Temer ignora o ‘furacão Fachin’ de olho nas reformas, mas Congresso hesita
Presidente diz que o Legislativo não pode parar, mas Câmara e Senado interrompem as sessões do dia
O Brasil se prepara para assistir ao relato minucioso de como sua cúpula política se deixou corromper de modo sistemático nas duas últimas décadas. O país viverá a Semana Santa sob o impacto da divulgação da delação do fim do mundo, as confissões de 78 ex-executivos de uma das maiores construtoras da América: a Odebrechet. Mas o presidente Michel Temer tenta ignorar a tempestade causada pela divulgação dos nomes na mira do ministro Edson Fachin, relator da operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal. Não prevê adotar medidas contra seus oito ministros que serão investigados por corrupção e até pretende acelerar seu impopular programa de reformas.
A Câmara dos Deputados e o Senado, porém, interromperam nesta quarta-feira suas sessões previstas. Os representantes do povo ainda não tinham se recuperado do impacto da bomba que todos esperavam havia semanas e que caiu inesperadamente na tarde de terça-feira: a lista de 108 políticos com foro privilegiado que o Supremo Tribunal irá investigar com base nas confissões dos antigos executivos da construtora Odebrecht. A notícia chegou em plena sessão da Câmara e os deputados se lançaram de imediato sobre seus telefones para consultar a lista. Alguns dos incluídos até reagiram com humor, como o deputado Paulo Pereira da Silva, mais conhecido em sua base eleitoral de São Paulo como “Paulinho da Força”, que fez piada, diante dos jornalistas: “Quem tem de se preocupar é quem não está na lista. Isso é um desprestígio”.
Entre os acusados de ter recebido subornos ou doações ilegais da Odebrecht em troca de contratos ou leis que favorecessem a construtora não falta, na realidade, quase ninguém que tenha sido alguém no Brasil nas duas últimas décadas: oito ministros, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes dos dois principais partidos do Governo, 12 dos 27 governadores dos Estados e quatro dos últimos cinco presidentes – Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor de Mello. O quinto ex-presidente, que está vivo, José Sarney, também é acusado em outra ramificação dessa macrotrama conhecida como Operação Lava Jato.
Dois anos depois desse escândalo de corrupção irromper, com origem nos supostos subornos pagos por empresas em troca de contratos com a petroleira estatal Petrobras, todo o sistema político brasileiro cambaleia. Até 15 partidos, da direita liberal aos comunistas, têm dirigentes envolvidos. O PT, de Lula e Rousseff, foi a princípio o mais golpeado. O clima político criado pelo escândalo –e mais a crise econômica– foi o caldo de cultivo para o impeachment, no ano passado, de Rousseff, embora tivesse sido apresentado como motivo legal a maquiagem das contas públicas.
Agora, os instigadores de sua destituição estão também sob suspeita, incluindo o PSDB, do atual prefeito João Doria Jr., um dos nomes que crescem na bolsa de aposta dos presidenciáveis. Além de Aécio Neves, presidente da legenda, o mentor de Doria, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, também teve um pedido de inquérito por supostamente ter recebido milhões em contribuição de campanha eleitoral.
O pior, entretanto, ainda pode estar por vir. O Supremo entregou nesta quarta aos meios de comunicação os arquivos com as confissões completa dos executivos da Odebrecht, incluindo registros de áudio e vídeo que contêm o relato pormenorizado de duas décadas de compadrio com a elite política do país. Embora o Supremo previsse torná-los públicos na próxima semana, o vazamento, na terça-feira, para o jornal O Estado de S. Paulo o obrigou a antecipar a divulgação. Um certo alívio para o Governo, já que as férias da Semana Santa podem amortizar os efeitos do espetáculo.
As mensagens que chegam do entorno de Temer são de que o presidente nem vai mudar seu Governo nem vai desistir de seus planos, na confiança de que o percurso judicial do caso será longo. Na noite de terça-feira transmitiu a alguns dirigentes políticos que pretende continuar e até mesmo acelerar seu programa de reformas, das quais a mais imediata é da Previdência. “Não podemos paralisar a atividade legislativa”, declarou o presidente nesta quarta-feira. Os mercados parecem confiar nele, e a Bolsa de São Paulo mostrou poucos sinais de inquietação. Bem ao contrário dos deputados da base da maioria governamental, temerosos de que ao desgaste pela corrupção se some a um eventual apoio a uma reforma da previdência que tem grande rejeição popular.
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