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África do Sul se concentra em acelerar a vacinação diante da previsão de que casos tripliquem nesta semana

Autoridades tentam controlar o pânico, mas aproveitando a reação internacional para convencer seus cidadãos da necessidade de se imunizar, cogitando inclusive que as injeções sejam obrigatórias

Fila de vacinação contra a covid-19 em agosto, na periferia de Johanesburgo, na África do Sul.
Fila de vacinação contra a covid-19 em agosto, na periferia de Johanesburgo, na África do Sul.SIPHIWE SIBEKO (Reuters)

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Enquanto aumenta a lista de países que vetam a chegada de cidadãos do sul do continente africano, a África do Sul, onde foi descoberta uma nova variante da covid-19 batizada de ômicron, tenta manter a calma. As autoridades esperam aproveitar a reação da comunidade internacional –novamente descrita nesta segunda-feira como “injustificada” pelo ministro da Saúde, Joe Phaahla– para alertar seus cidadãos de que se vacinar é a única maneira de recuperar a atividade econômica com garantias. O Governo sul-africano pretendia imunizar 70% da população até o final do ano, mas ninguém mais espera que quatro semanas bastem para dobrar a atual cifra de vacinados (34,5%). O problema na África do Sul não é de acesso às vacinas, e sim um receio generalizado quanto a seus supostos efeitos adversos, apesar de todas as campanhas e dos esforços das autoridades para explicar que se trata de um medicamento perfeitamente seguro.

Com uma média de 3.000 novos contágios por dia –os casos positivos passaram na última semana de 2,3% para 9,8% dos exames realizados, segundo fontes oficiais–, o país, de 60 milhões de habitantes, mantém-se no nível de alerta mais baixo desde março de 2020. A estratégia de combate à quarta onda, esperada para o mês de dezembro, é que a responsabilidade seja individual, sem restrições oficiais. “Esperamos que os casos continuem subindo até alcançar 10.000 por dia no final desta semana. Também aumentará a pressão hospitalar nas próximas duas ou três semanas e, embora a ômicron não seja clinicamente pior [que outras variantes da covid-19], vamos sofrer a rapidez com que se transmite. Mas as medidas de saúde pública funcionam, e devemos utilizá-las: máscara, distanciamento social, ventilação. O grande desafio será evitar os encontros onde o contágio aumenta. É preciso reduzir o risco de transmissão em ambientes fechados”, diz Salim Abdool Karim, epidemiologista e membro do Grupo de Trabalho da África para o Coronavírus, um organismo continental criado pela União Africana. Karim, que esteve à frente da comissão especial criada pelo Governo sul-africano para administrar a covid-19 durante o primeiro ano de pandemia, considera que as vacinas deveriam ser obrigatórias há muito tempo: “Devemos usar nossas vacinas de forma mais efetiva. Tenho a impressão de que, simplesmente, fomos muito lentos na insistência para que certos grupos, como os profissionais da saúde, estivessem vacinados”.

O presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, em pronunciamento. No vídeo, legendas em espanhol.

O presidente Cyril Ramaphosa fez um pronunciamento à nação no domingo à noite para avaliar a situação pandêmica do país depois da aparição da variante ômicron, fazendo um apelo para que se adote a principal arma existente hoje contra o vírus: as vacinas. Nessa mesma linha, cientistas, políticos e forças sociais advertem que esta semana será decisiva para que a África do Sul não retroceda e tenha que recorrer a restrições mais severas. Também alertam sobre as discussões oficiais onde se cogita seriamente que a vacina seja obrigatória para entrar em lugares públicos ou para realizar certas atividades sociais. “Vacinar-se é um ato de solidariedade com os médicos e enfermeiros, para proteger as pessoas idosas que, mesmo vacinadas, continuam em risco [...]. A sociedade teve tempo suficiente para se vacinar, houve um número elevado de campanhas de informação… É hora de agir, será preciso fazê-lo”, disse Matthew Parks, porta-voz da central sindical Cosatu, à imprensa local. Nicholas Crisp, diretor-geral interino do Departamento de Saúde, lançou mão de uma comparação para destacar a importância do atual momento: “Na África do Sul temos uma situação em que não se pode fumar em qualquer lugar, mas quando eu era jovem se fumava no cinema, nos aviões, no médico, nas lojas… Agora, há um regulamento sanitário que indica que não se pode fumar em certos lugares e, mesmo que você seja fumante, você aceita. As pessoas devem entender que, no contexto atual, se o grupo de trabalho do coronavírus recomenda que você não entre em certos lugares se não estiver vacinado, você terá que ficar em casa e deixar de fazer algumas coisas”.

O debate sobre a obrigação de se vacinar, uma medida que ainda não se adotou oficialmente, surgiu com força na sociedade sul-africana. As referências à Constituição, que não contempla este tipo de ingerência sobre as decisões individuais, e ao passaporte covid, que ainda não havia sido um tema de discussão destacada no país austral, dominam a polêmica.

“A descoberta em Botsuana e um dia depois na África do Sul da nova variante é um feito científico, fruto do investimento do nosso país na ciência. A África do Sul e o resto do mundo devem agora transformar esse sucesso em uma resposta bem-sucedida. A última coisa que precisamos é entrar em pânico e exagerar nas ações. O fechamento de fronteiras não proporciona nenhum benefício, isolar o sul da África não é a solução”, afirma Karim. O epidemiologista também recorda que, quase dois anos depois de iniciada a pandemia da covid-19, os especialistas já sabem perfeitamente “como reduzir o risco quando se viaja: vacinar-se, comprovar o estado de saúde ao entrar no avião, [um exame] PCR negativo, máscara e um teste de covid ao chegar ao destino”.

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