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Medo da independência e de boicote provoca enorme fuga de empresas de Catalunha

Companhias paralisam investimentos pelo temor de uma declaração secessionista de líder catalão

Lluís Pellicer
Cavas Freixenet, em Sant Sadurní d'Anoia
Cavas Freixenet, em Sant Sadurní d'AnoiaSusanna Saéz (EFE)

A ameaça de que o líder da Catalunha, Carles Puigdemont, declare de forma unilateral a independência na semana que vem acelerou a fuga de empresas da região. Em dois dias, a Catalunha perdeu a sede social de seus dois maiores bancos, CaixaBank e Sabadell, e de empresas com ações em Bolsa como Gas Natural, Service Point e Agbar. Além disso, várias companhias anunciaram que estão estudando seguir esse mesmo caminho, como Freixenet e Codorniu. Escritórios de advocacia e consultoria afirmam que as mudanças de endereço continuarão, e lamentam que os investimentos tenha sido paralisados.

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Ainda é cedo para quantificar quantas empresas decidiram transferir suas sedes, mas os escritórios de advocacia e consultoria contabilizam dezenas. E, ainda assim, explica um deles, são “uma pequena parte” em comparação com as que foram pedir informações jurídicas ou sobre os impactos de uma eventual declaração independentista. Apesar de os advogados responderem que essa proclamação não teria qualquer efeito, muitas companhias decidem partir. Por medo de perder investidores e financiamento internacional básico para seu funcionamento, ou de sofrer um boicote a seus produtos e ficar em um limbo legal.

As empresas com ações em Bolsa foram as primeiras a ativar os planos de contingência que, segundo fontes do mercado, foram preparados depois da aprovação das leis do referendo e de ruptura no Parlamento catalão. Além dos dois grandes bancos, também irão transferir suas sedes a Gas Natural, a biotecnológica Oryzon, a companhia de telecomunicações Eurona, a têxtil Dogi, a empresa de impressão e gestão de documentos Service Point e a Agbar, responsável pela gestão de águas de Barcelona. Em agosto, a Catalunha já havia perdido a Naturhouse. Sete empresas que, no total, estão avaliadas em mais de 52,6 bilhões de euros.

Medo de boicote

A partida dos bancos está arrastando, segundo fontes do setor, outras entidades menores, gestoras de ativos e companhias de seguros. Na sexta-feira, anunciaram sua partida o Banco Mediolanum e a Arquia Banca, antiga Caja de Arquitectos. A seguradora Catalana Ocidente, por sua vez, continua estudando as possibilidades. Em todos os casos as empresas alegam proteção de clientes ante a ameaça de ficarem foram do sistema europeu e do guarda-chuva do Banco Central Europeu.

Segundo escritórios de advocacia consultados, entre as empresas que pretendem se mudar de endereço social estão principalmente companhias de consumo que temem um boicote a seus produtos. As duas principais empresas produtoras do cava, Freixenet e Codorniu, estão analisando essa possibilidade. Não em vão, o setor ainda não se recuperou da queda de vendas provocada por um boicote a seus produtos em consequência do debate sobre o Estatuto em 2006. “Vamos esperar. Até agora acreditava que a independência não ocorreria, mas começo a achar que estava equivocado. E, se for assim, teremos que agir como muitos”, afirmou o presidente da Freixenet, José Luis Bonet, que também dirige a Câmara de Comércio da Espanha.

Para enfrentar a possível queda de vendas no restante da Espanha, fontes empresariais explicam que muitas empresas estão criando filiais em outras regiões para registrar seus produtos fora da Catalunha. “Abrem uma filial ou levem sua sede social para Madri porque seus clientes não querem comprar artigos catalães”, diz um advogado.

Sobre o boicote, especificamente, falou o secretário de Empresas da Catalunha, Santi Vila, que defendeu adiar a declaração unilateral de independência. Ao contrário do vice-líder da Catalunha e secretário de Economia, Oriol Junqueras, que minimizou a saída dos bancos ao considerar que era “temporária”, Vila decidiu criar um comitê de crise para atender as empresas. “O que poderia gerar uma dinâmica prejudicial para a economia é entrar em uma espiral de boicotes, de movimentos estranhos, que alterem o bom funcionamento da atividade econômica”, afirmou o secretário em uma entrevista à Rac1.

O governo catalão também tem como missão tranquilizar as multinacionais, cujos centros de decisão em outros países estão cogitando mover suas filiais na Catalunha. Muitas por enquanto decidiram não fazer qualquer mudança, mas acompanham de perto os passos do Governo catalão. Por exemplo, a rede de supermercados Lidl e a montadora Seat, ambas com matriz na Alemanha, não preveem realizar qualquer transferência, mas desde que o marco legal e o entorno permaneçam estáveis.

Apesar do chamado à tranquilidade de Vila, a partida de empresas continuou na sexta-feira. E isso que, em muitos casos, estão saindo em silêncio, de forma que a verdadeira magnitude só será vista em algumas semanas, quando aparecerem as mudanças nos registros empresariais.

A Proclinic se uniu a outra empresa de material clínico, Klockner, enquanto a Ballenoil, grupo de postos de gasolina, mudou seu domicílio social para Alcobendas (Madrid). A imobiliária Renta Corporación cogita essa possibilidade, mas ainda não tomou uma decisão. A inquietude chegou ao coração da principal organização patronal da Catalunha, Fomento do Trabalho. Seu presidente, Joaquim Gay de Montellà, convocou o comitê executivo para uma reunião extraordinária na segunda-feira para avaliar a situação.

A transferência da sede social não necessariamente implica também na mudança do domicílio fiscal, mas fontes consultadas disseram que muitas empresas mudaram ambos, dado ao melhor regime tributário oferecido por outros governos regionais, como o de Madri.

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