Ministros ligados a Cristina Kirchner pedem demissão na Argentina
Decisão eleva tensão dentro do Governo peronista e condiciona os ministros apadrinhados pelo presidente Alberto Fernández
A crise política passa fatura na Argentina. Cinco ministros e outros dois altos funcionários que respondem à vice-presidenta Cristina Kirchner apresentaram nesta quarta-feira seus pedidos de demissão ao presidente Alberto Fernández. A manobra revela as tensões dentro da coalizão peronista logo depois da derrota eleitoral nas primárias de domingo. A renúncia dos ministros kirchneristas deixa o presidente e os demais membros do Gabinete em alerta. Fernández será obrigado agora a rejeitar o pedido e ceder às pressões do kirchnerismo, ou, se deixá-los sair, vai precisar montar um novo Gabinete sem a principal força política do seu Governo. A fratura, até então apenas à espreita, agora se torna evidente.
A derrota eleitoral da coalizão ‘Frente de Todos’ nas eleições primárias do domingo foi épica. Os pré-candidatos do peronismo ao Congresso perderam em 18 dos 24 distritos do país, inclusive na província de Buenos Aires, a mais importante do país e um conhecido reduto do kirchnerismo. Fernández disse que havia “cometido erros” e prometeu corrigir a rota. O kirchnerismo, então, iniciou um jogo de pressões para derrubar o chefe do Gabinete de ministros, Santiago Cafiero, e o titular da Economia, Martín Guzmán, a quem atribuem os problemas econômicos que acabaram por afugentar o eleitorado. Fernández não cedeu à pressão e apoiou seus homens em diversos atos públicos. O kirchnerismo não esperou muito mais —e decidiu chutar o balde.
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Clique aquiO ministro de Interior, Eduardo ‘Wado’ de Pedro, os olhos de Cristina Kirchner dentro gabinete, apresentou seu pedido de demissão ao presidente com uma carta muito breve. “Ouvindo suas palavras do domingo à noite, onde apresentou a necessidade de interpretar o veredicto expresso pelo povo argentino, considerei que a melhor maneira de colaborar com essa tarefa é pondo minha renúncia ao seu dispor”, escreveu. Minutos depois, o seguiram os ministros de Justiça, Martín Soria, de Desenvolvimento Territorial, Jorge Ferraresi, da Ciência, Roberto Salvarezza, do Meio Ambiente, Juan Cabandíe, e da Cultura, Tristán Bauer. Também se somaram as diretoras do serviço de saúde dos aposentados (PAMI), Luana Volnovich, e da Previdência Social (ANSES), Fernanda Raverta. O PAMI e o ANSES são dois órgãos cruciais dentro do Governo: têm o maior orçamento da administração pública e escritórios em cada cidade e povoado do país.
O presidente precisa decidir agora se aceita a saída dos ministros kirchneristas, enfraquecendo, assim, sua posição dentro de uma coalizão integrada também pelos setores que respondem a Sergio Massa, presidente da Câmara de Deputados. Horas antes das renúncias, Fernández tinha compartilhado um ato oficial com o ministro da Economia, Martín Guzmán, que é hoje um funcionário na mira da crise. O kirchnerismo considera que ele não soube administrar a crise herdada do macrismo e o culpam de, em nome do equilíbrio fiscal, frear planos de ajuda social. Uma leitura rápida da derrota eleitoral do domingo mostra que muitos eleitores que em 2019 optaram pela ‘Frente de Todos’ desta vez apoiaram o ‘Juntos pela Mudança’, a coalizão do ex-presidente Mauricio Macri, porque não se sentiram acompanhados pelo Governo durante a pandemia. Em poucas palavras: faltou dinheiro no bolso.
A crise econômica é visível nas ruas. A inflação ronda os 50% por ano, ao passo que o desemprego cresceu. O fechamento de comércios e indústrias durante a pandemia mudou o humor social. O Governo tentou reverter a situação com ajudas aos salários e às empresas durante 2020, mas a falta de crédito externo e a necessidade de fechar um acordo com o FMI levaram Guzmán a limitar os planos sociais durante 2021. Resta, agora, saber o que fará o presidente Fernández diante da jogada do kirchnerismo. Cristina Kirchner moveu suas peças e exibiu seu poder como pilar maior da governabilidade. A Argentina agora soma uma crise política à econômica.
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