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Uma nuvem de areia do Saara envolve Cuba, em plena etapa de desconfinamento

A tempestade de areia e poeira que viaja da África em direção à América Central golpeia Havana, única cidade da ilha onde as medidas de isolamento se mantêm

Uma mulher contempla a tempestade de areia do Saara na orla marítima de Havana, Cuba.
Uma mulher contempla a tempestade de areia do Saara na orla marítima de Havana, Cuba.Héctor Garrido
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WASHINGTON, DC - APRIL 30: Police investigate the scene where a shooter opened fire on the Cuban Embassy on April 30, 2020 in Washington, DC. According to authorities, no injuries have been reported after a gunman used an assault rifle to open fire on the embassy early on Thursday morning.   Sarah Silbiger/Getty Images/AFP
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“Éramos poucos e a avó pariu”, diz com senso de humor local Esteban, um habanero massacrado pelas circunstâncias. O ditado ―equivalente a “desgraça pouca é bobagem”― é pura picardia cubana. E as tais “circunstâncias” de Esteban, as mesmas que nos últimos dias infernizam a maioria dos cubanos, são amplamente conhecidas: o desabastecimento, a fila do frango, as restrições de movimento devido à covid-19, a crise cavalar que se espera quando a epidemia passar e também o efeito das sanções dos Estados Unidos, que parecem dispostos a arremeter mais uma vez contra as remessas que os emigrados podem enviar a seus familiares. Em meio a tudo isso, debruçado na amurada do Malecón, a avenida da orla marítima de Havana, Esteban olha para o céu e não vê o sol: uma gigantesca nuvem de areia vinda dos desertos do Saara e do Sahel chegou nesta semana à ilha e cobre sua capital desde a quinta-feira.

A nuvem percorreu 10.000 quilômetros da África, levada pelos ventos alísios.  Já abraçou Porto Rico, República Dominicana, Jamaica e outras ilhas do Caribe e, depois de passar por Cuba, penetrará em parte da América Central, México e sul dos Estados Unidos.

O raio de abrangência do fenômeno é ainda maior que o das gigantescas tempestades tropicais e furacões que açoitam a região nesta época do ano. A frente, de centenas de quilômetros de extensão, chega carregada de bilhões de partículas em suspensão que deixam o céu com uma cor entre leitosa e alaranjada, arrebenta os termômetros e pode causar afecções respiratórias.

Segundo o Instituto de Meteorologia de Cuba, na quarta-feira a cidade de Guantánamo (leste) registrou um recorde de temperatura para esta data: 37,4 graus Celsius. Sim, uma barbaridade. A sensação de calor que isso provoca é verdadeiramente cansativa, e as autoridades sanitárias recomendam a asmáticos e pacientes com outras doenças respiratórias que fiquem em suas casas. As partículas que estas nuvens transportam contêm, além de areia, minerais como ferro, cálcio, fósforo, silício e mercúrio, junto com vírus, bactérias, fungos, ácaros, estafilococos e poluentes orgânicos, altamente nocivos para a saúde humana e que também podem provocar pragas em arrozais, pomares e canaviais.

As nuvens são geradas por tempestades de areia e poeira do deserto do Saara e do Sahel (a faixa semiárida ao sul do maior deserto do mundo), as quais podem alcançar alturas de três a sete quilômetros. Uma vez que se erguem sobre o continente africano, avançam empurradas pelo fluxo dos ventos alísios, propagando-se pelo oceano Atlântico até chegar ao Caribe, México e o Sudeste dos Estados Unidos. Esses fenômenos são recorrentes, acontecem quase todo ano no verão boreal, mas há vezes, como esta, em que são de grande magnitude e se transformam num perigo.

Estas nuvens de pó originam uma massa de ar muito quente com valores baixos de umidade que fazem diminuir a probabilidade de chuvas e contribuem para aumentar as temperaturas, embora, por outro lado, atrapalhem o surgimento e desenvolvimento dos ciclones tropicais.

Desde o começo da semana, o céu vinha mudando de cor no leste de Cuba. A areia do Saara caía sobre lavouras e povoados, até chegar na quarta-feira a Havana, único território do país onde ainda se mantêm as medidas de isolamento pela pandemia, sem ter dado início à primeira fase da desescalada. A epidemia da covid-19 na ilha está praticamente controlada: na quarta-feira foram notificados apenas 2 novos casos, na terça-feira, 1, e na segunda-feira, 3. Mas o desconfinamento programado é muito gradual para evitar um repique, sobretudo na capital, onde há 15 dias se concentram quase todos os casos.

Com todos os bares e restaurantes fechados em Havana, onde o transporte público continua suspenso, dar uma volta ―curta― pelo Malecón, usando máscara, é o único consolo de Esteban, que se diz farto de tantas filas e dificuldades. “Outro dia passei oito hora em uma fila para pegar dois filés de frango. Olhe, o coronavírus passará, a areia do Saara também, mas o duro é que a crise e o desabastecimento chegaram para ficar”, considera este habanero, que diz não ser “pessimista, e sim realista”.

Em meio à bruma leitosa que se abate sobre Havana ―o Instituto de Meteorologia informou na quarta-feira que a concentração de partículas em suspensão era de 57 microgramas por metro cúbico de ar, e que na quinta-feira alcançaria valores de 163 microgramas por metro cúbico― Esteban olha para o horizonte e continua com a brincadeira: “Veja só: sem turismo, nem frango, nem perspectivas, agora só nos falta vir um furacão”.

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