Odebrecht indenizará Peru com 228 milhões de dólares por subornos em obras públicas
Ex-executivos e advogados da empresa assinam acordo de culpabilidade com autoridades peruanas que investigam corrupção de quatro Governos
Os advogados da Odebrecht e quatro ex-executivos da construtora assinaram nesta sexta-feira em São Paulo um acordo de culpabilidade com o procurador peruano José Domingo Pérez e com o promotor especial para o caso no Peru, Jorge Ramírez, que obriga a empresa a pagar ao país uma indenização civil equivalente a 228 milhões de dólares (844 milhões de reais) em 15 anos por ter incorrido em corrupção nos contratos de quatro obras públicas. Além disso, a empresa brasileira − protagonista de um dos maiores casos de corrupção da história da América Latina − se compromete a saldar este ano o equivalente a 134,5 milhões de dólares (498 milhões de reais) de dívida tributária no Peru. A construtora, fundada pelo filho de um imigrante alemão em 1923, desenvolveu manuais e sistemas de bônus para conseguir cada vez mais contratos de obras públicas em vários países da América Latina e da África.
O acordo de colaboração entre o Estado peruano e a Odebrecht obriga a empresa a “fornecer tudo que os fiscais peruanos exigirem”, afirmou o promotor Rafael Vela, coordenador da equipe especial da Lava Jato, em uma entrevista coletiva. Em troca do pagamento da indenização e da entrega ilimitada de provas, os ex-diretores da construtora não serão processados penalmente no Peru, embora sigam sob investigação da Justiça brasileira. Além disso, a empresa com sede em Salvador voltará a ficar habilitada para participar de licitações públicas peruanas quando for saldada a parte acertada do total de dívida tributária.
No pacto, que ainda deve ser aprovado por um juiz peruano, a Odebrecht admite o pagamento de 32 milhões de dólares (118 milhões de reais) em subornos para obter os contratos da rodovia Interoceánica Sur, da linha 1 do metrô de Lima, da estrada Circunvalación, na cidade de Cuzco, e da Costa Verde de Callao. O acordo está aberto a futuras atualizações, de modo que se as autoridades comprovarem mais casos de corrupção, a empresa terá de pagar uma indenização maior. “É um acordo aberto. A partir da busca de informações e do que determinem os fiscais, podem ser abertas novas linhas de investigação. Isto é um pacto sobre a culpabilidade em alguns dos projetos, se houver mais, voltaremos a negociar com a empresa e eles serão incluídos”, detalhou Vela.
O valor acertado para a indenização civil está abaixo das pretensões do Estado peruano, mas o risco de continuar esticando a corda era alto: a Odebrecht admitia a possibilidade de declarar insolvência e abandonar o país, caso em que não só não pagaria a indenização, como também não entregaria provas para saber quem esteve envolvido nos casos de corrupção. “A empresa continuará buscando entendimentos dessa natureza com outros países onde atua, com o objetivo de ter mais segurança jurídica para sua operação e pelo compromisso em apoiar investigações e atuar como um agente de transformação”, assinalou a construtora em um comunicado divulgado horas depois da assinatura do acordo de colaboração.
O acordo garante a validade das provas que a Odebrecht entregou a conta-gotas desde 2017, e que comprometem, por exemplo, os ex-presidentes Alejandro Toledo, Alan García, Ollanta Humala e Pedro Pablo Kuczynski. Com base nelas, o Peru solicitou aos Estados Unidos a extradição de Toledo, e outros três ex-chefes de Estado são alvo de uma ordem judicial que os obriga a permanecer em território peruano. A Procuradoria, além disso, conseguiu congelar alguns bens de Kuczynski, que foi consultor remunerado da Odebrecht.
Vela destacou há três meses que uma das vantagens do pacto com Lima seria poder contar com os apelidos e códigos que os funcionários do departamento da Odebrecht encarregado dos subornos usaram para registrar os pagamentos para políticos e funcionários públicos, assim como para seus laranjas. Antes de viajar para São Paulo, o coordenador da equipe especial da Lava Jato acrescentou, em declarações ao EL PAÍS, que os interrogatórios que os investigadores farão a partir de segunda-feira em Salvador com ex-executivos da Odebrecht servirão para completar as acusações fiscais que apresentarão aos juízes no curto prazo.
As declarações de José Spinola e Marcos Grillo − dois funcionários que conhecem as razões pelas quais a Odebrecht pagou 100.000 dólares (370 mil reais) em 2016 a García, cujo Governo aprovou rapidamente a concessão da linha 1 do metrô limenho − atraíram especial interesse no país andino. Assim como as do ex-tesoureiro internacional da Odebrecht Luiz Eduardo da Rocha Soares e do ex-gerente-geral Raymundo Nonato Trindade Serra, considerados dos mais relevantes no processo.
Os fiscais da Lava Jato também investigam por lavagem de dinheiro do caixa dois da Odebrecht a ex-primeira-dama Nadine Heredia, a ex-candidata à presidência e líder oposicionista Keiko Fujimori (em prisão provisória), a ex-prefeita de Lima Susana Villarán e o ex-governador de Callao Félix Moreno. As investigações incluem, além disso, uma longa lista de antigos funcionários públicos − alguns deles presos ou foragidos desde 2017 −, empresários, juízes (que mediaram contratos entre o Estado e a Odebrecht) e outros cidadãos que teriam facilitado a circulação do dinheiro de propina da Odebrecht.
Outros casos de suborno
Além das quatro obras citadas, nas quais Odebrecht reconheceu ter praticado corrupção, um procurador descobriu outro caso de suborno na construção de uma estrada em Sierra Norte, no qual a empresa aceitou sua responsabilidade. Nos próximos dias, além dos interrogatórios que a equipe da Lava Jato programou até o dia 22, o promotor Elmer Chirre e uma coordenadora de litígio da procuradoria do caso Odebrecht buscarão obter depoimentos de ex-executivos da construtora para o julgamento contra o governador da região de Ancash que recebeu propinas para entregar a concessão.
Entre dezembro e janeiro, as forças políticas de oposição no Congresso peruano − o fujimorismo e o Partido Aprista −, juntamente com o então procurador-geral Pedro Chávarry, tentaram boicotar a assinatura do acordo com a Odebrecht para evitar que os investigadores encontrassem mais provas que incriminassem os líderes desses grupos políticos. Finalmente, dois anos depois que a empresa reconheceu suas práticas de corrupção em massa, os trabalhos de investigação podem se acelerar. Será, certamente, um motivo para novas tensões políticas e judiciais.
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