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Zuckerberg se explica ao Legislativo dos EUA: “Isso é uma corrida armamentista” com a Rússia

Um dia depois de ir ao Senado dar explicações sobre roubo de dados da Cambridge Analytica, fundador do Facebook presta contas à Câmara nesta quarta

Amanda Mars
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O fundador e presidente do Facebook, Mark Zuckerberg, prestou depoimento na terça-feira ao Congresso dos Estados Unidos pela primeira vez para dar explicações sobre o enorme vazamento de dados da Cambridge Analytica, um escândalo que se soma à divulgação de propaganda russa nas eleições de 2016. “Nós não fizemos o suficiente”, admitiu, “foi erro meu, e eu sinto muito”. Mas Zuckerberg também lançou uma advertência aos legisladores: “Tem gente na Rússia cujo trabalho é tentar explorar nossos sistemas. Isso é uma corrida armamentista”. Nesta quarta, 11 de abril, ele presta contas à Câmara dos Representantes dos EUA.

Até agora, o empresário nunca tinha comparecido ao Capitólio. A estrela de Silicon Valley, um bilionário acostumado a usar camisetas de manga curta, sempre delegou aos seus subordinados a tarefa de dar explicações aos legisladores, mas estes dias anda por Washington de terno, gravata e cara de circunstância.

Mark Zuckerbeg encontrou alguns legisladores duros, republicanos e democratas, que o questionaram sobre tudo o que aconteceu, bem como sobre a confiabilidade de suas explicações. E Zuckerberg deu uma nova dimensão à tarefa enfrentada pelas redes sociais e pela sociedade em geral: “A natureza desses ataques é que tem gente na Rússia cujo trabalho é tentar explorar nossos sistemas e outros sistemas da Internet, então isso é uma corrida armamentista, devemos investir em melhorar nisso”, encorajou.

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O fundador e CEO do Facebook vai à Câmara dos Representantes dos EUA prestar esclarecimentos após escândalo da Cambridge Analytica. Entenda: http://cort.as/-3peJ

Gepostet von EL PAÍS Brasil am Mittwoch, 11. April 2018

A imprensa norte-americana reuniu nos últimos dias as muitas desculpas que Zuckerberg deu em 14 anos de carreira, desde que inventou a rede em Harvard. Uma pergunta do republicano John Thune resumiu bem a inquietude geral na Câmara: “Depois de dez anos dizendo que poderiam ter feito melhor, o que há de diferente na desculpa de hoje?”, perguntou. Zuckerberg insistiu no aprendizado com os erros. “Não espero que nada do que diga aqui mude sua visão”, disse o empresário, mas “confio que as mudanças sejam vistas e valorizadas no futuro”.

“Foi erro meu, e eu sinto muito”

O motivo do depoimento desta terça-feira foi o caso da Cambridge Analytica, a empresa de consultoria que teve acesso aos dados de 87 milhões de usuários do Facebook sem que estes tivessem conhecimento. O butim de informações serviu para a equipe de Donald Trump segmentar os eleitores em sua corrida à Casa Branca e também foi explorado pelas plataformas partidárias do Brexit no Reino Unido. Além disso, segundo a própria empresa, os perfis da maioria de sua enorme comunidade de membros – cerca de 2,2 bilhões de pessoas – eram vulneráveis a ataques desse tipo.

“Não fizemos o suficiente”, para evitar um uso nocivo dos dados, admitiu Zuckerberg no início do depoimento, um mea-culpa que se estendeu “às notícias falsas, à interferência estrangeira nas eleições e aos discursos de ódio”. “Foi erro meu, e eu sinto muito”, insistiu.

Porque, embora o escândalo da Cambridge Analytica tenha provocado o depoimento desta terça-feira, o Facebook e outras grandes empresas de tecnologia, como o Twitter e o Google, estão no centro do debate em Washington há mais de um ano. As eleições presidenciais de novembro de 2016 colocaram sobre a mesa o uso perverso das redes sociais para divulgar informações falsas, fomentar a divisão e – no caso da trama russa – tentar favorecer a vitória eleitoral de Trump. Em outubro, o Facebook admitiu que a propaganda russa havia atingido 126 milhões de usuários entre janeiro de 2015 e agosto de 2017. Nesta terça-feira, Zuckerberg confirmou aos legisladores que a empresa está colaborando na investigação sobre a interferência do Kremlin que está sendo realizada pelo promotor especial, Robert S. Mueller.

Ações sobem depois do depoimento

O interrogatório, que começou por volta das 14h30 em Washington (15h30 hora de Brasília), prosseguia depois de 19h. Diante de suas explicações no Congresso dos EUA, que continuarão nesta quarta-feira em outra comissão, Zuckerberg recusou-se a ir ao Parlamento Britânico para dar explicações, algo que incomodou os legisladores do Reino Unido.

A empresa está imersa em uma grande crise de reputação. As ações caíram 14% na Bolsa nas últimas três semanas, a campanha #deletefacebook (em português, #deleteofacebook) tem grande repercussão – para além dos efeitos reais – e alguns analistas acreditam que a rede pode ser objeto de multas milionárias. Nesta terça-feira, no entanto, o depoimento de Zuckerberg convenceu os investidores e as ações do Facebook registraram a maior alta em um dia (4,5%) desde abril de 2016.

O jovem empresário transmitiu tranquilidade ao mercado ao enfatizar que não planeja mudanças em seu modelo de negócios, baseado em publicidade, para o qual a informação dos usuários é fundamental. Ele também enfatizou que a empresa está desenvolvendo novas ferramentas para identificar melhor as contas falsas e automatizadas para deletá-las. “Estamos experimentando uma ampla mudança filosófica na empresa”, disse em outro momento. Os temores de uma regulamentação mais rígida se dissiparam em Wall Street.

"Senhor Zuckerberg, quer nos dizer em qual hotel dormiu na noite passada?"

Durante todo o depoimento Mark Zuckerberg permaneceu muito sério, mas sereno, evitando responder de forma concreta a muitas perguntas dos legisladores que pediam números ou dados específicos. “Minha equipe responderá”, disse em muitas ocasiões. Quem mais o desconcertou foi o senador Dirk Durbin, democrata de Illinois, que subitamente perguntou: “Senhor Zuckerberg, se sentiria à vontade para nos dizer o nome do hotel onde ficou na noite passada?”. Depois de hesitar alguns segundos, o fundador do Facebook respondeu “aaah, não”. Durbin continuou: “Se o senhor trocou mensagens com alguém nos últimos dias, nos diria seus nomes?”. E Zuckerberg disse: “Não, senador, eu provavelmente preferiria não tornar isso público aqui”. “Provavelmente é disso que se trata hoje, do direito à privacidade, seus limites, e a quanto se renuncia na América moderna em nome de conectar as pessoas pelo mundo”, disse Durbin.

Quando a trama russa começou a ser divulgada, o fundador do Facebook minimizou o papel da rede social e das notícias falsas. “Acreditar que influenciou as eleições de alguma forma é uma ideia muito louca”, chegou a dizer, mas os números o fizeram mudar seu parecer. Os serviços de inteligência publicaram um relatório no qual consideravam como certo que o Kremlin havia tentado interferir nas eleições presidenciais e que a propaganda nas redes sociais era parte desse estratagema.

Além do mea-culpa, o Facebook começou a notificar os usuários afetados sobre o que aconteceu. Também anunciou a criação de uma comissão independente que investigará “os efeitos das redes sociais nas eleições e na democracia”. As medidas para evitar o roubo de dados, por mais complexas que pareçam, representam menos problemas do que aquilo que as redes sociais podem fazer para controlar o fluxo de propaganda ou de informações apócrifas, uma questão que entra em cheio na liberdade de expressão.

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