A educação brasileira: um longo caminho a percorrer, mas avanços são evidentes
Em seminário em Brasília, responsável pelo programa de avaliação PISA, Andreas Schleicher, vê um "copo meio cheio" no país, que se atreveu a encarar a exposição de seus resultados em comparação com outras nações com vistas a corrigir a rota do sistema educacional
Quando se fala em educação, a imagem do Brasil não é das melhores. Principalmente quando se decide compará-lo com países mais desenvolvidos. "Mas o copo está meio cheio, e não meio vazio", disse Andreas Schleicher, um dos responsáveis pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), o maior ranking de avaliação de desempenho escolar do mundo.
Diretor-adjunto de Educação da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), Schleicher apresentou alguns dados relativos à educação brasileira e internacional durante o seminário "PISA e PIAAC: Melhores competências, melhores empregos", nesta terça-feira, em Brasília. O evento foi promovido pelo EL PAÍS em conjunto com a Fundação Santillana, a própria OCDE, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e o Ministério da Educação.
Embora admita que o país tem um longo caminho a percorrer, o diretor da OCDE lembrou que o Brasil foi o país que mais avançou nos indicadores desde 2000, quando teve início o levantamento internacional. Schleicher disse ao EL PAÍS que é preciso reconhecer que os brasileiros, que não integram a OCDE, decidiram encarar os desafios de uma exposição aos resultados do PISA desde o início, apesar das seguidas críticas de alguns especialistas que acreditam que, em vez de ajudar, o levantamento acabaria por desestimular a evolução do sistema educacional, dada a grande distância a ser percorrida em relação a países mais desenvolvidos.
Em dezembro do ano passado, quando foi feita a divulgação de seu desempenho em matemática, por exemplo, o Brasil apresentou resultados importantes, ao elevar sua nota de 356 para 391, tornando-se o país que mais avançou desde 2003 na área. O relatório da OCDE também destacou na ocasião a expansão do Brasil na educação primária e secundária, com crescimento de 65% em 2003 para 78% em 2012 no total de crianças de até 15 anos na escola.
Ainda do lado cheio do copo, os alunos brasileiros voltaram a se destacar pela capacidade de resolver problemas práticos, segundo o especialista. Mas, apesar da evolução, o país ocupou o 58º lugar de um total de 65 países analisados em matemática, com média inferior às demais nações numa série de indicadores.
Entre os pontos preocupantes, no entanto, persiste o fato de que o Brasil investe um terço da média dos demais países da OCDE por aluno
O PISA é aplicado a alunos na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. As avaliações do PISA acontecem a cada três anos, abrangendo três áreas do conhecimento – Leitura, Matemática e Ciências. No Brasil, o exame é coordenado pelo INEP. No geral, o exame reúne meio milhão de estudantes, que representam um universo de 28 milhões de jovens de 15 anos em 65 países ou economias.
Segundo o presidente do INEP, José Francisco Soares, também presente ao evento, o documento tem tido "uma importância fundamental" nas avaliações do governo.
Entre os pontos preocupantes, no entanto, persiste o fato de que o Brasil investe um terço da média dos demais países da OCDE por aluno. E o investimento também deixa a desejar entre os professores. Segundo Schleicher, a correlação entre a valorização dos profissionais de ensino e os resultados dos alunos na prática é inevitável. Como exemplo, citou a Coreia do Sul, onde os professores têm a melhor relação entre salários e Produto Interno Bruto (PIB) no mundo.
Uma das esperanças para a sociedade brasileira é o Plano Nacional de Educação, que está na Câmara dos Deputados e deverá ser votado no próximo dia 7, prevendo o aumento de 5% para 10% do PIB em Educação. O plano estipula diretrizes para o setor até 2020. Um dos pontos mais importantes do projeto é justamente a equiparação de salários dos professores, que hoje ganham 40% menos que outros profissionais com o mesmo nível de formação.
A origem social não é um destino, e o aluno precisa compreender que pode ser bem-sucedido através do aprendizado Andreas Schleicher
Mas um dos desafios quando se fala em alocação de recursos para o setor educacional é justamente saber aplicá-los bem. "O Brasil poderia fazer muito mais com mais dinheiro em Educação. Mas a discussão não é só gastar, senão onde gastar. Investir onde tenham um maior impacto, atraindo, desenvolvendo, e retendo líderes escolares de alta qualidade", afirma o diretor da OCDE.
A escolaridade também ocupa um papel de destaque em países como o Brasil por sua possibilidade de ascensão social. "A origem social não é um destino, e o aluno precisa compreender que pode ser bem-sucedido através do aprendizado". "As competências podem ser aprendidas, e, portanto, todos os jovens podem conseguir", acrescenta Schleicher. No último relatório do PISA, os resultados brasileiros mostraram que a evolução econômica do país levou a um maior número de crianças à escola.
Adultos
Uma das propostas do seminário em Brasília é debater o papel de uma nova avaliação, que inclui também a análise das habilidades de adultos até 65 anos. Hoje a OCDE trabalha com o Programa para a Avaliação Internacional das Competências dos Adultos (PIAAC, em inglês), que em um primeiro momento avaliou 24 países. Os primeiros resultados permitiram, por exemplo, comparar as competências dos adultos do Japão e dos Estados Unidos. Embora os dois países tenham formação de adultos similares, os norte-americanos aplicam muito mais seu conhecimento na vida prática e no trabalho do que os japoneses. Esse tipo de diagnóstico visa a estimular o monitoramento de questões como produtividade e a adaptação do sistema de ensino à reciclagem dos adultos, uma vez que as sociedades estão envelhecendo, ao mesmo tempo em que a "vida útil" das pessoas avança.
O PIAAC está dando início a um segundo ciclo de diagnósticos, incluindo novos países, como Cingapura, Turquia e Grécia. Na América Latina, somente o Chile foi incluído. O Brasil ainda não aderiu à avaliação, embora o indicador esteja sendo considerado, explica Soares, o presidente do INEP, ligado ao Ministério da Educação. "O Brasil já tem muitas avaliações e é necessário ver como o PIAAC poderia se relacionar com outros instrumentos utilizados hoje para fazer os diagnósticos sobre nosso sistema de educação", afirma. Só o INEP trabalha com oito programas de avaliação, incluindo o PISA, que faz as comparações internacionais.
Hoje há inclusive um debate para a preparação de um trabalho comparativo com os países do Mercosul. Tratam-se de instrumentos importantes que auxiliam na criação de parâmetros que induzam a melhorias na qualidade do ensino baseado nos diagnósticos que essas avaliações permitem fazer. Soares acredita que o seminário promovido nesta terça-feira em Brasília é um primeiro passo para entender o que é e como funciona o PIAAC.
Melhorias brasileiras
Também presente ao evento, o secretário-executivo do Ministério da Educação, Luiz Cláudio Costa, destacou o crescimento dos cursos técnicos no país - 6,8 milhões de pessoas formadas em cursos do gênero desde 2011 - e os ganhos obtidos na inclusão relacionada à educação superior nos últimos anos. Desde 2003, por exemplo, o número de matriculados nas universidades passou de 3,8 milhões para 7 milhões. Costa reconheceu em seu discurso, no entanto, alguns gargalos brasileiros, como a necessidade de se ampliar a formação no ensino médio.
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