A tensão social renasce no berço da Primavera Árabe
Governo da Tunísia anuncia um pacote social para aplacar o mal-estar pelo aumento de preços
Depois de uma longa jornada de reuniões com partidos e agentes sociais, o Governo da Tunísia anunciou na noite de sábado, 13 de janeiro, um aumento no auxílio às famílias mais necessitadas com o objetivo de apaziguar as tensões sociais que sacudiram o país magrebino durante a última semana, e que tiveram como resultado uma vítima fatal e mais de 800 pessoas presas. A atual crise política coincidiu com o sétimo aniversário da queda do regime de Ben Ali, que milhares de pessoas comemoraram na avenida Bourguiba, no centro da capital do país, cenário ao mesmo tempo de atos festivos e marchas reivindicatórias. A Tunísia foi o país onde estourou em 2010 a Primavera Árabe, que se espalhou depois por vários países muçulmanos. Aqueles protestos acabaram com a ditadura de Ben Ali, um dos poucos trunfos que a onda de revoltas na região conseguiu.
Segundo informou em uma entrevista coletiva o ministro de Assuntos Sociais,Mohamed Trabelsi, a ajuda mensal às famílias passará de 150 dinares (cerca de 200 reais) para um máximo de 210 dinares (280 reais), em função do tamanho da unidade familiar. Calcula-se que o custo total da medida será próximo aos 70 milhões de dinares (mais de 90 milhões de reais) e que 120.000 famílias se beneficiarão delas. Além disso, o Governo se comprometeu a avalizar cerca de 500.000 famílias de baixa renda ou instáveis para que possam receber um empréstimo hipotecário e ter acesso a moradia digna.
Com essas medidas, o Governo espera colocar fim à onda de protestos iniciada na segunda-feira passada, dia 8, que combinaram manifestações pacíficas diurnas com distúrbios noturnos em vinte cidades do país. No entanto, inclusive antes de se conhecer o pacote de ajuda social, os protestos violentos já tinham amainado, talvez como resultado da ampla campanha de prisões lançada pelas autoridades.
Até o momento, a plataforma Fesh nastanneu? (“A que esperamos?”), que convocou as mobilizações, ofereceu ainda uma reação oficial à proposta governamental. O objetivo principal da plataforma é a retirada da Lei Orçamentária de 2018, ao considerar que agrava o encarecimento dos preços de produtos básicos devido a uma alta da pressão fiscal.
Um dia de festa e reivindicações
Como acontece sempre em 14 de janeiro, a avenida Bourguiba se transformou no centro nevrálgico das atividades relacionadas à comemoração da queda do regime do ditador Ben Ali. Desde a primeira hora da manhã, foram desfilando por suas ruas todo tipo de organizações vinculadas à revolução: sindicatos, partidos políticos, associações de vítimas etc. Houve inclusive uma concentração de torcedores de um dos times de futebol mais populares da capital, que acenderam rojões, provocando a chegada de um esquadrão de agentes antiprotestos. No entanto, o dia transcorreu em total normalidade e sem tentativas de enfrentamentos ou violência.
A plataforma de Ennahda, o partido islâmico que forma, com o Nidá Tunis, um Governo de “grande coalizão”, foi a mais concorrida. De seu palanque, a música se alternava com discursos políticos, sempre com um tom positivo para destacar os resultados obtidos pela revolução. De sua parte, a progressista Frente Popular, sempre contrária à Ennahda, congregou centenas de pessoas em uma manifestação de caráter reivindicativo. Os participantes se apropriaram do slogan popularizado pelo Fesh nastanneu? na última semana: “O povo quer a queda do Orçamento”.
O partido islâmico radical Hizbu Tahrir, que defende a criação de um califado universal, também quis marcar presença, apesar de seu palanque se localizar fora da avenida Bourguiba, afastado dos demais. Uma metáfora de sua condição de outsider do sistema político tunisiano. Curiosamente, dos principais partidos políticos do país, o único que brilhou por sua ausência é o que acumula mais poder institucional, Nidá Tunis, a força à qual pertencem o presidente Beji Caïd Essebsi e o primeiro-ministro Yusuf Chahed.
Em uma rua paralela à avenida Bourguiba, e na frente da sede do poderoso sindicato UGTT, vinte universitários formados estão acampados ao ar livre para pedir ao Estado que lhes dê trabalho. Estão há dois meses suportando as inclemências do inverno tunisiano. “Hoje deveria ser um dia de festa, mas não é. Não estamos felizes. A revolução nos trouxe liberdade de expressão, mas outras demandas muito importantes como o direito ao trabalho, à saúde... ainda não foram atendidas”, lamenta Essam Barkawy, originário de Kaserine, a província na qual mais pessoas perderam a vida durante a revolta de 2011.
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