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Vulcão na Guatemala volta a entrar em atividade e obriga novas evacuações

Novas explosões acrescentam medo e tensão às buscas. Grupos de resgate lutam contra o relógio e as altas temperaturas para encontrar mais sobreviventes

Jacobo García
Grupos de resgate buscam vítimas em San Miguel Os Lotes, em Escuintla.
Grupos de resgate buscam vítimas em San Miguel Os Lotes, em Escuintla.JOHAN ORDONEZ (AFP)
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O vulcão de Fogo, na Guatemala, voltou a entrar em atividade na tarde desta terça-feira. As zonas em que o resgate trabalhava precisaram ser evacuadas e vilarejos como Escuintla se transformou em um caos, onde pessoas fugiam. Até domingo, a zona zero do vulcão era um horto: verde, frondoso e fértil, onde eram cultivados cana de açúcar e café. Até mesmo o surrealismo florescia nas encostas do vulcão, onde coexistiam um campo de golfe e uma das áreas mais pobres do país.

Todo esse jardim natural: campo de golfe, pontes, cultivos e quatro aldeias desapareceram às três da tarde de domingo no exato momento em que Juan Francisco cortava lenha, Olga conversava com o pai deitada na rede e Domingo saía da igreja. Junto com eles, milhares de camponeses saíram correndo com as roupa do corpo enquanto uma língua incandescente os perseguia na fuga. Até agora foram encontrados 69 corpos, centenas de pessoas foram atendidas e quase 2.000 dormem em abrigos depois de terem sido evacuadas, algumas delas à força.

No momento em que milhares de camponeses descansavam à sombra, o Vulcão de Fogo, de 3.763 metros de altura, deixou sua letargia e entrou em erupção com uma explosão brutal que lançou três rios de fogo pela encosta e converteu simultaneamente o solo e o céu em armadilhas mortais. Segundo especialistas, o Vulcão de Fogo entrou em erupção na categoria 4, de acordo com o índice explosivo vulcânico (VEI na sigla em inglês). Em 1974 e em 2012 foram erupções de categoria 2, mas está última dobrou sua força. O aumento de uma categoria é equivalente a 10 vezes mais energia liberada do que no grau anterior. Três novas emanações de gases ocorreram na manhã de terça-feira e acrescentaram mais medo ao medo. A fumaça que o vulcão expele lembra o risco de viver em um horto, onde o solo e o céu podem mudar em poucos minutos.

Sobre as cabeças dos camponeses tudo se tornou uma estranha nuvem cinzenta de pedras e pedras. Simultaneamente, o solo incandescente os impedia de andar e uma língua fervente de gás, lama, paus, rochas e animais mortos arrasava tudo. Do solo vinha um calor de mais de 700 graus centígrados que deixou feridas e bolhas em todos os que fugiram.

Dois dias depois, o horto é o marco zero do desastre, onde as máquinas trabalham contra o relógio para resgatar possíveis sobreviventes de alguma das aldeias onde a busca está concentrada. Toneladas de cinzas cobrem as casas, enquanto os socorristas devem se mover sobre pedras ou troncos que formam um caminho. Onde antes havia moradias de dois andares, agora só se veem telhados de zinco. Qualquer queda, um passo fora do lugar indicado ou um tropeço inesperado podem carbonizar os pés dos socorristas em poucos segundos.

As máquinas que chegam ao local vêm acompanhadas de um tanque que joga água nas rodas para impedir que derretam e os bombeiros tiveram que substituir dezenas de botas ao ver como se desintegravam por causa do calor do solo.

Os protocolos internacionais da Proteção Civil da Guatemala (Conred) indicam que até 72 horas depois da tragédia existe a possibilidade de encontrar pessoas com vida. Em uma luta contra o relógio, centenas de soldados, policiais e socorristas lutam contra o tempo, o calor e as más condições para respirar para encontrar as centenas de desaparecidos. A busca continua concentrada em quatro aldeias: El Rodeo, La Reina, Libertad e San Miguel Los Lotes, onde nem sequer se sabe quantas gente vivia, mas que poderiam rondar as 40.000 pessoas.

Em uma das casas enterradas de San Miguel, um soldado encontrou uma família. Estavam abraçados uns aos outros debaixo de uma montanha de cinzas. Protocolos à parte, muitos camponeses vagam pela zona em chamas à procura dos seus em meio ao desespero.

Às quatro da manhã, três moradores –Rudy Ramírez, Oscar Díaz e Edgar Martínez– conseguiram entrar em El Rodeo para levar algumas coisas que no dia anterior deixaram para trás ao escapar: uma máquina de costura, um saco de café, uma bicicleta, algumas galinhas e um pouco de grãos que tinham armazenado. “Pegamos tudo o que pudemos, o calor era horrível e quando olhei para trás a lava estava muito próxima”, recorda Oscar, de 67 anos, ainda com o susto estampado no rosto ao lembrar o ruído que faziam os botijões de gás quando explodiam às suas costas. Naquela hora, a silhueta ameaçadora e enfumaçada do vulcão começava a aparecer com os primeiros raios do sol.

Os vulcanologistas apontam que a montanha liberou 30 milhões de metros cúbicos de material vulcânico em menos de duas horas. Esses mesmos especialistas explicaram que a principal causa de morte não foram os rios de lava, mas os fluxos piroclásticos, uma mistura de gás vulcânico e material incandescente que pode atingir os 100 quilômetros por hora, destruindo tudo em sua passagem.

Deitada no chão do abrigo de Escuintla, Olga González, de 46 anos, lembra-se da fuga. “Meu pai e minha sobrinha ficaram lá. A pequena entrou para buscar o avô e não voltou. Se tivéssemos esperado por ela morreríamos, então começamos a correr”, diz ela apontando para os pés feridos pelas queimaduras. “Não deu tempo para nada, o rio de lava vinha para cima da gente e era preciso correr. Só pudemos correr e chorar, sem olhar para trás”, recorda. Ao lado dela, Domingo López, de 79 anos, se lembra –com os pés cheios de chagas e feridas e provocadas pelo calor– que se fechou em casa e aguentou ali até que o vapor d’água se tornou insuportável e alguém o resgatou por uma janela. “Que Deus tenha em sua glória todos aqueles que ficaram para trás”, proclama.

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