Michel Temer, um ano de governo em meio à solidão
Presidente brasileiro insiste que não renunciará, apesar de viver sua pior crise política
A assombrosa capacidade do presidente Michel Temer de não renunciar ao cargo, apesar das formidáveis pressões nesse sentido, desencadeou um novo surto de desgosto no país. No Rio de Janeiro, milhares de pessoas protestaram, neste domingo, contra o presidente. O mesmo já tinha acontecido nessa cidade e em outras 18 na semana passada. As manifestações só agravam uma crise que começou com o rumor de que Temer tinha obstruído a Justiça, mas que agora inclui uma acusação da Procuradoria Geral da República, enquanto o Supremo Tribunal Federal avalia acusá-lo igualmente por corrupção. A influente Ordem dos Advogados do Brasil também apresentou seu próprio pedido de impeachment contra Temer. É o décimo terceiro no total. Mas se recusar a reagir é algo característico do atual presidente. Se existe alguma coisa com a qual Temer está acostumado é a ter problemas e, no fundo, só está lidando com sua pior crise política da mesma forma com que presidiu o país nos últimos 12 meses: de costas para o povo a e minimizando a gravidade de escândalos judiciais que o rodeiam.
Michel Miguel Elias Temer, de 76 anos, chegou ao poder em maio, quando o Senado abriu o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, da qual era vice-presidente e adversário ideológico. Frio e cerimonioso no aspecto pessoal e profundamente impopular no aspecto público, Temer se apresentou como um homem preocupado apenas com a dura crise econômica que o Brasil atravessa desde 2014. Sua obsessão, dizia, era fazer o trabalho sujo de impor medidas de austeridade e recuperar a nação. Duas greves gerais depois, conseguiu implementar um teto para os gastos públicos, mas não que o Legislativo aprovasse sua reforma trabalhista nem sua reforma previdenciária, seus dois grandes projetos. Ambas favorecem o Estado e os empresários e prejudicam o trabalhador, que deverá fazer –o Governo ainda não se rendeu– mais horas de trabalho (até 12 por dia) durante mais anos (49, para poder receber a aposentadoria integral). Menos de 9% do eleitorado acredita que sua gestão seja aceitável.
Seus maiores problemas não vêm do Legislativo, mas dos tribunais, empenhados em despojar a elite brasileira de sua gigantesca rede de corrupção. Durante seus primeiros seis meses no poder, Temer foi perdendo um ministro por mês em vários escândalos. Só então veio o pior: em abril, o Supremo Tribunal Federal tornou pública uma montanha de documentos em que executivos da empreiteira Odebrecht explicavam aos juízes como compravam um tratamento favorável de todos os políticos do país. Embora as acusações ainda não tenham sido provadas, foram as primeiras a atingir em cheio Temer e seu Governo: o procurador-geral escreveu que o presidente “capitaneava um núcleo político organizado” para captar subornos. Nesta semana, o STF publicou outra acusação dos executivos, no caso o grupo JBS, do setor de frigoríficos. Tais acusações ainda não foram provadas, mas nelas Temer é citado abertamente, ficando severamente comprometido. Um dos executivos lembra como o político se aproximou dele um dia para exigir-lhe um milhão de reais em dinheiro.
Seus problemas seriam menos complicados se ao menos tivesse o apoio do povo. Mas Temer não ganhou as eleições –seus detratores enfatizam que não conseguiria– e muitos brasileiros o consideram ilegítimo. Durante esses meses foi um presidente recluso, distante das massas e incapaz de realizar eventos com público. Quando abriu os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em agosto, enterrou sua intervenção no fim da cerimônia e reduziu-a a dez segundos: mesmo assim não chegou ao fim sem que irrompessem as vaias. “Fora Temer” deixou de ser o grito de guerra dos adversários do impeachment para ser o leitmotiv dos concertos, das pichações e das manifestações nas ruas brasileiras. Nas poucas tentativas de mostrar seu lado humano não se saiu muito bem. No Dia Internacional da Mulher exaltou o papel da mulher na economia, porque “ninguém é capaz de melhor detectar as flutuações dos preços no supermercado”. Foi um escândalo, assim como quando, pouco depois, explicou que um governo precisa de “um marido” que o controle para que não gaste demais.
Na segunda-feira, o jornal Folha de S.Paulo publicou uma entrevista com Temer em que era possível intuir como havia evoluído sua relação com a realidade nos últimos dias. Nela, argumentou que, se concordou em se reunir com os executivos corruptores do império de frigoríficos JBS, que hoje são seus principais acusadores, foi porque achou “que fosse por questão da [Operação] Carne Fraca”, escândalo que atingiu o mundo no final de março. A reunião, infelizmente, aconteceu mais de uma semana antes do súbito início daquela crise.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.
Mais informações
Arquivado Em
- Impeachment Michel Temer
- Senado Federal
- Operação Lava Jato
- Impeachment Dilma Rousseff
- JBS
- Partido dos Trabalhadores
- Dilma Rousseff
- Crises políticas
- Impeachment
- Michel Temer
- Câmara Deputados
- Subornos
- Destituições políticas
- Presidente Brasil
- Congresso Nacional
- Presidência Brasil
- Atividade legislativa
- Governo Brasil
- Brasil
- Parlamento
- Partidos políticos
- Governo
- Conflitos políticos
- Empresas
- Economia