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Em Portugal ninguém fala de nacionalismo ou imigrantes

Depois de anos de crise, país votará reconciliado com a União Europeia. Eleições cruciais para futuro da UE são no domingo, 26

João Ferreira, cabeça de lista da CDU (Coalizão do PC e Os Verdes), distribui seu programa eleitoral em Montijo.
João Ferreira, cabeça de lista da CDU (Coalizão do PC e Os Verdes), distribui seu programa eleitoral em Montijo.TIAGO PETINGA (EFE)
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Portugal não é um país de extremismos, não em vão fez uma revolução com cravos e sem mortos. Desde aquele 1974 suportou com resignação três intervenções internacionais para salvar financeiramente o país, a última (2011-14) com sacrifícios brutais. A chegada do Partido Socialista ao Governo há quatro anos recuperou a confiança de seus cidadãos, de Bruxelas e da enfraquecida família internacional. O resultado é que os portugueses chegam à eleição que termina neste domingo, considerada determinante o futuro do continente, amando a Europa como quase nunca, mas mais pendentes de suas eleições legislativas em outubro.

O socialista António Costa, primeiro-ministro de Portugal, abriu a campanha europeia com o apoio do presidente francês Emmanuel Macron. “É a mudança progressista necessária para o renascimento europeu”, disse-lhe. Em seguida, atacou os partidos de centro-direita europeus e de Portugal. O primeiro-ministro em estado puro: Costa procura ganhar ao mesmo tempo simpatia das forças europeias do centro e da esquerda portuguesa. O líder, que governa desde 2015 com o apoio dos partidos de esquerda, tem um olho posto nas eleições europeias deste domingo e nas eleições legislativas de outubro.

O aceno a um lado e ao outro inquieta um dos seus parceiros parlamentares, o Bloco de Esquerda. “O PS defende aqui a geringonça [Governo de minoria socialista com apoio parlamentar do Bloco e do PC], mas na Europa não é com quem se alia normalmente”, reage Marisa Matias, candidata europeia do Bloco. “É uma mensagem muito ambígua.”

Costa não tem intenção alguma de abandonar a internacional socialista, seu objetivo é atrair o eleitorado do centro português, absolutamente desnorteado, agora e em outubro, principalmente. Dias depois, em um comício em Magualde, Costa esteve acompanhado por Frans Timmermans, candidato socialista à presidência da Comissão Europeia. Na ocasião, atacou sem rodeios o candidato conservador Manfred Weber, do Partido Popular Europeu, ao qual lembrou de que havia defendido sanções contra Portugal.

Para demonstrar que Costa está com quase todos — “An amazing man”, segundo Timmermans —, recebeu mensagens de apoio de Macron e do grego Alexis Tsipras, simpatizante do espanhol Podemos e do próprio Bloco. Esta capacidade de amar e ser amado por uns e outros fez de Portugal, nos seus quatro anos de Governo, um cenário absolutamente singular na Europa e uma referência para uma via alternativa e socialista para sair da crise. 

Sem chegar a ser o Mar Morto, Portugal (com 10 milhões de habitantes) é um mar de tranquilidade em uma conjuntura europeia de inquietantes incertezas. Em relação a 2014, as cabeças de lista de quatro das cinco principais candidaturas nem sequer mudaram. A exceção é o PS, que colocou um anódino ex-ministro, Pedro Marques, destinado a ser comissário europeu.

Com respeito a 2014, nem sequer mudaram as cabeças de cartaz em quatro das cinco principais candidaturas. Também não as sondagens aventuram mudanças.

As mesmas pesquisas apontam resultados com tendências semelhantes àquelas de cinco anos atrás. Naquele maio, ainda com a troika no país, ganhou o PS (31,5% dos votos e 8 deputados), seguido da coalizão governista de centro direita PSD-CDS (27,7% e 7), da coalizão do PC com Os Verdes, CDU (12,7% e 3), da coalizão Partido da Terra (7,1% e 2) e do Bloco de Esquerda (BE), com 4,6% dos votos e um deputado.

Ultranacionalismo e emigração, temas centrais da campanha em outros países, não existem em Portugal. Nacionalismo só existe um, o português; e os imigrantes, embora sejam desejados, não chegam ao mesmo número do que em países como a Grécia ou a Itália. Apenas 4% da população residente é estrangeira, em parte porque parte dos brasileiros que para lá vão não consegue ficar. Se há algum incômodo com estrangeiros em Portugal, ele seria com quem vem da antiga colônia. Em 2018, o número de brasileiros barrados ao tentar entrar no país mais do que dobrou, subindo para 2.856 pessoas, um recorde — em 2017, tinham sido 1.336; um ano antes, 968.

Rejeição ao Exército comum europeu

Mesmo em desacordo, os cinco principais partidos concordam com a única questão de relevância que surgiu nesta campanha: o Exército comum europeu. Ninguém o quer, embora por razões diferentes, uns porque acreditam que a defesa não faz falta e outros porque querem que os Estados Unidos os defendam através da OTAN.

Os eurocéticos das eleições anteriores agora estão em silêncio ou são eurofãs. “A moeda única não tem salvação”, dizia há três anos o cardeal econômico do Bloco, Francisco Louçã. Hoje sua cabeça de lista, Marisa Matías, afirma categoricamente que seu partido nunca foi contra o euro. E o PC abandona sua velha pretensão de sair da CE e, claro, também do euro e da OTAN. O que quer que pensem, silenciaram porque agora o Portugalexit não dá votos.

Se hoje houvesse um referendo de permanência, 77% dos portugueses votariam a favor (68% é a média europeia), segundo o Eurobarômetro de fevereiro. Cerca de 82% consideram que o país se beneficia com a integração, apenas 10% são contra, recorde europeu.

Mas uma coisa é abraçar a Europa e outra ir às urnas. Em 2014, apenas 33,5% dos eleitores votaram e, no caso dos jovens, a abstenção foi de cerca de 80%. Em fevereiro, apenas 17% da população disse que votaria. Na segunda-feira, o líder do Basta, um novo partido de conotação populista, preferiu participar de uma conversa sobre futebol do que de um debate eleitoral na televisão pública. Em Portugal se vota mais nas eleições do Benfica.

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