Confissões de Chris Hemsworth: Elsa, seus filhos e o “ridículo” traje de Thor
O ator, o único super-herói cuja arma é uma ferramenta de bricolagem, é um sujeito com muito senso de humor e mais sensatez do que a que cabe nas roupas
Para entender por que Chris Hemsworth se tornou um dos caras mais desejados do planeta é melhor não ficar obcecado com suas (certamente excessivas) medidas. Basta deixar de lado a fita métrica e pôr no YouTube alguns de seus esquetes no programa Saturday Night Life para concluir que talvez o músculo que melhor funciona para esse australiano de 33 anos é o da risada. Poucos sabem se parodiar tão bem como o marido da espanhola Elsa Pataky (1976, Madri) quando zomba do próprio sucesso ou de sua condição de maciço estereotipado. Acontece que o astro de ação, célebre encarnação de Thor, o herói mais louro do universo Marvel, é um comediante nato.
Hemsworth, nova imagem do perfume Boss Bottle da Hugo Boss, nos recebe bronzeado em outro dia sem sol em Metzingen, localidade ao sul da Alemanha onde se encontra o edifício central da empresa alemã, criado pelo estúdio de arquitetos Riehle&Partner. Nele, tudo, dos espaços de trabalho aos de descanso, responde a essa precisão germânica da qual a empresa se vangloria. O ator é acompanhado por sua agente, uma mulher madura e atraente, com o rito e o uniforme (preto e caro) que a função de para-raios de celebridades parece exigir. É reconfortante observar como o ator a trata (na realidade, a ela e a todos que o cercam) com esses modos nada forçados que distinguem uma boa educação. Bonachão, também, mas na medida certa.
"Comecei a trabalhar como ator para pagar a casa da família. No dia em que enfim liquidamos todas as dívidas tive que encontrar uma verdadeira razão para fazer o que fazia, e isso me assustou.”
Nasceu em 1983 em Melbourne e foi criado em “uma comunidade aborígene”. “Lembro-me de andar sem sapatos, cercado de búfalos e crocodilos”, diz. Irmão dos também atores Luke e Liam Hemsworth, o intérprete iniciou a carreira com 18 anos na popular série australiana Home and Away, uma interminável fábrica de estrelas locais que nasceu no final dos anos oitenta, e pela qual circularam, entre outros, Naomi Watts, Heath Ledger, Simon Baker, Guy Pearce, Isla Fisher e Dannii Minogue. O passo natural para todo ator que triunfa no outro lado do planeta é viajar para Los Angeles, e foi assim que Hemsworth saltou com apenas 25 anos para o duro ringue de Hollywood. Não foi simples. Grande demais, alto demais e fortão demais para a maioria dos papéis, talvez aquela experiência tenha sido um banho de humildade que, em longo prazo, se tornou positiva. Se alguém escreve seu nome no Google, além de Elsa Pataky, família e músculos, uma outra palavra mais repetida é precisamente essa: humildade. Acerta o onipresente buscador. No plano curto chama a atenção a absoluta falta de pretensões, a boa disposição, o sorriso afável e, sim, que Chris Hemsworth é desses atores que não seguem a regra e seu físico ganha, e muito, pessoalmente.
Finalmente, em 2010 e graças ao primeiro Thor, sua sorte mudou para se transformar em um dos atores mais bem pagos de Hollywood. A partir daí, e no ritmo da saga da Marvel, tudo em sua vida cresce sem parar. No entanto, ele se mostra um homem apegado à realidade, com uma recordação idílica da infância. Mas nem tanto da adolescência. “Quando criança aprendi muito sobre a terra, a natureza e a cultura aborígene, de suas danças e tradições. Em minha casa fomos muito afortunados por aquela experiência, minhas melhores lembranças giram em torno daqueles anos”, conta. Aparece um sotaque fechado e uma nuca excessivamente queimada pelo sol. Sinais que delatam sua nova vida: “Sim, agora vivemos na Austrália”.
" "Para Elsa é importante que nossos filhos falem espanhol e conheçam também a sua cultura. Ela fala sempre com eles em seu idioma, apesar de eles lhe responderem em inglês”
O lugar escolhido é a paradisíaca Byron Bay, uma localidade de apenas 5.000 habitantes, pertencente ao Estado de Nova Gales do Sul, na costa do leste do país, e que nos guias turísticos se apresenta como “o lugar mais alegre do planeta...hippie, tranquilo e simples”.
“Quando tivemos filhos, Elsa e eu decidimos que seria nosso lar”, explica. “Não queríamos viver em uma cidade onde nunca pudéssemos nos desconectar do trabalho. Em Los Angeles tudo lembra o negócio. Tudo o que você vê e todas as pessoas com as quais fala te recordam o que você tem ou, pior ainda, o que você perdeu, e isso não nos parecia bom para nossos filhos. Na Austrália vivemos perto da praia, em contato com a natureza, até vão para a escola sem sapatos, passam o dia correndo sem roupa, crescem como crianças selvagens, e isso é algo maravilhoso para este momento de sua vida. Adoram viver assim e acho que foi uma decisão magnífica.”
Casou-se com Pataky em 2010. Têm três filhos: India Rose, Tristan e Sasha. O ator não oculta que seus valores se solidificaram em uma família –seu pai era professor e sua mãe, trabalhadora na área social–pressionada pela falta de dinheiro. “De meus pais e meus irmãos aprendi que o importante nesta vida é ser bom e generoso, também a ter compaixão pelos demais, e que tanto faz de onde você vem ou onde foi criado. A vida não é outra coisa que as decisões que você toma. Meus pais nos ensinaram a ser livres em nossas decisões. Crescemos sem nada de dinheiro e desde menino fui muito consciente do estresse que passavam em casa para pagar as contas todo mês. Lembro perfeitamente de lhes perguntar quando acabariam de pagar a casa e lembro também que me disseram que provavelmente nunca terminariam de fazer isso. Esse sentimento de frustração marcou muito a minha adolescência, mas, na verdade, também não sei por que tanto. Na realidade, essa foi a razão pela qual comecei a trabalhar como ator. Era uma forma fácil de ganhar dinheiro. No começo essa era minha única meta: pagar a casa, esquecer o banco. Foi muito estranho porque, no dia em que enfim liquidamos todas as dívidas, tive que encontrar um verdadeiro motivo para fazer o que fazi, e isso me assustou muito. Tinha de descobrir se queria atuar ou não. E aí foi minha grande sorte: eu gostava de verdade!”.
"Na primeira vez que coloquei o traje de Thor ficava pequeno em mim De verdade, estava muito ridículo. O certo é que durante um tempo me senti muito bobo”
Hemsworth cita mais de uma vez sua mulher, até se refere a ela para justificar que seu rosto se identifique agora com um perfume como o Boss Bottled. “Elsa gostava do aroma.” Da outra parte do planeta, ela responde por email quais são os traços que mais admira no marido: “Sua honestidade e seu senso de humor; sempre nos faz rir. Aprendo muitíssimo com ele, me impressiona sua capacidade de trabalho e de superar a si mesmo. Aprendi a ser mais paciente, menos impulsiva e mais racional, temos crescido muitíssimo juntos”. Seu caminho em comum, diz ele, se aproximará mais da Espanha no futuro. “Estive em Madri e Barcelona a trabalho, realmente foram dois ou três dias em que houve algo a mais. Antes vivíamos ao sabor de nossa profissão, mas desde que decidimos romper com isso e nos instalar na Austrália as coisas mudaram. Sei que para Elsa é importante que nossos filhos falem espanhol e conheçam também sua cultura. Ela sempre fala com eles no seu idioma, apesar de eles responderem em inglês. A verdade é que gostaríamos de passar mais tempo na Espanha, viajar com eles algumas vezes ao ano e passar pelo menos um mês juntos ali. Talvez assim também o meu espanhol melhore um pouco. Você sabe que Elsa fala quatro ou cinco idiomas? Não é insultuoso? Todo mundo diz que os australianos e os espanhóis se parecem, e acho que é verdade, somos muito apaixonados e sociáveis, gostamos da vida festeira, dos amigos, de sair, jantares, churrascos... Certamente por isso nos damos tão bem.”
À pergunta sobre quais são seus ídolos, suas referências, Hemsworth dá uma resposta desconcertante, digna de um dos protagonistas de Amargo Reencontro, bíblia cinéfila do surfe e o único filme que os praticantes da religião das ondas reconhecem como obra prima. Para Hemsworth, está claro: “Além de meus pais, Kelly Slater, 11 vezes campeão do mundo de surfe, é meu grande ídolo”, confessa. “Para mim era um deus por tudo o que fez e como fez. Sua determinação, como amava o esporte, como transmitia esse amor, me inspirou muitíssimo quando criança. Além do mais, com o passar dos anos acabei conhecendo-o e para mim foi algo muito emocionante porque meu ídolo juvenil é um grande cara, de quem ainda por cima eu gosto muito”, diz entre risos.
Uma vez comprovado que os heróis de Hemsworth são de carne e osso, ele lembra que lhe custou entrar na pele do mitológico Thor, cujo terceiro longa, Thor: Ragnarok, estreia no Brasil no dia 26 de outubro. Hemsworth retoma o papel do deus nórdico em um filme que conta com os atores Tom Hiddlestone, Cate Blanchett, Idris Elba, Benedict Cumberbatch, Anthony Hopkins e Mark Ruffalo, entre outros. A sinopse é mais ou menos a seguinte: o deus do trono da Marvel (Chris) terá de se ver com a fatal Hela (sua compatriota Blanchett), que no início destrói o todo-poderoso Mjölnir (o martelo de Thor). Então, a deusa da morte (outra vez Hela-Blanchett) invade Asgard e o derrotado filho de Odin (Thor) acaba no planeta Sakaar lutando como um gladiador ao lado de Hulk (Mark Ruffalo). Juntos, com a ajuda de Valquíria (Tessa Thompson) e Loki (Tom Hiddleston), terão de deter Hela. Parece um pouco floreado? A coisa funciona melhor em imagens, de acordo com o primeiro trailer do filme.
Curiosamente, o diretor de fotografia é o espanhol Javier Aguirresarobe, que durante seis meses conviveu com a equipe na Austrália, onde o longa foi rodado. Um filme, afirma o colaborador de diretores como Woody Allen, Pedro Almodóvar e Alejandro Amenábar, que não se parece em nada com o que tinha feito até agora e cujo resultado visual resume em duas palavras: “Uma barbaridade”. “Você é um instrumento a mais em uma cadeia, trabalha ombro a ombro com a equipe de efeitos visuais e cria uma atmosfera que no fundo você não sabe muito bem como vai ficar.” E no centro desse universo, os atores: “Chris já tem muita experiência e sabe lutar muito bem contra o nada”. Para o ator, Aguirresarobe só tem elogios: “É normal, muito natural. Um cara alegre e feliz. Sempre sorrindo. Muito humano. Ela e ele vivem nesse paraíso de Byron Bay e estar com eles é um prazer. É um cara sensacional, tranquilo. Transmite tudo com os olhos e o modo de olhar”. Segundo Aguirresarobe, tanto ele como Cate Blanchett o fazem pensar que os australianos “claramente não são de Hollywood, são outra coisa”. “É incrível o exercício físico e dramático de Cate Blanchett no filme. Levanta a perna como em um aurresku [dança basca]. Que mulher!”.
O senso de humor de Hemsworth também o ajuda na hora de criar empatia com um personagem ao qual ele dota de algo mais que superpoderes. Apesar disso, admite que a primeira vez que vestiu o traje de Thor não pôde evitar soltar um riso nervoso: “Eu me achava o tempo todo ridículo, pensava que ninguém iria gostar. E, ainda por cima, na primeira vez que o coloquei ficava pequeno em mim! De verdade, estava muito ridículo. O certo é que por um tempo me senti muito bobo”.
Depois de sete anos embutido em sua pele, o ator teve tempo para tudo, e por isso afirma que com Thor: Ragnarok chegou o revulsivo que o personagem pedia a gritos. “É bem diferente dos filmes anteriores e isso é algo de que precisava porque começava a ficar muito entediado com ele e comigo mesmo. Precisava de algo novo, não sentir que tudo era tão familiar. Voltar a me sentir assustado em um set, deixar minha zona de conforto e sentir que algo inesperado poderia acontecer a qualquer momento. Foi algo tão diferente que só posso estar agradecido ao diretor, Taika Waititi, por lhe dar esse ar tão fresco. Fez um trabalho realmente interessante e estou certo de que o filme vai surpreender muito.” Sobre o futuro, e apesar de já ter sido anunciada pelo menos uma sequela, ele se mostra prudente: “Contratualmente não tenho mais obrigações, mas dependerá do que me oferecerem. A verdade é que gostei tanto desta última filmagem que hoje não me importaria em absoluto de repetir. Mas vamos ver.”
Com sua personalidade apegada à terra, admite que nunca foi de relaxar com a leitura de quadrinhos de super-heróis. “Gostava do Superman, coisas assim, mas não muito mais.” Mas se hoje lhe dessem superpoderes teria bem claro o que faria: “Primeiro mudaria as coisas mais óbvias, daria com o martelo na cabeça de um ou outro ser humano e, claro, mudaria nossa atitude em relação ao planeta, nos resta muito pouco tempo. Mas, sobretudo, interviria na nossa forma de nos comunicar, tudo o que as redes sociais trouxeram de ruim. Tentaria fazer com que tudo se tornasse de novo um pouco mais lento, um pouco mais sério, que as coisas não fossem vistas somente como impactos do momento. Que as coisas deixassem de ser adoradas ou desprezadas sem uma gama de cinzas no meio. Gostaria de apagar tudo de ruim que essa forma simplista de ver o mundo trouxe.”
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