Procuradora-geral da Venezuela denuncia a “ruptura da ordem constitucional”
ONU pede ao Supremo, em poder do chavismo, que reconsidere sua decisão de destituir o Parlamento
A Procuradora-Geral da Venezuela, Luisa Ortega, próxima ao Governo de Nicolás Maduro, denunciou nesta sexta-feira que as sentenças do Supremo que destituem a Assembleia Nacional (o Parlamento) significam uma “ruptura da ordem constitucional”. A manobra do alto tribunal – controlado pelo chavismo –, chamada de “golpe de Estado” pela oposição, desatou protestos em vários pontos do país e também o repúdio de órgãos internacionais como a Organização de Estados Americanos (OEA) e a ONU. O Peru retirou seu embaixador e a Colômbia chamou o seu para consultas. O Mercosul convocou uma reunião de emergência no sábado para tratar da “grave situação institucional” no país.
“Nas sentenças 155 e 156 da Sala Constitucional do TSJ [que retiram o poder da Assembleia Nacional] se evidenciam várias violações da ordem constitucional e desconhecimento do modelo de Estado consagrado em nossa Constituição”, reconheceu a procuradora Ortega, no cargo desde 2007 e com mandato até 2020. “É minha obrigação manifestar ao país minha grande preocupação por tal evento”, disse na sexta-feira em Caracas, onde se afastou da linha oficial do chavismo, que se manteve em silêncio diante da crítica internacional e se limitou a emitir um comunicado no qual denuncia uma “investida” da “direita intolerante e pró-imperialista dirigida” pelos Estados Unidos para “atentar contra o Estado de Direito” através de “falsidades e ignomínias”.
A decisão do Supremo Tribunal tomada na noite de quarta-feira, que com o argumento de “desacato” da Assembleia – perdeu suas funções por três deputados cujos cargos haviam sido impugnados por irregularidades ocuparem seus postos – despertou a tensão na Venezuela. A oposição está se mobilizando contra o ocorrido e afirmou que prepara uma forte reação nas ruas. Enquanto isso, ocorreram pequenos e espontâneos protestos em vários pontos do país e uma mobilização de estudantes em Caracas, onde se produziram distúrbios com a polícia, que prendeu pelo menos duas pessoas.
Além disso, um grupo de deputados da oposição se manifestou diante da sede do Supremo, no centro de Caracas. “Precisamos sair, protestar e lutar por nossos direitos... A Venezuela enfrentará dias muito difíceis”, afirmou ao canal VivoPlay Carlos Paparoni, um parlamentar agredido durante a mobilização, reprimida por militares e seguidores do chavismo. A jornalista da Radio Caracol Colombia, Elyangélica González, também denunciou a agressão por parte da Guarda Nacional Bolivariana (Polícia Militar) enquanto cobria os protestos. Um ataque que preocupa o Governo da Colômbia, que emitiu um comunicado no qual expressa seu “repúdio” ao que considera um “ataque ao livre exercício da liberdade de expressão”.
Há anos o Governo de Maduro é questionado por se afastar dos modelos democráticos. A perseguição e prisão de opositores, a suspensão de um referendo para retirá-lo do poder, a manipulação do Supremo e do Poder Eleitoral se destacam como os principais sinais de autoritarismo. E agora o ataque à Assembleia Nacional despertou enorme preocupação.
Críticas internacionais
O alto comissário de Direitos Humanos da ONU, Zeid Ra’ad al Hussein, pediu que o Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela “reconsidere” sua resolução contra a Assembleia Nacional. O representante das Nações Unidas expressou sua “grave preocupação” pelo ocorrido na Venezuela e frisou que “a separação de poderes é essencial para que a democracia funcione”.
“A população venezuelana tem o direito a participar nos assuntos públicos mediante representantes eleitos livremente, tal como estabelece o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos”, alertou o alto comissário da ONU em um comunicado onde frisou que os deputados devem ser capazes de exercer as responsabilidades outorgadas pela Constituição. “Manter os espaços democráticos abertos é essencial para garantir que os direitos humanos estarão protegidos”, disse.
A Argentina convocou para a manhã de sábado uma reunião urgente de chanceleres do Mercosul para analisar a “grave situação institucional” atravessada pela Venezuela. A reunião, que analisará “possíveis vias de solução”, ocorrerá previsivelmente em Buenos Aires. Os ministros das Relações Exteriores da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai – os países fundadores do Mercado Comum do Sul (Mercosul) – suspenderam a Venezuela como Estado membro do Mercosul em 1 de dezembro, acusada de não cumprir seus compromissos comerciais e políticos com o bloco, o que Caracas nega.
Além disso, Luis Almagro, secretário-geral da Organização de Estados Americanos (OEA), pediu a convocação de uma sessão urgente sobre a situação na Venezuela sob o artigo 20 da Carta Democrática Interamericana. Almagro pede uma sessão de “apreciação coletiva da situação” e que “se adotem as decisões consideradas convenientes”, de acordo com a carta de petição a qual teve acesso a agência Efe.
Na quinta-feira, entre uma avalanche de críticas internacionais ao Governo de Nicolás Maduro, o presidente argentino Mauricio Macri fez um chamado à “recomposição da ordem democrática” na Venezuela e insistiu na necessidade de que se cumpra um calendário eleitoral, informou em um comunicado. Macri recebeu Lilian Tintori, esposa do líder oposicionista venezuelano Leopoldo López, atualmente preso, a quem “manifestou sua preocupação pela dissolução da Assembleia Nacional”.
É mais uma das críticas internacionais recebidas pelo Governo de Maduro por sua última manobra, que o presidente da Eurocâmara, Antonio Tajani (Partido Popular Europeu), chamou de “retrocesso democrático”. A Colômbia se mostrou seriamente preocupada pela deriva do país vizinho. No começo de sexta-feira convocou seu embaixador na Venezuela para que ele “informe” sobre a situação. O chanceler paraguaio, Eladio Loizaga, disse na sexta-feira que ocorreu na Venezuela um “rompimento absoluto do Estado de Direito” e que os países do Unasur trabalham para emitir um comunicado de condenação pelo ocorrido na quarta-feira, quando o Supremo Tribunal assumiu as funções do Poder Legislativo.
“Isso é um rompimento absoluto do Estado de Direito”, disse Loizaga aos jornalistas durante a inauguração do Foro Empresarial em Assunção, um dos eventos da reunião anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.