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Instabilidade política no Haiti preocupa os EUA, que temem nova onda migratória

Estados Unidos, Colômbia e República Dominicana se mobilizam para esclarecer o assassinato do presidente Jovenel Moïse diante do temor de uma explosão violenta que respingue sobre toda a América

Cidadãos haitianos mostram seus passaportes para pedir asilo em frente à embaixada dos Estados Unidos em Tabarre, neste sábado.
Cidadãos haitianos mostram seus passaportes para pedir asilo em frente à embaixada dos Estados Unidos em Tabarre, neste sábado.VALERIE BAERISWYL (AFP)
Jacobo García
Porto Príncipe (Haiti) -
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Suspects in the assassination of President Jovenel Moise, who was shot dead early Wednesday at his home, are shown to the media in Port-au-Prince, Haiti July 8, 2021. REUTERS/Estailove St-Val NO RESALES. NO ARCHIVES     TPX IMAGES OF THE DAY
A rota dos ex-militares colombianos no assassinato do presidente do Haiti
ACTUALIZA INFORMACIÓN ** AME1213. PUERTO PRÍNCIPE (HAITÍ), 08/07/2021.- Policías custodian hoy a un grupo de sospechosos de haber participado en el asesinato del presidente haitiano, Jovenel Moise, en Puerto Príncipe (Haití). Haití arreció este jueves la operación policial para capturar a los autores del asesinato del presidente Jovenel Moise y anunció la detención de 17 de los 28 supuestos implicados, en su mayoría colombianos. Quince colombianos y dos estadounidenses de origen haitiano están bajo la custodia de la Policía, mientras que otros tres ciudadanos colombianos fueron abatidos en tiroteos con las fuerzas de seguridad, según el primer balance oficial en el que se revela la nacionalidad de los supuestos "mercenarios". EFE/ Jean Marc Hervé Abélard
Haiti prende 15 colombianos e 2 norte-americanos pelo assassinato do presidente Jovenel Moïse
Secretary General of Haiti's presidency Lionel Valbrun gestures after leaving the residential area where Haiti's President Jovenel Moise was shot dead at his private home by gunmen with assault rifles, in Port-au-Prince, Haiti July 7, 2021. REUTERS/Estailove St-Val NO RESALES. NO ARCHIVES
Vazio de poder mergulha Haiti na incerteza em meio a crise sem precedentes

Tão arraigada no coração dos haitianos quanto a estátua do Le Marron Inconnu erguida no centro de Porto Príncipe como um símbolo da luta contra a escravidão, a palavra crise se instalou como a única forma de governo no país caribenho. Ao vácuo de poder existente —até três líderes se proclamaram chefes de Estado depois do assassinato do presidente Jovenel Moïse— se junta a fome que atinge com dureza o Haiti, imerso na “pior crise humanitária dos últimos anos”, segundo o Unicef.

A onda expansiva do assassinato atinge toda a região e afeta diretamente os Estados Unidos, que temem uma crise migratória —na sexta-feira, centenas de pessoas se aglomeravam em frente à embaixada em busca de um visto—, a Colômbia, de onde saiu a maioria dos suspeitos presos, e a República Dominicana, que acompanha com preocupação os acontecimentos no país vizinho, com o qual compartilha fronteira e uma tensa relação desde a criação das duas nações e a divisão da ilha La Española, em 1821.

Cientes de como terminam as crises no país mais pobre da América e diante do temor de que um levante violento varra tudo, o Haiti pediu aos EUA e à ONU o envio de tropas para proteger portos, aeroportos e outros pontos estratégicos. “Pensamos que os mercenários poderiam destruir a infraestrutura para criar caos no país”, disse na sexta-feira o ministro das Eleições, Mathias Pierre.

O Departamento de Estado norte-americano e o Pentágono confirmaram o pedido de ajuda haitiano, embora sem detalhar se haverá mobilização de tropas militares, uma ameaça sempre latente que justifica a rejeição da população à presença estrangeira e a missões internacionais, como a dos capacetes azuis da ONU. Esta última, que levou o Exército brasileiro ao país, resultou em escândalos de abusos sexuais e da propagação do cólera entre 2004 e 2017. Um ódio patente nas paredes da sede da missão já cancelada da ONU, apedrejadas até o cansaço pela população.

Enquanto isso, a investigação do assassinato do presidente abre um leque de possibilidades. De um plano orquestrado pela equipe de segurança de Moïse à conspiração de um grupo de oligarcas afastados de alguns dos negócios mais suculentos. Parte da escolta de Moïse está sob investigação e o Ministério Público chamou os magnatas Réginald Boulos e Dimitri Vorbe para depor na segunda-feira. Boulos é dono de um conglomerado de empresas e a família Vorbe é dona do monopólio de eletricidade que Moïse havia começado a romper com a entrada de concorrentes. Ambos foram apontados pelo mandatário em uma entrevista ao EL PAÍS, meses antes de morrer.

Ao desconcerto por conta do ocorrido somam-se as dúvidas sobre o futuro político do país. Um dos últimos decretos assinados por Moïse foi nomear o oposicionista Ariel Henry como figura de aproximação para recompor as relações antes das eleições presidenciais e legislativas de setembro. O novo primeiro-ministro tinha sido nomeado, mas não chegou a ser empossado, e o primeiro-ministro cessante, Claude Joseph, apoiado pelos EUA, insiste que não deixará o poder, o que provocou tensão. E se havia alguma dúvida de que tudo pode piorar no Haiti, na noite de sexta-feira um grupo de senadores da oposição acusou Joseph de “instigar um golpe” e pediu a um terceiro, o presidente do Senado, Joseph Lambert, que assumisse a chefia do Estado. A Corte Suprema, que teria de decidir sobre essa controvérsia, foi dissolvida e seu presidente morreu no mês passado de covid-19.

Enquanto isso acontece nas alturas, policiais e militares colombianos e norte-americanos anunciaram sua chegada ao país para ajudar a esclarecer o magnicídio, embora o que continua sem chegar são as vacinas. O Haiti é um dos poucos países do mundo que não recebeu uma única dose de vacina contra a covid-19, enquanto a população combate a pandemia com paracetamol e vodu. Meio a sério, meio brincando, o sacerdote católico Gilles Dauroc costumava dizer que, na ausência de dados estatísticos confiáveis, “no Haiti se considera que há 80% de católicos, 40% de protestantes e 90% de praticantes de vodu”.

A verdade é que a pandemia castigou ainda mais a empobrecida economia do Haiti, que depende em 75% da cooperação internacional e que a ONU situa no 170º lugar entre 187 países no índice de desenvolvimento humano. Dada essa precariedade, a instabilidade política, endêmica no Haiti desde a queda da ditadura, com 20 governos em 35 anos e com seis primeiros-ministros apenas no mandato do presidente assassinado, torna-se uma bomba-relógio para a região. O terremoto de 12 de janeiro de 2010 não só ocasionou mais de 300.000 mortos e um milhão meio de desabrigados, mas destruiu um Estado erguido com bases pouco sólidas depois da ditadura de Papa Doc e Baby Doc Duvalier, consolidada à base de terror e facões por seus temidos tonton macoutes.

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