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América Latina viverá a recessão “mais abrupta da história”, alerta Cepal

Comissão da ONU alerta que não haverá reativação da economia sem controle do coronavírus e propõe renda básica emergencial como uma das soluções para construir um Estado de bem-estar na região

Federico Rivas Molina
Vendedores de alimentos numa rua de Quito (Equador), em 21 de julho.
Vendedores de alimentos numa rua de Quito (Equador), em 21 de julho.José Jácome (EFE)

A reativação econômica da América Latina terá que esperar. Um novo relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) adverte que, se a curva de contágios da covid-19 não for achatada o quanto antes, as consequências serão devastadoras. A região registra 4,5 milhões de casos positivos da doença e quase 190.000 mortes, além de problemas como a taxa de informalidade trabalhista superior a 50%, desemprego, pobreza, desigualdade e sistemas de saúde frágeis. Em um cenário semelhante, qualquer hipótese de recuperação é especulativa. “No plano social e econômico, a pandemia desatou uma inédita crise econômica e social e, se não forem tomadas medidas urgentes, poderia se transformar em uma crise alimentar e humanitária”, adverte o documento, apresentado pela comissão nesta quinta-feira na sua sede, em Santiago, através de videoconferência.

O panorama econômico descrito pela Cepal e pela OPAS para a América Latina é desolador. A recessão provocada pela pandemia “é a mais abrupta da história”, com uma queda média superior a 9% nos PIBs nacionais em 2020. Os demais indicadores acompanharão o desmoronamento: o desemprego chegará a 13,5%, a pobreza subirá sete pontos, indo a 37,3%, e a desigualdade se agravará ainda mais, com uma alta de 4,9 pontos no índice de Gini. “Os altos graus de desigualdade acompanhados de elevados níveis pobreza, informalidade, desproteção social e limitado acesso à saúde oportuna e de qualidade explicam os altos custos sociais que a pandemia está tendo na região”, diz o relatório.

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As fragilidades estruturais golpeiam com mais força os mais pobres, que não podem destinar recursos próprios a custear gastos extraordinários em saúde, ao mesmo tempo em que sua renda se ressente da paralisia econômica. A Cepal calcula que 95 milhões de pessoas devem pagar gastos de saúde do seu próprio bolso, e que pelo menos 12 milhões ficarão ainda mais pobres devido a estes desembolsos. A urgência deve deixar claras as prioridades. A secretária-executiva da Cepal, Alicia Bárcena, adverte que “não há dilema entre saúde ou economia, porque o primeiro é a saúde”.

A pandemia expôs a fragilidade dos sistemas públicos de saúde, resultado de anos de baixo investimento: 4% do PIB, contra 6% recomendados pela OMS. “A covid-19 evidenciou fragilidades dos sistemas de saúde da América Latina. São sistemas de saúde segmentados e fragmentados”, diz Bárcena. A situação é tão grave que a diretora da OPAS, Carissa Etienne, diz que a região pode “perder em alguns meses vários anos de avanços no âmbito da saúde”. “Enfrentamos um desafio sem precedentes. É necessário criar condições econômicas e sanitárias para que não deixemos ninguém para trás”, diz.

A Cepal ensaia modelos de solução, baseados no apoio público aos setores mais vulneráveis. “Precisamos mudar nosso modelo de desenvolvimento, nosso paradigma, torná-lo mais sustentável e habitável”, diz Bárcena. “O grande desafio”, acrescenta, “é que haja um novo pacto para construir um Estado de bem-estar com políticas sociais de ampla cobertura. Por exemplo, as mulheres que estão a cargo dos cuidados deveriam receber uma renda básica, porque o que estão fazendo é um serviço à sociedade”. Entre as políticas de Estado necessárias para rebater os efeitos dela crise, a Cepal propõe uma renda básica emergencial, um bônus contra a fome e planos de proteção do setor produtivo, além da consolidação de sistemas universais de proteção social e a adoção de políticas fiscais progressivas.

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