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O especialista em vacinas que se diz alvo de represálias de Trump: “Enfrentaremos o inverno mais escuro”

Rick Bright declara no Congresso que a Administração norte-americana “ignorou os primeiros sinais” da pandemia e adverte contra a esperança de ter uma vacina em menos de 18 meses

Rick Bright, à esquerda, chega ao Comitê de Energia e Comércio da Câmara de Representantes, nesta quinta-feira.
Rick Bright, à esquerda, chega ao Comitê de Energia e Comércio da Câmara de Representantes, nesta quinta-feira.ERIN SCOTT (Reuters)
Pablo Guimón
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Os Estados Unidos enfrentarão “o inverno mais escuro da história moderna” se seus líderes não forem capazes de coordenar uma resposta nacional contra um esperado recrudescimento do coronavírus no final do ano. Essa é a advertência lançada em depoimento ao Congresso por Rick Bright, infectologista do Governo que foi afastado de seu cargo em 20 de abril, em plena pandemia. Bright apresentou na semana passada uma extensa queixa formal ao Departamento de Saúde, denunciando que a Administração federal ignorou suas advertências sobre a gravidade do coronavírus e que o motivo de seu rebaixamento a um cargo inferior foi sua resistência em avalizar o uso de fármacos experimentais contra a Covid-19, promovidos com entusiasmo pelo presidente Trump. Uma agência federal encarregada de processar as queixas concluiu que as alegações de Bright têm uma “base razoável”.

“Nossa janela de oportunidade está se fechando”, comentou Bright, em uma declaração que leu nesta quinta-feira ao Comitê de Energia e Comércio da Câmara de Representantes. “Se fracassarmos na hora de desenvolvermos uma resposta nacional coordenada, baseada na ciência, temo que a pandemia fique muito pior e se prolongue, causando fatalidades e doenças sem precedentes. É terrível reconhecer a magnitude do desafio que enfrentamos na atualidade, mas a verdade inegável é que haverá um ressurgimento da covid-19 neste outono [de setembro a dezembro] que, misturado em grande medida com os desafios da gripe sazonal, colocará uma pressão sem precedentes sobre o nosso sistema de saúde. Sem um planejamento claro e a implementação dos passos que eu e outros especialistas esboçamos, 2020 será o inverno mais escuro da história moderna.”

Os passados do plano esboçado por Bright incluem estabelecer uma estratégia nacional de exames de diagnóstico, reforçar a informação ao público sobre medidas cotidianas de prevenção e acelerar a produção de equipamento essencial. A prioridade, explicou o médico aos congressistas, é “ser sincero com os norte-americanos”. “Querem a verdade”, defendeu. “Podem suportar a verdade.”

“Continuamos sem um plano coordenado e centralizado”, disse Bright, respondendo a uma pergunta dos legisladores. E defendeu que “com uma liderança adequada, comandado pela melhor ciência, pode-se desenhar esse plano para guiar o caminho por esta pandemia”. “O tempo está acabando porque o vírus continua a se expandir”, advertiu.

O especialista alertou contra a esperança de que haja uma vacina disponível em menos de um ano e meio. “Há um turbilhão de otimismo em torno de um prazo de 12 a 18 meses, se tudo correr perfeitamente”, disse Bright aos congressistas. “Nunca vimos nada que corra perfeitamente. Minha preocupação é que se nos apressarmos demais, e cortarmos passos críticos, pode ser que não tenhamos uma avaliação correta da segurança da vacina.” Explicou, além disso, que os Estados Unidos carecem de um plano para produzir e distribuir adequadamente uma vacina quando ela estiver disponível. “Ainda não temos um plano, e isso é uma preocupação significativa”, afirmou.

Bright também se referiu à queixa que tramitou após ser afastado da direção da Autoridade de Pesquisa e Desenvolvimento Avançado Biomédico (BARDA), que ocupou durante quase quatro anos, e relegado a um posto menor dentro dos Institutos Nacionais de Saúde. Na queixa, afirma que se sentiu pressionado pelo Departamento de Saúde a “fazer que estivessem disponíveis de maneira generalizada fármacos potencialmente prejudiciais”, como a cloroquina e a hidroxicloroquina, medicamentos antimaláricos que mostraram resultados promissores, mas não concludentes, na luta contra a covid-19. Bright defendeu, perante os congressistas, que sua transferência foi uma resposta à sua insistência para que os recursos aprovados pelo Congresso para a BARDA se destinassem a “soluções seguras e cientificamente aprovadas, e não a drogas, vacinas e outras tecnologias que careçam de mérito científico”.

O depoimento de Bright completa uma semana de testemunhos relevantes no Capitólio. Na terça-feira, o médico Anthony Fauci, maior especialista do Governo em doenças infecciosas, e outras autoridades científicas alertaram contra a suspensão precipitada das medidas de limitação de movimentos, enquanto boa parte do país começa a reabrir, estimulado pelo próprio presidente. O coronavírus matou até agora mais de 83.000 pessoas nos EUA, mais de uma quarta parte dos óbitos causados pelo agente patogênico em todo o mundo.

“Está dolorosamente claro que não estávamos tão preparados como deveríamos estar”, disse Bright. “Ignoramos os primeiros sinais e esquecemos páginas importantes de nosso manual de pandemias.” Agora, acrescentou, é necessário escutar especialistas: “Falemos sem medo de represálias”.

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