China luta contra a desaceleração econômica com grandes cortes de impostos e maior gasto público
Economia do gigante asiático crescerá entre 6% e 6,5% em plena guerra comercial com os EUA
Um ambiente “mais grave e mais complicado”. Um “cenário de fundo de pressões à baixa”. Um clima internacional “complexo e que está mudando rapidamente”. Soa pouco otimista o panorama que a China prevê para este ano, em meio a uma guerra comercial com os Estados Unidos, queda da demanda global e o ressurgimento do populismo e do protecionismo. Panorama que fez o país diminuir suas previsões de crescimento, de 6,5% no ano passado a uma taxa entre 6% e 6,5%. E a reforçar uma mensagem: estabilidade. Uma estabilidade imprescindível neste ano: o sistema faz 70 anos e quer comemorar com toda a pompa.
Diante dos ventos contrários, a China responderá – como adiantou o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang –, com um aumento do gasto público, que crescerá 6,5% até chegar aos 23 trilhões de yuans (13 trilhões de reais). A parte orçamentária para a Defesa, que no ano passado aumentou 8,1%, terá nesse ano um aumento mais moderado, de 7,5%. Não existirá um plano de estímulo como o adotado para responder à crise financeira global de 2008, e sim medidas que alegrarão os setores econômicos. Entre elas, promete reduzir a carga fiscal das empresas – especialmente mediante diminuições no IVA (imposto sobre produtos) e suas contribuições ao Seguro Social – em dois trilhões de yuans (1,1 trilhão de reais). O déficit orçamentário crescerá ligeiramente, 0,2% para ficar em 2,8%.
Transcorreu somente um ano desde que a sessão anual da Assembleia Nacional Popular (ANP), o Legislativo chinês, transformou o presidente, Xi Jinping, no líder com mais poder desde os tempos de Mao Zedong, ao abolir os limites de seu mandato. A mensagem, à época, era de autoridade. Agora, é preciso manter a confiança apesar da queda no ritmo de crescimento da economia.
“Precisamos estar preparados para uma luta dura. Não podemos subestimar as dificuldades que encaramos, mas nossa confiança não deve enfraquecer”, frisou o primeiro-ministro Li, em seu discurso sobre os objetivos do Governo, na inauguração da sessão anual da Assembleia Nacional Popular, no Grande Palácio do Povo de Pequim.
Mas, diante dos aproximadamente 3.000 delegados participantes da sessão – que disciplinadamente apoiavam com unanimidade página após página do discurso de Li, à medida que o primeiro-ministro o lia –, o chefe de Governo deixou claro que o Executivo não pretende realizar nenhuma mudança radical. “Com o cenário de fundo de um clima internacional complexo e que está mudando rapidamente, devemos manter nosso foco estratégico e realizar nosso trabalho de acordo com os planos e metas que já havíamos traçado”.
No palco, diante de um fundo de estandartes e bandeiras vermelhas, Xi Jinping olhava impassível seu primeiro-ministro. “Há somente um ano o presidente Xi Jinping estava no auge, quando a Constituição foi revisada para conceder-lhe o status de ‘imperador vitalício’. Mas agora enfrenta desafios importantes”, diz o cientista político Willy Lam, da Universidade Chinesa de Hong Kong.
O mandatário chinês ainda tem em sua lista de assuntos pendentes a se resolver a guerra comercial com os Estados Unidos, atualmente em uma trégua após as equipes de negociação acertarem a prorrogação do prazo de 1 de março para se conseguir um acordo. Seu principal projeto em política exterior, a Nova Rota da Seda – a gigantesca rede de infraestrutura com a qual a China quer se conectar com o resto do mundo –, viu crescer as queixas de alguns dos países incluídos. Um crescimento econômico mais fraco pode gerar um aumento da insatisfação social, justamente no ano em que o regime quer propagandear suas conquistas nessas últimas sete décadas.
“O modelo chinês não funciona para resolver a miríade de problemas econômicos do país que já surgiram antes da guerra comercial. Xi Jinping não fez as reformas de mercado defendidas durante quarenta anos de abertura econômica iniciada por Deng Xiaoping”, diz Lam, que cita, entre outros exemplos, a recusa em reformar o setor das todo-poderosas, mas pouco eficientes, empresas estatais.
Isso não quer dizer que Xi Jinping enfrenta qualquer tipo de desafio ao seu mandato, pois mantém um controle férreo sobre o Exército e a Polícia. “Não corre risco de perder poder. Mas sua autoridade diminuiu”, afirma o cientista político de Hong Kong.
A preocupação do Governo em manter a estabilidade – mencionada sete vezes no discurso de Li – aumenta pois esse ano, além dos festejos de outubro, tem vários outros aniversários políticos muito menos favoráveis ao regime. Nesse mês se completa o centenário do nascimento de Zhao Ziyang, o secretário geral do Partido Comunista deposto por simpatizar muito com os estudantes que em 1989 tomaram Tiananmen. Em maio também se comemora o centenário do Movimento de 4 de Maio, que abriu uma era de maior participação política popular. E em 4 de junho se completam 30 anos da matança na praça central de Pequim.
“São aniversários muito ligados à legitimidade do Partido”, diz o comentarista político independente Wu Qiang. “Mesmo não podendo esperar grandes protestos nesses aniversários, pela repressão contra os dissidentes e movimentos civis... o Governo está preocupado já que um pequeno protesto pode causar o colapso da autoridade como uma avalanche. É sua maior preocupação”.
Com isso em mente, o Governo de Xi Jinping tenta fechar frentes o mais rapidamente possível. Durante sua sessão anual, que continuará até 15 de março, a ANP prevê debater e aprovar uma nova lei de investimentos estrangeiros, como parte das medidas para satisfazer Washington e resolver a guerra comercial. Os EUA exigem da China um maior equilíbrio da balança comercial, o fim da transferência forçada de tecnologia e garantias sobre a proteção da propriedade intelectual.
E para resolver possíveis surtos de descontentamento entre a população, especialmente entre os trabalhadores que veem seus empregos desaparecer e em perigo pelo fechamento e mudança de fábricas? Reciclagem para quinze milhões de trabalhadores menos qualificados e criação de 11 milhões de empregos urbanos. “Realizaremos uma política de emprego como principal prioridade”, promete o primeiro-ministro Li.
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