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Sebastián Piñera manda militares para a “zona vermelha” do conflito mapuche

Presidente do Chile anuncia estado de exceção em Araucanía e Biobío devido à “grave alteração da ordem pública”

Rocío Montes
Sebastián Piñera conflicto mapuche
Sebastián Piñera (centro) anuncia o estado de exceção nas regiões de Araucanía e Biobío, nesta terça-feira, no palácio de La Moneda.Esteban Felix (AP)

É um dos principais problemas de fundo para o Chile atual: o conflito da Araucanía, marcado há décadas pela luta do povo mapuche por suas terras ancestrais, mas que nos últimos anos se tornou mais violento, em parte pela aparição de outros fenômenos, como o roubo de madeira das florestas. O presidente Sebastián Piñera declarou nesta terça-feira o estado de exceção constitucional em partes das regiões de Araucanía e Biobío “para enfrentar com melhores instrumentos o terrorismo, o narcotráfico e o crime organizado que se enraizou nesses territórios”, conforme declarou para justificar a decisão.

“Em nenhum caso se orienta contra um povo ou grupo de cidadãos”, prometeu o presidente, referindo-se a uma “grave alteração da ordem pública”. A medida é adotada dias depois do final, em 1º de outubro, do estado de exceção Constitucional por catástrofe que vigorou devido à pandemia em todo o território nacional desde março de 2020.

As zonas que terão presença militar são as províncias do Biobío e Arauco, na região de Biobío, e as províncias de Malleco e Cautín, na região de La Araucanía. Piñera alertou que a inquietação nessa região “cobraram vidas de pessoas inocentes e de membros dos Carabineiros e da Polícia de Investigações”. O presidente citou também atentados e ameaças a promotores, juízes e outras autoridades. “Estes fatos violentos também destruíram e queimaram casas, igrejas, instalações e bens destinados a atividades industriais, agrícolas, comerciais e turísticas e infraestrutura pública”, descreveu Piñera, cujo segundo mandato termina em março de 2022. Ele acrescentou que os atentados impediram a execução de ordens judiciais por parte de policiais, que “enfrentaram resistência mediante o uso da violência e do uso de armas de fogo de grosso calibre, inclusive armas de guerra”, como aconteceu nos últimos meses.

A última vítima foi um homem de 49 anos que teve sua casa intencionalmente queimada. Morreu em 3 de outubro, após passar 14 dias internado com 40% do corpo queimado. “Não queremos ter mais mortos, não queremos mais gente ferida. Não queremos que o Estado continue dando sinais ambíguos”, lamentou há poucos dias o coordenador nacional da Macrozona Sul, Pablo Urquízar. “Não bastam policiais, o Ministério Público, o Governo. É necessária uma perspectiva e uma colaboração de todos os poderes do Estado”, afirmou esse representante regional do Governo, que tem como missão a coordenação para enfrentar a escalada de violência.

O estado de exceção constitucional de emergência permite a designação de chefes da Defesa Nacional e terá uma duração de 15 dias, prorrogáveis por mais 15, conforme estabelecem a Constituição e a lei ordinária. As Forças Armadas deverão colaborar, mas sem substituir às forças policiais regulares, “por isso não poderão participar de forma autônoma e direta em operações de natureza policial”, afirmou Piñera.

A presidenta da assembleia constituinte que funciona atualmente no Chile, a acadêmica mapuche Elisa Loncon, considerou “preocupante” a adoção do estado de emergência. “O que a cidadania daqui precisa é de soluções políticas, soluções em função da cultura, soluções em torno de levar adiante processos econômicos que permitam superar a pobreza que afeta às comunidades”, disse Loncon, criticando também que a medida tenha sido anunciada em 12 de outubro, data na qual o povo mapuche comemora o Dia da Resistência Indígena. “É o dia que não podemos comemorar, porque foi quando o genocídio começou”, criticou a líder do órgão que redige a nova Constituição chilena.

O site Werkén Notícias, que divulga declarações da Coordenadoria Arauco Malleco (organização político-militar mapuche, de caráter indigenista e nacionalista étnico, que nasceu a fins da década de 1990), anunciou nesta terça-feira que os “grupos de combate mapuche dos Meli Wixan Mapu [cosmovisão mapuche] se preparam para enfrentar o estado de emergência decretado pelo Governo”.

No início da atual Administração, Piñera levou adiante um profundo plano na Araucanía, a cargo de seu atual ministro das Obras Públicas, Alfredo Moreno. Mas o homicídio do jovem mapuche Camilo Catrillanca, vitimado por um disparo policial em 18 de novembro de 2018, na comunidade mapuche de Temucuicui, interrompeu o diálogo entre o Governo e os representantes locais.

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