crianças brincando em uma piscina de plástico, gente paquerando, tomando sol, ouvindo música. Olhando o Elevado num dia de semana qualquer, a sensação é de que você não está no mesmo lugar.

O arquiteto Abílio Guerra até arriscaria algumas ideias para o desenho de um parque suspenso aos moldes do nova-iorquino High Line. “Tendo a achar que seria mais voltado para caminhadas, com arbustos mais baixos ao invés de árvores altas. Seria um parque duro como é a cidade de São Paulo”.

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