Profusão de pesquisas eleitorais acirra a disputa à Presidência da República
Institutos contratados por empresas financeiras tornam a cobertura das tendências praticamente diária. Além de guiar voto útil, índices de intenção de voto podem ajudar a impulsionar ou arrasar campanhas
Se você é eleitor do deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) provavelmente gostou da última pesquisa BTG/FSB, que indicou 30% de intenção de voto para o capitão reformado do Exército. Foi o maior índice atingido por ele na segunda semana de setembro em qualquer das medições que alimentam o noticiário eleitoral quase que diariamente. Já os eleitores petistas puderam celebrar os 22% do ex-prefeito Fernando Haddad (PT) na única pesquisa Vox Populi/CUT desta campanha, que o mostrou à frente até de Bolsonaro. O candidato do PSL, líder nas pesquisas de institutos mais tradicionais, como Ibope e Datafolha, aparecia com apenas 18% no levantamento do Vox Populi, que justificou a disparidade entre seus números para os das outras pesquisas por ter associado o nome de Haddad ao do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Diante das diferenças, qual dado estaria certo?
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep), Duilio Novaes, todos. “Os levantamentos são feitos com diversos tipos de metodologia, e os resultados que a gente tem visto estão todos alinhados, não tem nada muito discrepante”, diz Novaes. A Abep tem um conselho de regulamentação com a prerrogativa de questionar como foram feitas as pesquisas e avaliar se foram bem conduzidas. Isso acontece sempre que alguma queixa é apresentada, mas o presidente da associação diz que isso é "bem raro".
Segundo o estatístico Paulo Guimarães, que trabalha em 13 Estados na eleição deste ano, o eleitor está mais exposto aos levantamentos nestas eleições. Além de Ibope, Datafolha, MDA e Vox Populi, a corrida eleitoral vem sendo abastecida por institutos como FSB, Ipespe, Paraná Pesquisas, DataPoder360 e Brasilis —desses, apenas DataPoder360 e Ipespe não fazem parte da Abep. Parte deles é contratada por instituições financeiras, cujas pesquisas causam oscilações na Bolsa de Valores de São Paulo e no valor do dólar quase que diariamente. Questionadas sobre o interesse de acompanhar as tendências eleitorais, BTG e XP Investimentos, que contratam pesquisas da FSB e do Ipespe, preferiram não comentar.
“Há quatro anos, tenho a impressão de que se a divulgação de pesquisas fosse como hoje, o Aécio [Neves] não chegaria onde chegou”, diz o estatístico. Em 2014, o senador tucano chegou a ser dado como carta fora do baralho durante a campanha, por aparecer empacado em terceiro lugar com 15% de intenções de voto, mas ultrapassou Marina Silva (então no PSB, hoje na Rede) na reta final do primeiro turno. Guimarães, que acompanhava de perto a campanha de Aécio e hoje presta consultoria para candidatos como Alckmin e o governador da Bahia, Rui Costa (PT), diz que as pesquisas têm o poder de reforçar as tendências que expõem. “Hoje, como se faz muita pesquisa aberta, [os eleitores dizem] ‘vou votar em fulano porque o outro não tem chance’. Sempre tivemos essas respostas, mas nunca em um grau tão elevado quanto agora”, diz, em referência aos grupos controle de eleitores que coordena.
Por conta da grande polarização que se estabeleceu entre os eleitorados anti-PT e anti-Bolsonaro, os institutos passaram a medir a possibilidade desse voto útil. Segundo o Ibope, 32% dos eleitores admitem grande chance de não votar em seu candidato de preferência para evitar a eleição daquele que consideram o pior presidenciável possível —outros 18% dizem que há possibilidade "média" de votar dessa forma. Quando questionados sobre se deixariam de votar no candidato de preferência para tentar eleger alguém com mais chances de vitória, 6% disseram que a possibilidade de fazê-lo é "muito alta" e 10% responderam que é "alta". As chances de vitória costumam ser medidas a partir das pesquisas de intenção de voto, que apresentam ainda os cenários de favoritismo para o segundo turno.
Por isso, o assunto se tornou tão sensível e alvo de questionamentos. Nesta sexta-feira, Ciro Gomes, do PDT, levantou dúvidas sobre os institutos durante campanha em Pindamonhangaba (SP). “Em um país onde se compra até deputado é razoável que a gente suspeite de que alguns institutos de pesquisa não estejam propriamente levantando números”, disse aos jornalistas, sugerindo que Geraldo Alckmin (PSDB) terá mais votos em São Paulo do que as pesquisas estão indicando —todas elas dão vantagem a Bolsonaro no Estado. Ciro disse ainda que os institutos de pesquisa serão "desmoralizados completamente" após a divulgação dos resultados do primeiro turno.
Na última quinta-feira, o Instituto Datafolha teve que explicar a metodologia de seus levantamentos depois de dois comunicados viralizarem no WhatsApp. Os dois textos são de autoria de James Gulbrandsen, gestor de investimentos da NCH Capital, gestora de fundos americana, e afirmam que as pesquisas trazem um "recorte tendencioso" e "uma parcela maior de pessoas que se identificam com ideais de esquerda", segundo afirmou o jornal Folha de S.Paulo. “O Datafolha, em seus levantamentos eleitorais, aplica conceitos e técnicas baseados na Teoria da Amostragem. As amostras são representativas da população estudada —neste caso o eleitorado brasileiro com 16 anos ou mais— e selecionadas através de critérios estatísticos, tendo como base fontes oficiais, como IBGE e TSE (...) O desenho da amostra é obtido através de método estatístico robusto e probabilístico", disse o Datafolha.
Mercado
Apesar do crescimento no número de cenários de intenção de voto divulgados, o mercado de pesquisas eleitorais parece menos aquecido neste ano do que 2014. Na última eleição, do dia 1º de janeiro até o dia 13 de setembro, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tinha registrado 498 pesquisas de nível nacional sobre a corrida presidencial. Durante o mesmo período deste ano, a quantidade registrada era de 331.
Para o presidente da Abep, é preciso esperar o balanço no mês de dezembro para ter noção exata sobre o impacto da eleição para o mercado, porque o ano está muito diferente. Segundo ele, o período de campanha mais curto do que o normal —caiu de 90 para 45 dias— pode ter concentrado a divulgação de pesquisas, dando a impressão de que a quantidade aumentou. A distribuição dessas informações por meio de redes sociais também pode ter tornado o processo eleitoral mais intenso, transportando os eleitores para dentro das campanhas, que acompanham o desenrolar do jogo político como se seguissem os trackings internos dos candidatos.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.