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‘Lava Jato’ sindical na Argentina

Uma série de prisões por suposta corrupção golpeia renomados caudilhos do sindicalismo

Federico Rivas Molina
Marcelo Balcedo foi detido em sua casa em Punta del Este
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Marcelo Balcedo, líder de um sindicato de auxiliares de escolas, escondia em sua mansão em Punta del Este 14 carros esportivos, meio milhão de dólares, armas de guerra e até um zoológico. Humberto Monteros, líder dos trabalhadores da construção civil em Bahía Blanca, Buenos Aires, caiu com quase 300.000 dólares junto com uma dúzia de dirigentes. Outras prisões igualmente impactantes foram as de Omar Caballo Suárez, um intocável que estava há quase 30 anos à frente dos empregados de portos, e Juan Pablo Pata Medina, veterano sindicalista que resistiu à prisão entrincheirado na sede de seu sindicato, em La Plata. É possível que a lista aumente com alguns novos nomes, mas estes são suficientes para que a Argentina viva um fenômeno judicial inédito contra os líderes da estrutura sindical argentina, a mais poderosa da América Latina.

A captura de líderes sindicais acusados de corrupção não tem antecedentes históricos na Argentina. O Governo assegura que não está por trás dos processos judiciais e muito menos das prisões. “Não temos uma atitude de perseguição. Atuamos quando a Justiça pede nossa intervenção porque somos responsáveis e fazemos o que a lei estabelece. Não há nenhuma vontade de ir atrás deste ou daquele, como não há essa vontade na órbita política ou judicial”, disse o ministro do Trabalho Jorge Triaca. O argumento oficial não convenceu todo mundo e colocou de sobreaviso alguns líderes sindicais, mesmo entre os considerados favoráveis ao diálogo pelo Governo de Mauricio Macri.

Um deles, Luis Barrionuevo, do sindicato de trabalhadores gastronômicos, advertiu sem meias palavras que o fim antecipado é o destino que pode esperar qualquer presidente que se atreva a enfrentá-los. “Não pisem no rabo do leão”, ameaçou; e caso não tivesse ficado claro, deu nomes: “Os sindicatos foram atacados pelos militares, por [Raúl] Alfonsín (1983-1989) e [Fernando] De la Rúa (1999-2001) e não terminaram seus mandatos”. O Governo recebeu a mensagem. “Os condicionamentos de Barrionuevo não tiveram nenhum impacto”, respondeu Triaca. Mas o problema existe, escondido sob as palavras.

O poder sindical é enorme na Argentina e Macri soube disso desde o primeiro dia. Assim que assumiu em dezembro de 2015 selou uma trégua com eles em troca do cancelamento de uma dívida milionária que o governo mantinha com as coberturas médicas dos sindicatos. Foram 2 bilhões de dólares que terminaram no sistema de saúde que os sindicatos oferecem aos seus membros, uma das bases de sua popularidade. A trégua teve altos e baixos de acordo com as disputas internas na Confederação Geral do Trabalho (CGT) que, por falta de um acordo, é dirigida por um triunvirato. A disputa também é marcada pela necessidade do Governo de aprovar no Congresso uma reforma trabalhista para reduzir “o custo argentino”, como os empresários gostam de chamar o quanto custa cada trabalhador registrado.

A CGT impulsionou até agora duas greves gerais contra Macri, pouco para um país como a Argentina, em meio à tensão que separa os “falcões” das “pombas”. A linha vermelha, atrás da qual parecem estar todos, é a reforma trabalhista. Os líderes da CGT advertiram que se a intenção de Macri é uma lei “à brasileira”, não vai passar. O projeto de lei está congelado no Congresso por falta de apoio do peronismo e sem dúvida será a principal batalha legislativa de Macri em 2018.

Neste cenário avança a Lava Jato e Macri sabe que ganha mais do que perde. “O Governo tem três pernas que lhe dão identidade: a obra pública, a luta contra a inflação e, a mais complexa, a luta contra as máfias. O macrismo se mostra como um Governo que combate as máfias da polícia, da política e, agora, dos sindicatos. Como tem que mostrar o tempo todo que está lutando, encontra inimigos sem voto. Quem é contrário a combater os sindicalistas corruptos? Os sindicatos são uma das instituições com pior imagem há mais de 20 anos”, diz Juan Germano, diretor da consultora Isonomia. O marco das prisões não pode ser melhor. “O sindicalista cai com um Lamborghini, são todas imagens muito fortes e isso ajuda o Governo. Desse lugar, é fácil explicar por que atacam os sindicatos”, explica Germano.

Balcedo, Medina, Suárez, Monteros são todos sobrenomes conhecidos, mas ainda estão longe de serem os figurões do sindicalismo. No topo da lista está Hugo Moyano, ex-líder da CGT como representante dos caminhoneiros, um sindicato poderoso que agora é liderado por seu filho Pablo. Está avançando um processo judicial contra Moyano pelo suposto uso de dinheiro sujo de seu sindicato em sociedade com o clube Independiente, do qual ele agora é presidente. Em uma entrevista recente com o EL PAÍS, Pablo Moyano disse que seu pai “está sendo observado muito de perto desde o Governo de Menem e se tivesse algo, já estaria preso”. Para o herdeiro, “alguns rapazes fizeram umas burradas”, mas não entre os Moyano.

A lógica da maçã podre é repetida na CGT. Um dos membros do triunvirato, Juan Carlos Schmid, disse ao EL PAÍS que os detidos “são uma vergonha para o movimento”, mas opinou que “algumas gotas sujas não sujam todo o oceano”. “Há milhares de secretários-gerais, milhares de comissões internas, de delegados. O exemplo de quatro ou cinco não é todo o universo sindical”, disse. O avanço oficial é judicial, mas suas consequências são políticas. Além da lei de reforma trabalhista, o Governo tem pela frente a discussão anual de aumentos salariais, em um país que fechou 2017 com quase 25% de inflação e espera diminuí-la para 15% em 2018. A grande questão é até onde Macri terá espaço para pisar na cauda do leão.

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