Por que ‘Animais Fantásticos’ dá as costas (literalmente) a Johnny Depp
As polêmicas e as acusações de maus-tratos que cercam o principal nome do novo filme da franquia baseada em ‘Harry Potter’ o transformaram em uma figura marginal antes da estreia
“A pior morte em Harry Potter? Foi quando J.K. Rowling morreu como modelo de conduta ao decidir apoiar um abusador enquanto ignorava a todos os fãs que falavam sobre isso”. As quase 50.000 curtidas e os mais de 20.000 retuítes que apoiam as palavras da tuiteira @Friggdottir são um sintoma do desencanto e da divisão que assolam hoje os seguidores muggles do mundo mágico. A estreia mundial, nesta sexta-feira, de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald, segundo filme da franquia baseada na mitologia dos livros do aprendiz de mago Harry Potter, poderá interromper a polêmica criada com a contratação de Johnny Depp como antagonista. As acusações de maus-tratos feitas por sua ex-mulher, a também atriz Amber Heard, transformaram aquele que chegou a ser o maior astro do cinema mundial em uma dor de cabeça para a produtora do filme, que não hesitou em lhe dar um papel marginal na campanha de promoção da estreia. Até o próprio Newt Scamander teria dificuldades para encontrá-lo.
Em Os Crimes de Grindelwald, Johnny Depp interpreta o mago das trevas que dá título ao filme, um personagem célebre na mitologia assinada por J.K. Rowling e de vital importância na trama do longa-metragem. No entanto − e apesar de ser a contratação mais famosa de um ator para a saga de Harry Potter desde sua chegada os cinemas, em 2001 −, o envolvimento do astro na promoção foi praticamente nulo. Ele ficou de fora tanto da turnê promocional como da première mundial que ocorreu em Paris, aparecendo apenas na estreia londrina, na terça-feira passada. Os diretores de marketing da Warner Bros parecem ter colocado em Depp o famoso manto de invisibilidade de Harry Potter para evitar que as acusações contra o polêmico ator afetem a imagem de entretenimento familiar da franquia.
Um fato revelador diz respeito ao pôster principal do longa, que decora cinemas do mundo todo. Onze personagens do filme aparecem nele, mas apenas um está de costas e esconde seu rosto: o de Johnny Depp. Uma circunstância insólita para um ator que liderava, não muito tempo atrás, uma multimilionária franquia para todos os públicos, Piratas do Caribe. Veículos de comunicação como o site Screenrant já especularam sobre essa estratégia de ocultação após o lançamento do primeiro trailer, em março, no qual Depp mal aparecia.
Uma participação de três minutos caracterizado como Grindelwald na feira Comic-Con de San Diego em julho e algumas entrevistas para revistas – publicadas várias semanas antes do lançamento − foram suas únicas ações de divulgação na mídia. Algo mais que incomum para um membro da principal constelação da meca do cinema, um seleto grupo de astros e estrelas com salários milionários justificados em grande parte por sua capacidade de atrair público no mundo todo. É inútil procurar alguma foto na qual Eddie Redmayne e Johnny Depp, que interpretam o herói e o vilão no filme, apareçam juntos no tapete vermelho, porque não existe. Só Jude Law aceitou ser fotografado ao lado do ator proscrito.
Em maio de 2016, Amber Heard (Aquaman) conseguiu uma ordem judicial para impedir Depp de se aproximar dela. A atriz o acusou de violência machista, apresentando como prova várias imagens de seu rosto machucado. Vazamentos de vídeos divulgados posteriormente pelo site TMZ completaram o retrato que evidenciou o comportamento agressivo do ator. Depois de uma amarga troca de acusações, chegaram a um acordo: Depp pagou cerca de 7 milhões de euros (30 milhões de reais) a Heard para ela retirar a denúncia, quantia que a atriz doou a um hospital de Los Angeles especializado em vítimas de maus-tratos. Em uma entrevista à edição britânica da revista GQ, o ator atribui esses escândalos a uma conspiração, apontando diretamente contra a própria indústria de Hollywood − que ele chama de “o maldito circo de merda”.
Tanto J.K. Rowling, produtora e roteirista do filme, como o diretor David Yates defenderam a contratação de Depp, apesar das pressões de uma considerável parte dos fãs da saga para que se livrassem do ator. Muitos deles confessaram em redes sociais que não irão ao cinema para ver o filme, manifestando solidariedade a Heard. Uma hashtag pedindo o boicote do ator, #BoycottJohnnyDepp, promovida inicialmente por fãs sul-coreanos, conseguiu ser trending topic mundial na terça-feira.
As únicas declarações de Depp sobre sua polêmica incorporação ao elenco foram feitas durante uma conversa telefônica com a revista Entertainment Weekly. “Vou ser honesto. Eu me senti mal pelo fato de J.K. ter tido de lidar com as reações das pessoas lá fora. A verdade é que fui falsamente acusado. J.K. viu as provas e sabe, portanto, que fui falsamente acusado. Foi por isso que ela me apoiou publicamente. Ela não dá pouca importância às coisas. Não me apoiaria se não soubesse a verdade.”
O elenco evitou se pronunciar sobre a polêmica. Só outra recém chegada, Zoe Kravitz, resolveu falar, afirmando que é uma grande fã do ator e ressaltando que acredita em segundas oportunidades. Amber Heard não hesitou em responder pelo Twitter: “Ler a entrevista de Zoe Kravitz me recorda o quanto estamos desesperadamente necessitados de encontrar heróis de verdade”. Uma das vozes mais autorizadas da saga, Daniel Radcliffe − intérprete de Harry Potter −, também deu sua opinião no início do ano sobre a incorporação de Depp ao elenco, afirmando entender que as pessoas estivessem “irritadas e frustradas” com as explicações dadas por Rowling sobre o caso. “Nos filmes originais, trabalhamos com um cara que foi demitido por ter maconha e, obviamente, aquilo de que Johnny é acusado é muito pior que isso”, disse Radcliffe, em referência ao caso de Jamie Waylett, ator que dava vida ao personagem Crabbe.
Os problemas profissionais de Depp não acabam aqui. Em setembro, deveria ter chegado aos cinemas City of Lies, o aguardado filme baseado na investigação do assassinato dos rappers Tupac e Notorious B.I.G., que a produtora decidiu retirar do calendário por tempo indefinido, sem dar explicações. Durante a filmagem desse projeto, o ator foi denunciado por insultar e agredir um membro da equipe técnica. Há poucos dias, soubemos também que a Disney decidiu não incluir seu icônico Jack Sparrow nos próximos filmes da série Piratas do Caribe.
Apesar dos problemas com a promoção do filme e do boicote de uma parte de seu público potencial, os especialistas não acreditam que a polêmica vá ter um reflexo direto na bilheteria de Os Crimes de Grindelwald. Eles preveem que a estreia terá até mesmo um desempenho melhor que a de Animais Fantásticos e Onde Habitam, de 2016. O motivo? Uma maior proximidade em relação ao mito de Harry Potter, devido à presença do jovem Albus Dumbledore (Jude Law) como personagem principal. Se as previsões de 275 milhões de dólares (1 bilhão de reais) de bilheteria em seu primeiro fim de semana se concretizarem, talvez os verdadeiros magos de tudo isto sejam os da equipe de marketing.
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