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Coluna
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Temer está saindo do coma?

Pequena melhora na popularidade do presidente e aproximação com TV Globo podem ser bom sinal para o peemedebista em 2018

Juan Arias
Temer durante café com jornalistas.
Temer durante café com jornalistas. EVARISTO SA (AFP)
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Os médicos dizem que, às vezes, só é necessário um pequeno sinal para intuir que uma pessoa começa a sair de um coma profundo. Será o que está acontecendo com o presidente Michel Temer, pois em apenas uma semana apareceram várias razões que indicariam que o político com menor índice de popularidade da história começa a deixar para trás seu inferno astral?

Alguns fatos poderiam indicar que o clima de rejeição de Temer começa a diminuir. O primeiro foi a última pesquisa do Ibope no qual, em vez de continuar despencando, os índices mostram uma pequena melhora. Cerca de 3% deixaram de rejeitá-lo, aumentando em três pontos percentuais os que o aprovam. Com os índices de desaprovação extremos sofridos até ontem, o fato de que, de repente, podem ter aumentado em seis milhões de pessoas os que consideram seu desempenho bom, não deixa de ser significativo.

Uma charge humorística chegou a apresentar uma desaprovação de 105% do presidente afirmando que não só todos os vivos, mas também até os mortos estavam começando a rejeitá-lo. Frente a isso, o novo Ibope deve ter reanimado um pouco o demônio Temer.

Mas há mais. Acaba de ser revelado pelo jornal Folha de S. Paulo, que no início de outubro, a alta hierarquia do império Globo pediu e conseguiu, na residência de um dos irmãos Marinho, um almoço com o presidente Temer que parece um desejo de reconciliação com ele, depois que a Globo tinha colocado todo seu peso a favor de sua destituição por causa das acusações de corrupção e depois de ter pedido em um editorial sua renúncia para o bem do Brasil.

Sabe-se agora que naquele almoço Temer foi claro e duro com os líderes da Globo, alegando que tinham se precipitado ao condená-lo antes de ter provas concretas contra ele. Segundo a Folha, Temer lembrou, com uma certa ironia que não é suficiente uma delação para considerar alguém culpado e trouxe à tona a questão espinhosa do delator Alejandro Buzasco que acaba de acusar a TV Globo de pagar suborno pela transmissão de campeonatos de futebol e que a empresa rejeita com violência como falsa.

Talvez os dirigentes da Globo não foram capazes de intuir a capacidade de resistência aos golpes do político veterano que, contra todos os prognósticos, conseguiu ficar no cargo sem sofrer um impeachment pelo Congresso, nem ser forçado a deixar o cargo, apesar sua popularidade em frangalhos.

Do escárnio sobre a presidência Temer, alguns especialistas em análise política começam inclusive a considerar a possibilidade de que possa ser reeleito no próximo ano, apoiado pelos principais partidos. Ou no mínimo, se a justiça impedir Lula de competir, Temer poderia influenciar seriamente a escolha de um sucessor que não apareça seriamente comprometido com a Operação Lava Jato e que signifique uma alternativa, do centro, ao conjunto da esquerda que ficaria órfã sem Lula.

Tudo isso leva a pensar por que os pobres não saíram às ruas gritando “Fora Temer”. Nem por que esses pobres tampouco saíram para defender Dilma contra o impeachment. Hoje parece cada vez mais claro, por exemplo, que Dilma nunca teria sido deposta de seu cargo naquele momento se a inflação não tivesse estado pelas nuvens em dois dígitos, o desemprego superando os 14 milhões e o país mergulhado em uma das maiores recessões econômicas em muitos anos.

Com Temer, se os pobres não saíram nas ruas nem mesmo sob a forte pressão da mídia contra seu governo, é porque hoje, para eles, o que conta é que a economia começou a melhorar. Os institutos de pesquisa gastam às vezes milhões para saber qual a inclinação das pessoas nas ruas. No caso de Temer seria suficiente ir a um desses supermercados que fazem ofertas para as famílias de classe C e conversar com elas para saber o que pensam.

Este jornalista quis fazer um pequeno teste em um desses mercados em uma cidade pequena do interior. Uma trabalhadora que estava colocando suas compras em um carrinho carregava a lista que servia para comprar o essencial para o mês. Pela caligrafia dava para ver que tinha estudado apenas os primeiros anos da escola primária. Perguntei o que pensava de Temer e do governo. Rápida, me respondeu: “Senhor jornalista, não estou interessada nem no Temer nem na Dilma. A única coisa importante para mim e minha família é quanto custa comprar esta lista do mês”. E acrescentou: “Veja, com Dilma cheguei a pagar até 600 reais. Hoje só preciso de 400 e até posso voltar a comprar um pouco de carne e alguns iogurtes que meu marido gosta”, e me mostrou o que já tinha no carrinho.

Estou defendendo Temer e seu governo? Não, seria um inconsequente. O que tampouco quero é que a sombra da ideologia ou do preconceito, nos impeça de ver e analisar a realidade com a naturalidade com que fazem esses “pobres”, que incluem, de acordo com um relatório de ontem do IBGE, quase 12 milhões de analfabetos totais cuja existência parece interessar tanto à maioria dos políticos como reserva eleitoral, mais do que preocupação com seus problemas. Será que os institutos de pesquisa os incluem em suas pesquisas?

Até penso por que não abolir a palavra “pobre” e substituir simplesmente por “pessoas” já que a política acabou com a força original da palavra e continua a ser manipulada e explorada por populistas tanto de esquerda quanto de direita. “O que seria dos políticos e partidos sem esses milhões de pobres, já que estão apenas interessados em que não saiam de seu quintal, jogando para eles eletrodomésticos como se fosse ração, para mantê-los felizes?”, escreveu duro no Facebook um jovem ativista progressista. Em seu post, ele se lembrava de uma autocrítica séria de Frei Beto, que foi ministro de Lula e continua a militar no PT, dizendo: “Enchemos os pobres de objetos, mas não demos cultura”.

Quando esses pobres se rebelam, perguntamos confusos, o que mais eles querem?

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