“Na África está só começando”
Pandemia demorou mais para chegar ao continente, mas as previsões indicam que o vírus também levará mais tempo até ir embora
A África continua sendo um dos continentes menos afetados pela covid-19, com 300.000 casos declarados – que representam 3% do total mundial, sendo que tem 17% da população do planeta – e 7.500 mortos (1,6% da cifra global). Entretanto, todos os alertas estão acesos pela crescente aceleração dos contágios no último mês. A pandemia chegou mais tarde, tanto pela menor conectividade africana com o exterior como pela rapidez dos fechamentos de fronteiras, mas a batalha será longa e está longe de estar ganha. Na opinião do médico Richard Mihigo, diretor de Vacinação da Organização Mundial da Saúde (OMS) no continente, “isto está só começando”.
Mesmo deixando as cifras oficiais em quarentena pela escassa capacidade de diagnóstico em alguns países – “um problema que não devemos mascarar”, nas palavras de John Nkengasong, diretor dos Centros de Controle e a Prevenção de Doenças na África –, a experiência na gestão de outras epidemias, como a tuberculose, o sarampo e o ebola, o intenso envolvimento comunitário em questões de saúde pública e a juventude de sua população permitiram até agora evitar o colapso. Entretanto, as perspectivas não são boas. O continente tem os sistemas sanitários mais fracos do mundo, faltam respiradores, leitos de UTI e pessoal, por isso a OMS estima que haverá 190.000 mortos africanos por covid-19 nos próximos 12 meses.
Além da crise sanitária, o pior golpe foi econômico. As populações, sobretudo nas grandes cidades, como Johanesburgo e Lagos, viram-se submetidas a duros confinamentos, a toques de recolher e à impossibilidade de se deslocarem com normalidade. Em um continente onde duas em cada três pessoas vivem com dinheiro contado, tendo o comércio informal como fonte de sustento, a interrupção das rotas comerciais internas foi um suplício insuportável.
Além disso, a queda dos preços de matérias-primas como petróleo e gás, das quais tanto dependem os Estados, prenuncia um futuro incerto de ascensão do desemprego e da inflação, à qual o Banco Mundial já pôs cifras: quedas de 2 a 5% no PIB para 2020. Pela primeira vez em um quarto de século, a África subsaariana enfrenta uma recessão. Para tratar de amortecer o estrondo, as fronteiras serão gradualmente reabertas nas próximas semanas, inclusive em plena aceleração da pandemia. Os movimentos forçosos de população se intensificarão. Assim como demorou mais a chegar, as previsões apontam que o vírus também levará mais tempo para ir embora.
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