Salles, sob o cerco da PF, amplia mal-estar com Mourão e falta a encontro oficial para debater Amazônia
Vice, que dirige instância amazônica agora esvaziada pelo Planalto, critica ministro do Meio Ambiente investigado por suposto envolvimento em caso de contrabando de madeira
Há 35 dias o Governo Jair Bolsonaro fez uma ambiciosa promessa na Cúpula de Líderes sobre o Clima promovida pelo presidente norte-americano Joe Biden: até 2030 eliminaria o desmatamento ilegal no Brasil e reduziria as emissões de gás carbônico em 43%. Na ocasião do anúncio, do lado direito do presidente brasileiro estava Ricardo Salles, seu fiel ministro do Meio Ambiente que resiste à pressão para ser demitido. De lá pra cá, o país se deparou com alta do desmatamento na região amazônica, não conseguiu demonstrar união interna para atingir os objetivos prometidos e Salles se tornou alvo de uma operação policial que se baseou em informações repassadas justamente pela Gestão Biden.
Nesta quarta-feira, o ministro Salles voltou ao foco, quando não compareceu à reunião geral do Conselho Nacional da Amazônia Legal e nem enviou representantes. Foi criticado pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que coordena o grupo. “Lamento profundamente a ausência do ministério mais importante, que não compareceu à reunião hoje nem mandou representante, o Ministério do Meio Ambiente”, disse Mourão. Mais tarde, ainda afirmou que se sentiu desrespeitado. “Da forma como eu fui formado eu considero isso falta de educação.”
O simbolismo do momento chamou a atenção, havia dois púlpitos para autoridades se manifestarem. Em um, estava o vice-presidente. O outro, vazio, deveria ser ocupado por Salles. Esta foi a segunda reunião do grupo, que tem como objetivo traçar planos para a Amazônia, de que Salles se ausentou. Questionado pela reportagem, o ministério não justificou a ausência do ministro no encontro.
O bode na sala do vice-presidente ficou mais evidente quando foi instado por repórteres a comentar a operação contra madeireiros ilegais da qual Salles foi alvo no último dia 19. “Eu aguardo a investigação. Toda investigação começa com indícios que podem se comprovar ou não. Então, ninguém pode condenar o ministro a priori”, afirmou. “Ou seja, que siga o devido processo legal, até lá qualquer ilação é isso, mera ilação.”
O Conselho Nacional da Amazônia Legal tem sido esvaziado nos últimos meses por razões políticas. O presidente Jair Bolsonaro e seu vice têm se distanciado cada vez mais. E os acenos feitos por Bolsonaro são no sentido de apoiar Salles, ainda que boa parte dos interlocutores internacionais já tenham pedido sua demissão. Dois sinais de que esse apoio externo está em franca decadência vieram exatamente dos EUA. Na cúpula ambiental, Biden se retirou da sala de conferência pouco antes do discurso de Bolsonaro. Talvez já soubesse que poucas semanas depois, seu Governo iria subsidiar a investigação contra Salles, o presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente, Eduardo Bim, e outros dez servidores da área.
Com exceção de Salles, os demais suspeitos foram afastados de seus cargos. Relatórios fiscais em poder dos investigadores mostram que um escritório de advocacia do ministro teria registrado movimentações extremamente atípicas entre os anos de 2012 e 2020. Por essa razão, seus sigilos fiscais e bancários foram quebrados com a autorização do Supremo Tribunal Federal. Nesta quarta-feira, o ministro do STF Alexandre de Moraes, que autorizou a operação contra o titular do Meio Ambiente, rejeitou um pedido da Procuradoria-Geral da República para que ele deixasse de relatar o caso.
Se não bastasse o cerco policial, os meses de março e abril registraram notícias negativas para a área ambiental. E a tendência é que piore em breve. Em março, a região amazônica teve aumento de 12,5% de desmatamento. Em abril, de 42,39%. As comparações são com os mesmos meses de 2020 e foram elaborados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Mourão ressaltou que maio deve registrar novo aumento. Por essa razão, ele ainda não descartou a possibilidade de chamar os militares, que encerraram sua participação na atividade, para atuar novamente. “Nós vamos acionar novamente as Forças Armadas aí pelo menos nesses próximos dois meses para que a gente consiga atingir o objetivo proposto.” Sua meta é reduzir o desmatamento em 15% até julho, algo que parece difícil de ser atingido.
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