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Covereadora do PSOL, que teve a casa alvejada: “Não podemos ter outra Marielle Franco em São Paulo. Uma Marielle trans”

Carolina Iara, uma das integrantes da bancada feminista do PSOL, teve a casa alvejada e cobra medidas de proteção por parte do Estado: “Até imaginei que poderia incomodar, mas não imaginei que seria tão rápido”

A covereadora Carolina Iara, da bancada feminista do PSOL.
A covereadora Carolina Iara, da bancada feminista do PSOL.Acervo pessoal
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“Eu até imaginei que com o tempo eu poderia incomodar, mas não imaginei que seria tão rápido, isso me surpreendeu. No meu primeiro mês de mandato este ataque”, afirmou ao EL PAÍS a covereadora da bancada feminista do PSOL em São Paulo, Carolina Iara, 28. Foram ao menos dois disparos que atingiram as paredes da sala da casa da parlamentar na zona leste da capital. O ataque ocorreu na madrugada de terça-feira, por volta das 2h da manhã. Câmeras de segurança da rua registraram a passagem de um carro branco próximo ao horário dos tiros: ele estaciona em frente à residência de Carolina por alguns minutos. Um homem desce e retorna segundos depois, então o carro dá meia volta e vai embora. Não é possível identificar a placa nem o rosto do ocupante. O caso está sendo investigado pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil, e uma equipe de peritos já foi ao local do crime para coletar provas. A parlamentar deixou o imóvel temporariamente por medida de segurança até que a investigação avance.

A bancada feminista do PSOL acredita que o crime foi político, tendo em vista a proeminência de Carolina no ativismo em prol das pessoas trans. O grupo irá pedir proteção policial para todas as integrantes do mandato. O ataque contra a covereadora ocorre às vésperas do Dia da Visibilidade Trans, celebrado nesta sexta-feira —o país é um dos líderes em homicídios e violência contra pessoas deste perfil. “A gente não pode permitir que a cidade de São Paulo repita a história do Rio de Janeiro e tenha uma Marielle Franco aqui nessa cidade. Uma Marielle Franco trans”, disse Carolina após prestar depoimento. “Tudo indica que foi do portão que atiraram para a minha sala. Quando eu percebi esses dois sinais de tiro, eu percebi que não era algo do acaso, uma bala perdida. Minha casa foi alvejada, não se sabe por quem, por qual motivo, mas uma covereadora de um mandato coletivo, uma mulher negra, trans, está sendo ameaçada de morte na maior cidade do país”. Testemunhas ouvidas pela polícia também relataram um forte barulho no mesmo horário em que o carro branco passou pela rua.

Caso se comprove que o ataque foi uma tentativa de intimidação contra Carolina, não será o primeiro ato do tipo contra parlamentares negras e trans no Brasil. Em dezembro a professora Ana Carolina Dartora (PT), 37, primeira vereadora negra eleita nos 327 anos da Câmara Municipal de Curitiba, relatou ter recebido a seguinte ameaça nas redes sociais: “Eu juro que vou comprar uma pistola 9mm no Morro do Engenho e uma passagem só de ida para Curitiba e vou te matar”, como relatou a repórter Isadora Rupp. Ameaças semelhantes foram feitas para Ana Lúcia Martins (PT), também a primeira mulher negra eleita para a vereança em Joinville (SC), e as vereadoras trans Duda Salabert (PDT), de Belo Horizonte, e Benny Briolly (PSOL), de Niterói (RJ). Segundo a polícia, os responsáveis pelas mensagens são parte de uma célula neonazista que atua se organiza na deep web, uma camada da internet não indexada por buscadores e utilizada também para o planejamento de crimes.

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Apesar do susto, Carolina não pensa em abandonar a política. “Não pensei em desistir nem abandonar o mandato. Um autoexílio está fora de cogitação para mim. Vou enfrentar isso aqui em São Paulo”, diz a covereadora. Representantes do PSOL devem se reunir nos próximos dias com integrantes da Secretaria de Segurança Pública do Estado para discutir medidas de proteção às suas parlamentares alvo de ameaças. “Na internet eu não recebi ameaça direta à minha integridade física ou à minha vida, mas muito assédio sexual, principalmente depois da eleição, e alguns comentários raivosos de extrema direita”, diz.

Em nota, a Oxfam Brasil manifestou “indignação e preocupação com mais um caso de violência política contra uma mulher negra eleita no país”. O texto da organização, que reúne várias ONGs voltadas à promoção dos direitos humanos, diz ainda que “desde as eleições municipais de 2020, vários casos de violência política contra mulheres negras estão sendo noticiados, mas pouco se sabe das investigações e soluções para evitar que outras mulheres também se tornem vítimas”. A presidente em exercício da Câmara paulistana, Rute Costa (PSDB), entrou em contato com Carolina para prestar solidariedade.

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