Epicentro do coronavírus no Brasil, São Paulo readapta sua rotina aos dias de quarentena
Maior cidade do país é também o local com mais casos confirmados, 145. Em partes da capital, ruas já começam a ficar mais vazias, com a adoção de home office e suspensão de aulas
A Avenida das Nações Unidas, localizada na zona sul de São Paulo, é uma das vias responsáveis por ligar alguns dos maiores centros empresariais da cidade, nas regiões de Itaim Bibi e Vila Olímpia, à Marginal Tietê, principal eixo de conexão dos bairros comerciais da cidade com a periferia. Na última sexta-feira, 13, avenidas e marginal apresentavam tráfego fluído no período da manhã e almoço, algo inusitado na rotina de um paulistano frequentador da região. O menor número de carros esteve ligado com a postura adotada por várias empresas, que recomendaram aos seus funcionários o home office em busca de diminuir a propagação da doença durante a pandemia do coronavírus. Naquela sexta-feira, eram 98 casos confirmados no Brasil, 56 em São Paulo. Três dias depois, são 152 no Estado (145 na capital) e 234 no país —a maior cidade da América Latina decretará, a partir desta terça-feira, estado de emergência, com suspensão do rodízio e de eventos—. A rotina, nesta semana, começou ainda mais afetada.
Victor Castro, 24 anos, é funcionário da Raízen, empresa do setor de energia que fica na avenida Brigadeiro Faria Lima, no bairro do Itaim Bibi, e teve uma reunião importante para discutir o planejamento das semanas seguintes que ocupou toda a manhã —feita pela internet. Por decisão da empresa, todos os empregados trabalham de casa a partir desta semana. “Em mais de um ano que trabalho aqui, é a primeira vez que decretam home office. É uma novidade bem grande porque a empresa não tem essa cultura”, comenta ele. Para ele, a medida traz as vantagens de não precisar se deslocar no trânsito, almoçar em casa e usar roupas mais confortáveis, mas causa certa confusão pela novidade. “Fico meio perdido, me distraio com coisas que não me distrairia no trabalho”, brinca. Victor concorda com a determinação, uma vez que prioriza a prevenção para que o Brasil não tenha o pico de infectados igual ao de países na Europa. “Por mais que a situação ainda não esteja tão grave aqui, é melhor agir o mais rapidamente possível. Nós temos 100% da tecnologia para fazer o trabalho de casa”, afirma.
Outros setores de serviços não têm a opção do home office; as diaristas, por exemplo, recebem por dia trabalhado e são o terceiro seguimento que mais emprega mulheres em São Paulo (14,5% da população feminina). Pensando nelas, foi iniciada uma campanha nas redes sociais impulsionada pelo economista Rodrigo Zeidan para que as pessoas remunerem suas empregadas mesmo dispensando-as do serviço. Por outro lado, muitas pessoas buscam os táxis e aplicativos de transporte para evitar as aglomerações de metrôs e ônibus ao se locomoverem. Os motoristas também recebem de acordo com a quantidade de corridas e, para driblar o contágio, optam por vidros abertos, muito álcool em gel e viagens longe do aeroporto. Mas não podem deixar de trabalhar.
Castro concilia o emprego com as aulas de engenharia de materiais na Escola Politécnica da USP, no campus da capital. Foi lá, no curso de engenharia naval, que foi confirmado o segundo caso do novo coronavírus dentro da maior universidade do país. No sábado, a USP anunciou, juntamente com as outras duas universidades estaduais do Estado, Unicamp e Unesp, a paralisação das aulas a partir do dia 17 de março. A medida foi a mesma de outras faculdades de São Paulo, como Cásper Líbero, FGV, Insper, PUC-SP, ESPM e Faap, além de escolas da rede pública e privada. A partir da mesma data, o governador João Doria anunciou que fechará por 30 dias museus, bibliotecas e centros culturais do Estado, além de recomendar a paralisação de cinemas, casas de espetáculos e teatros privados pelo mesmo período. A Federação Paulista de Futebol suspendeu por tempo indeterminado o campeonato paulista, seguindo a orientação da CBF e rumando no mesmo sentido de torneios esportivos do mundo inteiro.
Os pequenos eventos de lazer também precisarão ser adiados. Festas de aniversário, chás de bebês e jantares marcados para o último fim de semana e para os próximos dias já estão sendo trocados por mensagens via celular e refeições caseiras. Filhos e pais, sem escola e com home office, se encontram em casa, mas as opções de lazer são limitadas. Quando até a novela das nove da Globo é suspensa, as dicas que viralizam nas redes vão desde como se comportar no horário de trabalho dentro de casa a quais as séries mais recomendáveis da Netflix. Algumas operadoras de televisão também liberaram sinais de canais de entretenimento e jornalismo para auxiliar o momento de quarentena.
Mas as relevantes mudanças não significam que a cidade está parada. Muitos paulistanos que não puderam adotar o home office ainda enchem o transporte público para chegar aos seus empregos nesta segunda-feira, assim como restaurantes, bares, academias, cabeleireiros e outros estabelecimentos comuns seguem de portas abertas. No prédio da Covisa, a Coordenadoria de Vigilância Sanitária da Prefeitura de São Paulo, responsável por fiscalizar se os ambientes da cidade atendem às normas de saúde determinadas pela legislação, os funcionários ainda trabalham normalmente. Com o pico da epidemia no início e números pouco expressivos quando comparados aos europeus, onde está o novo epicentro do coronavírus, grande parte da população ainda não adota medidas mais rígidas. Com o passar dos dias, a recomendação é que as ruas fiquem cada vez mais vazias conforme os casos aumentem. Pouco a pouco, São Paulo terá que se adaptar à quarentena.
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