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Um de cada três países da América Latina e Caribe está em situação de “vulnerabilidade financeira”

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) alerta que a fragilidade das finanças públicas freará o desenvolvimento regional

Ignacio Fariza
Tres personas se protegen del virus con mascarillas
Três pessoas se protegem do vírus com máscaras, em julho passado, em Quito (Equador).Dolores Ochoa (AP)
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(FILES) In this file photo taken on August 28, 2020 a man cooks outside a tent set up in land occupied by homeless people outside Guernica, in the province of Buenos Aires, south of the Argentine capital, amid rising poverty in an economic crisis exacerbated by the COVID-19 novel coronavirus pandemic. - Argentinian economy contracted 10,0% in 2020 regarding 2019 due to the COVID-19 pandemic, according to the first official estimation released on February 24, 2021. (Photo by Ronaldo SCHEMIDT / AFP)
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A woman passes by a wall with a legend reading "No to the Debt Payment" in Buenos Aires, on August 3, 2020 amid the COVID-19 novel coronavirus pandemic. - August 4 marks deadline for concluding debt negotiations with bondholders. On late July, the Exchange Bondholders, Ad Hoc and Argentina Creditor Committee groups rejected the South American country's latest proposal and submitted a counteroffer of their own, which was subsequently dismissed by Argentina President Alberto Fernandez. (Photo by Juan MABROMATA / AFP)
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A hecatombe financeira que se entrevia há exatamente um ano, no começo da crise do coronavírus, não se concretizou. Mas os riscos econômicos enfrentados pelos países de baixa e média renda, muitos deles na América Latina e Caribe, continuam sendo muito elevados. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) alertou nesta quinta-feira que uma em cada três nações da região está em situação de “vulnerabilidade financeira”, segundo um indicador construído com base nos níveis de endividamento, liquidez e solvência. Os demais países incluídos sob essa rubrica são, na sua maioria, africanos.

Dos 40 países que compõem a América Latina e o Caribe, 14 estão vulneráveis, segundo a análise pormenorizada dos técnicos da maior agência de desenvolvimento do mundo. E cinco deles estão englobados na categoria de maior risco, com as finanças públicas em situação de “vulnerabilidade severa”: Venezuela, Argentina, Equador, Belize e Granada. O primeiro deles está imerso em uma crise econômica, social e política de longa data e com consequências devastadoras para sua população; e Argentina, Equador e Belize estiveram em 2020 entre os únicos cinco países do mundo a incorrerem num default da sua dívida. O restante ―Bolívia, Costa Rica, El Salvador, Honduras, Nicarágua, San Vicente e Granadinas, Dominica e Haiti― estão enquadrados no grupo de países com dívida “altamente especulativa”.

O problema é duplo: não só que suas finanças públicas estejam comprometidas em níveis inimagináveis aos olhos do mundo rico; paradoxalmente, os países de renda média ―a maioria dos quais aparecem na categoria de “vulnerabilidade severo”― não estão cobertos pelos mecanismos de alívio da dívida adotados nos últimos meses. Estes são focados nos mais pobres, que podem se beneficiar de medidas como uma moratória da dívida oferecida pelo G20 ou os tímidos esforços de ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI). Essa disparidade deixa muitas nações em um limbo: suas necessidades financeiras são urgentes, ainda mais em plena pandemia, mas elas quase não contam com ajuda para sair das dificuldades e garantir um futuro melhor para sua população.

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No caso da América Latina e do Caribe, os países que podem se beneficiar destes esquemas de alívio desenhados pela comunidade internacional são cinco, todos eles centro-americanos ou caribenhos ―Nicarágua, San Vicente e Granadinas, Honduras, Dominica e Haiti―, enquanto que os nove restantes, entre eles os de maior tamanho do grupo, não têm acesso aos mecanismos criados pela comunidade internacional para aliviar sua situação ―Argentina, Venezuela, Equador, Bolívia, Costa Rica, El Salvador, Jamaica, Belize e Granada.

“As iniciativas adotadas até agora [para socorrer os países com problemas] são importantes. Mas, dado o tamanho do desafio, não são suficientes: é preciso fazer mais, é preciso ter mais ambição. São medidas que devem ser promovidas de maneira urgente e coletiva”, salientou o administrador do PNUD, Achim Steiner, em um encontro com meios de comunicação. “O risco não é tanto uma cascata de moratórias, que também existe, mas sim que a falta de margem fiscal nestes países impeça a recuperação deles depois da crise”. No seu entendimento, um descolamento entre as economias avançadas e aquelas em vias de desenvolvimento é, a esta altura, algo mais que um risco: as primeiras “vão no caminho de uma recuperação em V”, enquanto as outras estão imersas em “um revés histórico para seus níveis de desenvolvimento”.

Segundo os cálculos do organismo com sede em Nova York, o serviço da dívida dos países em apuros somará 1,1 trilhão de dólares neste ano, uma cifra que seria suficiente para vacinar até dois bilhões de pessoas no mundo emergente sob a iniciativa Covax.

“Mais que aos países, nosso chamado é ao sistema multilateral”, salienta, em conversa com o EL PAÍS, o economista chefe do PNUD, George Gray, ressaltando que “vários países em desenvolvimento estão imersos em uma crise de dívida de combustão lenta”. No caso concreto da América Latina, Gray vê dois grupos bem diferenciados: o de nações muito dependentes da venda de matérias-primas, em sua maioria na América do Sul; e aqueles afligidos por problemas “estruturais, começando por algumas do Caribe que têm um alto nível de endividamento, que dependem do turismo e que precisam importar petróleo e mantimentos”. “A crise da covid-19 se soma a um lento processo de acumulação de passivos que está prejudicando a agenda da região”, diz. “Um país financeiramente vulnerável é aquele onde a dívida estrangula a possibilidade de obter o desenvolvimento”, conclui.

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