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Identificada uma mutação genética que duplica o risco do Alzheimer

A alteração aumenta a produção das placas senis características da enfermidade É uma variação pouco frequente, presente em menos de 1% da população

Imagens do cérebro de um paciente com alzheimer.
Imagens do cérebro de um paciente com alzheimer.

As equipes que sequenciam grandes volumes de DNA estão se transformando em um dos principais aliados dos pesquisadores na hora de desvendar as raízes genéticas das enfermidades de maior incidência. Uma das últimas descobertas tem a ver com o mal de Alzheimer, que afeta cerca de 1,2 milhões de pessoas só no Brasil, numa estimativa de 2012 da Associação Brasileira de Alzheimer.

Mutações em um gene especialmente ativo nas zonas cerebrais sensíveis à aparição da enfermidade (como o hipocampo e o córtex) duplicam o risco de desenvolvimento da doença em idade avançada, a modalidade mais comum (em torno de 90% dos casos).

Essa enfermidade neurodegenerativa se desencadeia pela morte neuronal vinculada à presença de duas estruturas aberrantes no cérebro: a proliferação das chamadas placas senis (depósitos do peptídeo beta-amiloide) e a formação dos emaranhados neurofibrilares (um conglomerado de pequenas fibras de proteína).

A pesquisa publicada nesta quarta-feira na revista Nature foca as placas senis – concretamente o gene fosfolipase 3D (PLD3), que os autores do trabalho associam à geração do beta-amiloide. Pesquisadores da Universidade Washington, em Saint Louis (Missouri, EUA), estudaram os perfis genéticos de 29 pacientes afetados e 11 livres da doença, a partir de 14 famílias com um histórico de Alzheimer de aparição tardia. Cruzando os dados obtidos, eles observaram que a presença de uma rara variação do gene “aumenta significativamente” o risco de desenvolvimento da enfermidade, numa probabilidade que eles estimaram como sendo o dobro em relação à população geral. Mas o impacto das mutações desse gene pode ir além. Os pesquisadores, dirigidos por Carlos Cruchaga, advertem que estudos complementares sugerem que outras variações do PLD3 também aumentam a propensão à doença em populações de origem africana e europeia.

Ao todo, foram examinadas as características genéticas de cerca de 11.000 pessoas, e a mutação original foi detectada em menos de 1% dos afetados. “Essa é a grande debilidade do trabalho: o efeito da mutação é notável, mas o impacto clínico será limitado por ser tão minoritária”, observa Agustín Ruiz, da Fundação ACE – Instituto Catalão de Neurociências Aplicadas.

O trabalho do grupo norte-americano não é o primeiro a relacionar mutações genéticas ao Alzheimer. Desde 1993 já foram descritas 24 alterações. As 11 últimas foram relatadas em outubro graças ao Projeto Internacional para a Genômica do Alzheimer, por meio de um estudo do qual Agustín Ruiz participou. Isso, segundo ele, não tira a importância do trabalho publicado na Nature, como tampouco o fato de que outras mutações, como a do gene ApoE, elevem o risco muito mais (entre 3 e 14 vezes mais do que a média da população), ou sejam mais difundidos entre os pacientes (chegando a 40% dos casos).

O estudo tem dois aspectos “de muito interesse”, observa Ruiz, que, antes da publicação, já está replicando o trabalho publicado por Cruchaga (“Tivemos um acesso precoce a essa informação”, explica ele). Por um lado, pelo uso da nova tecnologia de sequenciamento que permite focar não o DNA inteiro, e sim os segmentos codificantes, ou seja, os genes que expressam proteínas. Mas, além disso, porque essa técnica foi empregada “de forma muito inteligente”, já que foi aplicada após uma seleção de casos com antecedentes familiares, comparando varreduras genéticas de doentes e pessoas saudáveis (empregadas como casos de controle), “o que permitiu encontrar o gene a um custo muito eficiente”. Apesar do pequeno impacto clínico que a mutação terá, por ser minoritária, Ruiz destaca que isso “não tira o peso do trabalho para o desenvolvimento de alvos terapêuticos”.

O estudo descreve o PLD3 como uma peça-chave nessa complexa enfermidade a respeito da qual, exceto pelos exames da sua vinculação genética, não existe um consenso científico sobre os mecanismos biológicos que a desencadeiam. Os pesquisadores observaram em cultivos que altos níveis de expressão do gene e da presença da proteína estavam relacionados aos baixos níveis de beta-amiloide, enquanto que, no caso contrário, aumentavam os níveis do peptídeo, cuja acumulação em placas é um dos traços da doença. Esse mesmo fenômeno foi observado em amostras do tecido cerebral obtido de pessoas afetadas, em comparação a pessoas sem o Alzheimer.

Uma vez que as atividades da indústria farmacêutica contra a doença estão centradas em seus esforços para combater o acúmulo de beta-amiloide, Ruiz considera especialmente relevante que tenha sido identificado o protagonismo do PLD3 e seu papel na criação das placas senis. Agora, o objetivo é confirmar os resultados descritos, atuar sobre sua atividade e observar se é uma opção útil na abordagem terapêutica da enfermidade.

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