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Queda de braço de Bolsonaro com cientistas inclui até devolução de medalhas de mérito

21 pessoas que seriam condecoradas com a Ordem Nacional do Mérito Científico recusaram a indicação após presidente retirar a honraria de dois cientistas críticos ao Governo

Bolsonaro com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao fundo.
Bolsonaro com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao fundo.EVARISTO SA (AFP)
Diogo Magri

Menos de 48 horas depois de assiná-la, o presidente Jair Bolsonaro retirou a condecoração da Ordem Nacional do Mérito Científico de dois cientistas brasileiros opositores do atual Governo federal. Os profissionais da ciência Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinicius Guimarães de Lacerda foram agraciados com a honra em publicação no Diário Oficial da União assinada pelo presidente no dia 3 de novembro, mas a condecoração foi desfeita pelo próprio Bolsonaro no dia 5 de novembro. Outros 21 cientistas, que também seriam condecorados, recusaram a indicação e classificaram a atitude como “clara demonstração de perseguição a cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à ciência e tecnologia por parte do Governo vigente”.

A condecoração, publicada em 3 de novembro, chamou a atenção por incluir profissionais opositores às políticas ambientais e sanitárias do Governo federal. Isso porque a lista de nomes é definida por uma comissão técnica formada por personalidade indicadas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, pela Academia Brasileira de Ciências e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Tanto Adele Schwartz Benzaken quanto Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda criticaram, ao longo dos últimos anos, o descaso da gestão de Bolsonaro com a ciência.

Lacerda é pesquisador da Fiocruz Amazônia, infectologista da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado e um dos primeiros brasileiros a estudarem a cloroquina como medicamento de combate à covid-19. O médico suspendeu o estudo com o remédio defendido por Bolsonaro ao perceber que o seu uso aumentava o risco cardíaco dos pacientes, se tornando a partir de então um crítico ao tratamento com a cloroquina.

Já Benzaken é diretora da Fiocruz Amazônica, ginecologista e era diretora de DSTs e Aids do Ministério da Saúde até o início do Governo Bolsonaro. Enquanto estava na pasta, a médica sanitarista autorizou a produção de uma cartilha dirigida a homens trans. Ela acabou demitida em janeiro de 2019, no primeiro mês da atual gestão. Na época, o então ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta justificou a demissão ao dizer que “o Governo precisava voltar a estimular a prevenção do HIV, mas sem ofender as famílias”.

O recuo do Governo dois dias após a homenagem causou a insatisfação de outros 21 cientistas que também seriam condecorados. O grupo assinou uma carta na qual recusa a indicação e afirma que “tal exclusão, inaceitável sob todos os aspectos, torna-se ainda mais condenável por ter ocorrido em menos de 48 horas após a publicação inicial”. “Enquanto cientistas, não compactuamos com a forma pela qual o negacionismo em geral, as perseguições a colegas cientistas e os recentes cortes nos Orçamentos federais para a ciência e tecnologia têm sido utilizados como ferramentas para fazer retroceder os importantes progressos alcançados pela comunidade científica brasileira nas últimas décadas”, continua o texto. Ele ainda diz que os cientistas se consideram “extremamente honrados” com a presença de seus nomes em uma lista cujo mérito científico é o único parâmetro considerado para a inclusão. “Entretanto, a homenagem oferecida por um Governo que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas”, conclui.

Em outra nota, a Coalizão Ciência e Sociedade disse que “atitudes como essa demonstram a politização de um reconhecimento que deveria prezar o mérito científico e também a baixa prioridade dedicada pelo Governo federal à área da ciência, tecnologia e inovação, já impactada pelos dramáticos cortes orçamentários que atingem nossas universidades e institutos de pesquisa”.

No dia 4 de novembro, Bolsonaro concedeu a si mesmo o mais alto título da Ordem Nacional do Mérito Científico, o de grão-mestre, uma honraria que existe para os presidentes do Brasil desde o Governo de Itamar Franco.

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