Os dilemas da estratégia do PT, que aposta em Lula como candidato ou cabo eleitoral
Pesquisa Datafolha mostra que ausência de ex-presidente aumenta brancos, nulos e indecisos
O cenário eleitoral de 2018 vai se tornando mais complexo e pulverizado e o eleitor reage a ele com alguma confusão e distanciamento. É o que emerge da pesquisa Datafolha divulgada nesta quarta-feira. Com a possível saída do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) da disputa de outubro, por conta da condenação por corrupção em segundo grau na semana passada, aumentou o número de pessoas que não pretendem votar - a cifra de não votantes alcançou um número recorde na série histórica do instituto. Sua ausência também não transfere, pelo menos por enquanto, voto para o ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, um dos petistas cotados para assumir a vaga do PT e a única alternativa do partido considerada no levantamento.
A pesquisa Datafolha foi realizada no fim do mês passado e é, portanto, a primeira a ser divulgada após a condenação no Tribunal Regional Federal 4 (TRF4) do ex-presidente por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Caso os recursos de Lula neste tribunal sejam rejeitados, ele pode se tornar inelegível pela Lei da Ficha Limpa e acabar preso antes da eleição. Apesar disso, ele é tratado oficialmente pelo Partido dos Trabalhadores como o único candidato da legenda, em uma estratégia arriscada para a sigla, que pode ficar sem um nome viável para a disputa em outubr
O partido, neste momento, parece confiar na grande possibilidade de transferência de votos de Lula. A pesquisa divulgada hoje demonstra que 27% dos entrevistados votariam com certeza em um candidato apoiado por ele (ainda que 53% dos entrevistados rejeitem essa opção). Em um apoiado por Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, apenas 11% apresentaram a mesma certeza. No Nordeste, o capital político de Lula é ainda mais transferível: 46% certamente votariam em alguém apoiado por ele; esta taxa também aumenta entre os que cursaram até o fundamental (40%) e entre os que ganham até dois salários mínimos (36%). Mas a transferência de voto teve uma ligeira queda em relação à pesquisa de novembro, tanto no dado global (29%), como entre os eleitores do Nordeste (49%), os que fizeram até o fundamental (45%) e os que ganham até dois salários mínimos (39%), o que pode significar um sinal de alerta para a sigla. "Uma fatia de 27% votaria com certeza em alguém apoiado pelo petista, percentual suficiente, neste momento, para levar uma candidatura ao segundo turno da eleição presidencial, já que supera o obtido por outros candidatos nos cenários testados em que o nome do petista é excluído da lista de candidatos. Há ainda 17% talvez votassem em um candidato que tivesse o apoio de Lula", escreveu o Datafolha.
Múltiplos cenários e Huck
A pesquisa ofereceu aos entrevistados nove cenários possíveis para a disputa eleitoral, com variações de candidatos concorrentes, o que já demonstra a confusão de opções cerca de seis meses antes do início da propaganda eleitoral, que só começa em 16 de agosto e é tradicionalmente um fator decisivo na disputa. No cenário que, neste momento, se parece mais próximo do real —com candidatos mais certos como Jair Bolsonaro, Marina Silva, Geraldo Alckmin, Ciro Gomes, Manuela D'Ávilla, Fernando Collor de Mello e Álvaro Dias; e outros ainda sob especulação, como Luciano Huck, Henrique Meirelles e Guilherme Boulos— os que declaram que pretendem votar em branco, anular ou estão indecisos aumenta dez pontos percentuais sem Lula.
Com esse time de candidatos e Lula, 14% dos entrevistados devem anular, votar em branco ou não escolher ninguém. Com o mesmo time e Wagner no lugar do ex-presidente, o número sobre para 24%, ultrapassando, inclusive, as intenções de voto em Bolsonaro, que ganha a liderança na ausência do ex-presidente e arremataria 18% dos eleitores. Wagner teria 2% dos votos, desempenho tão fraco como o de outros candidatos da esquerda que poderiam se tornar alternativa a Lula: Manuela teria 2% sem Lula e 1% com; Boulos seguiria com 0% nos dois casos. Marina Silva é a que mais ampliaria sua margem de eleitores com a saída do petista: iria de 8% para 13%. E Ciro subiria de 6% para 10%. Em um cenários sem Lula, Marina e Huck, o número dos que votam em branco, nulo e em nenhuma das opções chega a 32%, o maior dentre todos os pesquisados.
O aumento de brancos e nulos na ausência de Lula e a falta de transferência de votos do ex-presidente para Wagner pode ser o resultado de uma conduta de protesto: parte dos eleitores do PT avalia que o impedimento do ex-presidente de disputar as eleições invalidaria o processo eleitoral. E, por isso, prefere se abster. É um posicionamento estimulado, ainda que indiretamente, pelo próprio partido, que adotou como lema o "eleições sem Lula é fraude" e se recusa a apresentar um nome como plano B, argumentando que isso seria fazer a vontade dos que querem que o ex-presidente não dispute o pleito.
Diante da insistência em manter Lula como candidato, nomes que poderiam substituí-lo em outubro não estão sendo trabalhados. É o caso do próprio Wagner, que já tem pouca projeção nacional e é mais conhecido no Nordeste —nesta região, o número dos que pretendem votar nele, numa disputa sem Lula, varia de 4% a 6%, a depender dos concorrentes; no país em geral ele tem 2% e, no Sudeste, entre 0% e 1%. E também de Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo e outra das possíveis alternativas petistas: ele tem pouca projeção nacional, apesar de sua importância como coordenador do programa de campanha do PT para as próximas eleições presidenciais. O nome de Haddad não apareceu como opção a Lula neste novo Datafolha (é possível que ele seja, no momento, mais cotado para a disputa ao Governo de São Paulo), mas no levantamento anterior, feito no final de novembro, ele aparecia com 3% das intenções de voto, número que se elevava para até 5% no Sudeste, a depender do cenário de candidatos na disputa, mas que caía para até 1% no Sul e para 2% no Nordeste.
A falta de projeção nacional dos dois nomes poderia ser uma vantagem, já que ela garante uma baixa rejeição. Enquanto os entrevistados que afirmam não votar de forma alguma em Lula chegam a 40% e em Jair Bolsonaro a 29%, apenas 15% rejeitam Jaques Wagner. E os que rejeitavam Haddad em novembro eram 22%. Candidatos com menos rejeição podem ter mais chances de crescer se fizerem uma boa campanha, como aconteceu com o atual prefeito de São Paulo, João Doria, há dois anos. O problema é que, em um cenário em que a campanha deve ser dominada por Lula até onde a Justiça permitir, sobram poucos espaços de propaganda para qualquer um dos nomes petistas.
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