‘Latinwood’ emerge como a nova meca do cinema
Entre 2008 e 2012, o mercado cinematográfico na América Latina e Caribe cresceu 73%, sete vezes mais que Europa, Oriente Médio e África
Os duendes, anões e homens, além de salvar a humanidade de Sauron e matar a todos os orcs possíveis, colocaram a Nova Zelândia no mapa. O diretor Peter Jackson se empenhou em filmar em casa a saga de O senhor dos anéis e o mundo se apaixonou pelas paisagens do país. Anos depois, o filme continua a ser um incentivo para o turismo e também para o setor audiovisual, que gera um rendimento de dois milhões de dólares anuais em um país que não chega a cinco milhões de habitantes.
A América Latina e Caribe também ambicionam esse futuro. Querem que o cinema que é produzido na região seja uma vitrine das suas culturas e uma indústria que deixe milhões de dólares. Hoje há muitos braços que remam na mesma direção: Latinwood. Este foi um dos tópicos mais abordados na Foromic, o congresso sobre micro finanças organizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (Bid).
Entre 2008 e 2012, o mercado cinematográfico na região cresceu 73%, sete vezes mais que na Europa, Oriente Médio e África. E cinco vezes mais que nos Estados Unidos. México, Brasil e Argentina estão entre os dez primeiros países em produção de filmes. Não é possível ignorar o peso que os diretores latino-americanos ganharam, com Iñárritu, Cuarón e Del Toro. O segundo conseguiu, pela primeira vez, que um filme em espanhol fosse indicado a melhor filme no Oscar.
Esses números contribuíram para que alguns países dessem um passos a frente para atrair produções. O Panamá aprovou, em 2012, uma lei do cinema com este objetivo. Embora durante esses sete anos tenha sofrido oscilações, o balanço é que, no período, 6.000 panamenhos foram empregados em diferentes projetos, locais ou internacionais e o setor gerou 56 milhões de dólares. "Às vezes, os ministérios de Finanças e da Fazenda esquecem o impacto que podem gerar os incentivos fiscais, mas ficou demonstrado o seu efeito econômico e social", defende Pituka Ortega, diretora do festival internacional do Panamá.
A República Dominicana é outro dos destinos que focou mais neste mercado e agora soma uma média de 45 produções cinematográficas anuais, 30 locais e 15 estrangeiras. "Isso, para um país de dez milhões de habitantes, é muito", diz Albert Martínez, de Lantica Media, uma empresa de produção radicada no país caribenho, que está por trás de grandes sucessos comerciais como Triple X e A 47 metros. "Os incentivos são uma das principais razões que fazem com que as filmagens sejam em um lugar ou outro. Antes deles, era filmado, no máximo, um filme estrangeiro por ano na República Dominicana", diz. Em 2017, a indústria contribuiu com 66 milhões de dólares à economia do país.
Atingir o sucesso de público é um dos grandes desafios. "Precisamos dar a oportunidade de ver histórias que falem de nós", reclama Ortega. E fornece dados: nos últimos cinco anos, 18 filmes panamenhos arrecadaram menos que um filme americano, Os vingadores, que ingressou no ano passado mais de 3,5 milhões de dólares. "Os latino-americanos estão produzindo, mas temos que saber comunicar que existe outra opção além do de sempre", diz. Em 2017, estrearam na região quase o mesmo número de filmes produzidos na América Latina que os que vieram de Hollywood.
Para isso contribuem, pouco a pouco, iniciativas como a da rede chilena de salas independentes, em que o diretor Matías Bize, ganhador de um Goya, encontrou um grande apoio. "Muitos programadores de salas com um grande amor pelo cinema lançaram essa rede, que mantém filmes de autores que são esmagadas pelos grandes filmes nas salas comerciais e que permitem ao público ter um valor agregado, porque depois das projeções há palestras e conversas com a equipe", diz o diretor.
Novas plataformas, como a Netflix revolucionaram o modo de trabalhar. Bize, como diretor, garante que o seu objetivo é que seu trabalho "esteja em todas os canais possíveis". De fato, o seu último filme, En tu piel, estará disponível na HBO. O projeto mais recente de Lantica, a empresa de Albert Martínez, foi uma produção para a Netflix. "Eles chegaram à República Dominicana por várias razões: as localizações, os incentivos e a infraestrutura que podíamos proporcionar. A Netflix financia tantos projetos que sempre está procurando novos lugares e este agora é muito atraente. Estas plataformas mudaram muito as regras. Antes era muito difícil ver filmes de outros países latino-americanos e o mesmo acontecia com a Espanha. Só cruzavam fronteiras um ou dois".
Para Ortega, a grande variedade de produções destas novas plataformas é um exemplo de que há público para tudo: "É fascinante o que são capazes de compreender do público graças à sua análise de dados. Isto indica que não estamos sujeitos apenas a um tipo de histórias".
Para além dos números, os criadores reivindicam o poderoso papel social do cinema. O fenômeno do filme Roma despertou no México, por exemplo, um debate sobre as condições das empregadas domésticas. "Os filmes americanos dos anos 40 foram fundamentais para garantir o apoio da população na participação na Segunda Guerra Mundial, mas também conseguiram coisas positivas.
O curta-metragem paquistanês, A girl in the river, fez com que, em 2016, o primeiro ministro proibisse os crimes de honra", diz Ortega. A diretora do festival do Panamá termina com uma pergunta diferente para Latinwood: "Existe alguém que não foi marcado por um filme? Tratamos o cinema como algo óbvio e não percebemos o quão importante é em nossas vidas".
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