Melhora da economia ainda é torcida, não é o fim da recessão
Se investimento e consumo das famílias estão em queda, como mostrou o IBGE, a conta da recuperação econômica ainda não fecha
“Acabou a recessão...”, celebrou o presidente Michel Temer, minutos após o IBGE anunciar, nesta quinta-feira, que a economia cresceu 1% entre janeiro e março, após dois anos de uma queda acumulada de 7,2% do PIB. Será mesmo? Reza a cartilha econômica que o fim de um período recessivo só se confirma depois de dois trimestres de alta, o que demonstra que a avaliação do presidente, por ora, está mais para torcida do que para uma mudança consistente. O Governo tenta, a todo custo, fechar a crise política no quarto da bagunça e divulgar robustez na economia e sucesso das reformas em andamento, atenuando todos os contrários que acometem a realidade.
Se não, vejamos. O IBGE divulgou nesta quarta que 14 milhões de brasileiros estão fora do mercado de trabalho (13,6% de taxa de desemprego). Diante desses dados, quem está empregado opta pela cautela e canja de galinha temendo ser o próximo da fila. O cenário inquietante faz a população promover seu próprio ajuste fiscal doméstico, cortando gastos e adiando planos que requeiram o parco dinheiro.
Por consequência, quando o consumidor está reticente, as empresas deixam de investir, à espera de que o otimismo volte a entrar na casa das famílias. A chamada taxa de investimento, que é a proporção de quanto as empresas investem em comparação ao PIB, foi de 15,6% no primeiro trimestre, o menor para um trimestre desde 1995. Ou seja, projetos de aumentar produção, ou ampliar equipe de empregados estão na gaveta, à espera de que os clientes voltem a consumir.
Se nem empresas e nem consumidores entrarem na pista de dança, a valsa da recuperação econômica não acontece. Não existe milagre nesse sentido, e os dados detalhados do PIB mostraram isso. Os indicadores de oferta e demanda entre janeiro e março ainda são negativos, ainda que na proporção de ‘menos pior’ quando comparado ao mesmo trimestre do ano anterior. Alguns setores também registraram resultados pífios em abril, caso dos supermercados e das empresas aéreas.
O mesmo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, reconhece que o quadro só deve voltar a melhorar de fato com um novo Governo. “Quando chegar 2018-2019, haverá entusiasmo, e não interessa saber quem vem. Quando o Brasil eleger o próximo presidente, será porque pelo menos 60 milhões de pessoas se encantaram com uma ideia ou um projeto e a cabeça deles vai estar otimista e aí o ciclo virá”, disse ele à repórter María Martín. “Só que nós estamos torcendo para que alguma parte dessa virada possa ocorrer antes.”
O presidente e seus aliados insistem que as turbulências políticas vão continuar no sótão do país enquanto as reformas serão aprovadas a despeito da grita generalizada. Durante o Fórum de Investimentos Brasil 2017, o primeiro escalão do Governo se esmerou em apresentar um cenário de céu de brigadeiro. O presidente destacou a harmonia entre o Executivo e o Congresso nesse tema. “Foi a partir da construção desses consensos que conseguimos aprovar a reforma do teto dos gastos públicos”, afirmou Temer aos investidores. Consenso, este, do qual a população não esteve presente, pois como disse na mesma ocasião o presidente do Congresso, Rodrigo Maia, “nossa agenda é a agenda do mercado”.
Em tempo. As reformas são bem-vindas e necessárias. Até sindicalistas do Partido dos Trabalhadores já pregavam há alguns anos a necessidade de melhorar a legislação trabalhista. O que perverte esse quadro é a velocidade desesperada de aprovar as reformas sem que a sociedade se sinta partícipe desse processo.
Em conversa com o EL PAÍS, o economista Nelson Marconi, da Fundação Getúlio Vargas, coincide com essa avaliação. Para ele, a aprovação açodada das reformas eleva o risco para o próprio Governo. Atropelando etapas e alguns direitos, a qualidade das mudanças pode gerar a própria insegurança jurídica que o Governo tenta evitar.
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