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Novo calendário Pirelli empodera as mulheres

Fotógrafo Albert Watson renova a publicação e retrata aspirações femininas com quatro histórias de mulheres protagonizadas por Gigi Hadid, Laetitia Casta, Misty Copeland e Julia Garner

A bailarina Misty Copeland e o fotógrafo Albert Watson durante a sessão do calendário Pirelli.
A bailarina Misty Copeland e o fotógrafo Albert Watson durante a sessão do calendário Pirelli.Calendário Pirelli
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O calendário Pirelli é um projeto em constante evolução. Começou a quebrar barreiras em 1963, quando foi publicado pela primeira vez. E volta a fazê-lo em sua 46ª edição, assinada pelo fotógrafo escocês Albert Watson, que aposta em uma direção completamente diferente de escolhida por seus predecessores em um momento cultural e social dominado por movimentos tão contundentes como o #MeToo.

Watson é considerado um dos grandes criadores de imagens que evocam elegância. É reconhecido como um dos maiores retratistas contemporâneos, com imagens icônicas que irradiam energia, como a que fez de Steve Jobs antes de morrer, ou a de Michael Jackson. Tem profundo talento estético e cuida da composição até o último detalhe para que as figuras se envolvam em harmonia com o ambiente enquanto joga com a luz.

“É um lindo projeto”, diz em uma conversa em seu estúdio no bairro nova-iorquino de Tribeca, “uma das grandes encomendas que um fotógrafo pode receber”. Watson trabalhou com várias ideias. No final, optou por uma narrativa que usa sonhos e aspirações como guarda-chuva. “São mulheres, mas também homens, que pensam em como serão suas vidas amanhã, na próxima semana, no ano que vem”. Nenhum dos protagonistas olha para ele, “porque pensam no futuro”.

Laetitia Casta, que interpreta uma pintora, e Sergei Polunin durante a preparação de uma das imagens do calendário Pirelli 2019.
Laetitia Casta, que interpreta uma pintora, e Sergei Polunin durante a preparação de uma das imagens do calendário Pirelli 2019.Calendário Pirelli

O calendário Pirelli se apresenta este ano como quatro filmes produzidos com base em imagens congeladas que contam a história de quatro mulheres. E em vez das 12 fotografias tradicionais, é composto por 48 imagens. Para explorar os sonhos, Watson escolheu duas mulheres mais velhas e duas mais jovens. Duas delas têm namorado e as outras duas se apoiam em amigos.

A bailarina Misty Copeland protagoniza o que poderia ter sido a origem de sua carreira. No calendário Pirelli ela vive em Miami, em uma casa art déco com o namorado, também bailarino, Calvin Royal, com quem ensaia em um pequeno palco e faz exercícios em uma piscina. Sonha em atuar algum dia em Paris, Berlim, Londres, São Francisco e Nova York. À noite, trabalha em um clube de strippers para ganhar o dinheiro que precisa para custear uma audição.

Julia Garner dá vida no calendário Pirelli a uma fotógrafa especializada em botânica.
Julia Garner dá vida no calendário Pirelli a uma fotógrafa especializada em botânica.Calendário Pirelli

O autor quer que este calendário seja lembrado pela pureza da fotografia. A segunda protagonista é a atriz e supermodelo Laetitia Casta. Ela também mora em Miami. Sua esperança é ser uma pintora famosa e expor em galerias de todo o mundo. Seu namorado é o bailarino Sergei Polunin. Julia Garner, a terceira, interpreta uma fotógrafa de botânica em Miami, em uma pequena casa com um enorme jardim tropical em que retrata sua amiga, a modelo Astrid Eika.

A quarta história pula para Nova York. A modelo Gigi Hadid dá vida a uma jovem rica que mora em uma cobertura no hotel Carlyle. O designer de moda Alexander Wang é seu confidente, um amigo que faz as vezes de psiquiatra pessoal que procura tirá-la de sua tristeza. “Os diferentes cenários”, explica ele, “e o jogo com as luzes torna as fotos mais interessantes”.

Gigi Hadid na história para o calendário Pirelli encara o papel de uma mulher de sucesso, que tem tudo, mas não está feliz com sua vida.
Gigi Hadid na história para o calendário Pirelli encara o papel de uma mulher de sucesso, que tem tudo, mas não está feliz com sua vida.Calendário Pirelli

O calendário 2019 é uma espécie de retorno à sensualidade, pela maneira como usa a luz e os personagens. Mostra silhuetas muito fluidas e os nus que aparecem são sutis, suaves, incorporados à história. Watson é o mestre das camadas, o que permite injetar mais tensão e emoção nas imagens, sem torná-las pesadas.

Albert Watson evita fazer simples fotos de mulheres belíssimas ou famosas. O fotógrafo acumula mais de cem capas para a Vogue, 40 para a Rolling Stone, e dirigiu campanhas para Chanel e Prada. Representa o preto e branco da personalidade de modelos como Naomi Campbell, Kate Moss e Cindy Crawford. Também retratou Mick Jagger, Andy Wharhol e é o autor da imagem de Alfred Hitchcock com o ganso morto, que lançou sua carreira. A diversidade de seu trabalho não tem paralelo. A revista Photo District News, a bíblia da indústria, o considera um dos maiores, junto com Irving Penn e Richard Avedon. Watson acredita que a fotografia “está se tornando vaga”. Ele estuda minuciosamente as pessoas que se colocam diante das câmeras para conhecer sua história.

O designer Alexander Wang trabalha pela segunda vez com Watson, agora diante da objetiva. Quando foi convidado para participar do projeto, pensou que Watson queria que vestisse as modelos. “Depois pensei que queria me fotografar vestido de mulher”, reconheceu. O taiwanês é o primeiro designer que aparece no calendário. O resultado final, avalia, “é muito especial. Tem um incrível senso do detalhe”.

O momento, acrescenta, para fazer algo assim também é muito oportuno. Ele aponta para o fato de que a Pirelli decidiu se distanciar, talvez deliberadamente, dos nus que deram fama ao calendário. “Tomar essa direção diz muito sobre para onde a cultura está indo”, explica Wang, “ao introduzir uma história, um contexto no calendário, vai além de mostrar mulheres bonitas. Não se limita a fazer uma foto”.

Gigi Hadid diante de seu espelho

O encontro aconteceu no fim da sessão de fotografia com Albert Watson, no bairro de Upper East Side, em Nova York. Gigi Hadid apareceu descalça, usando um longo suéter bege escuro a modo de roupão, sem maquiagem e com os cabelos presos. “Eu me identifico claramente com o personagem”, diz com sinceridade. “Viajo muito, estou cercada por muita gente e com muitas coisas para fazer”, continua, “mas quando chego ao hotel estou sozinha, em um lugar desconhecido e a diferença de horário impede telefonar para os amigos”. A conversa revela sentimentos conflitantes. Como o personagem que interpreta no calendário Pirelli, ela vem de uma família e de uma vida muito privilegiada. Poderia ter se dedicado a qualquer coisa. Mas conta que se apaixonou pelo mundo da moda justamente por causa da fotografia. “Cresci vendo imagens”, lembra, “entendo a composição das fotos, minha mãe me ensinou. E agora tenho os professores no trabalho”. Sua mãe também a preparou mentalmente para essa vida e ensinou a se organizar. Hadid reconhece o papel desempenhado pelo calendário Pirelli para empoderar as mulheres. “Elas são mostradas com um caráter muito forte”, explica. O interessante sobre a composição feita por Watson, acrescenta, é que reflete “as dificuldades que elas enfrentam para ter sucesso na vida. Isso também é empoderamento”, argumenta Hadid. “Inclusive quando as coisas parecem bonitas, sempre há algo escuro e aí você pode encontrar forças para lutar pelo que merece.”

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