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João Saboia | Economista e professor da UFRJ

“O desemprego ainda vai aumentar neste ano antes de começar a cair”

Segundo o economista, apesar da forte recessão da economia e a alta taxa de desocupação, não houve uma piora na distribuição de renda do trabalho

João Saboia, economista e professor da UFRJ.
João Saboia, economista e professor da UFRJ. Mauro Pimentel

O Brasil registrou, no fim do ano passado, um número recorde de desempregados, somando um total de 12,342 milhões de pessoas em busca de uma vaga. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, publicada no fim de janeiro, só nos últimos três meses do ano houve uma alta de 36% no número de desempregados em relação ao mesmo período de 2015, o que significa  cerca de 3 milhões de brasileiros a mais na fila do desemprego. Os dados refletem o tamanho da recessão econômica que o país ainda atravessa. As notícias para os próximos meses tampouco são animadoras. O assunto ganhou urgência para o Governo Temer, que tem anunciado todas as suas reformas como imprescindíveis para garantir a melhora da economia, e por consequência, do mercado de trabalho.

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Nos dados recentes divulgados sobre o desemprego, um único dado positivo chama a atenção do economista João Saboia. Ele avalia que apesar da recessão e alta taxa de desocupação, ainda não houve uma piora na distribuição da renda do trabalho no país.

Pergunta. Qual a perspectiva do desemprego para este ano?

Resposta. A nossa taxa de desemprego vem registrando índices muito ruins há dois anos e, mesmo que este ano exista alguma expectativa de uma leve melhora na economia, tudo está muito incerto ainda. É difícil falar neste momento sem uma informação concreta, mas até agora não houve nenhuma melhora significativa. Minha expectativa é um mercado de trabalho ainda pior do que 2016 e 2015, pelo menos até haver alguma sinalização de retomada econômica. Mas não acredito que será uma piora significativa como foi a dos últimos dois anos. Em 2016 já piorou muito, caiu muito, é difícil continuar nesse ritmo. Mas provavelmente ainda vamos ter o aumento do desemprego no início deste ano.

P. Quais setores ainda devem fazer mais cortes?

R. Quem começou a sofrer mais no início da crise foi a indústria, especialmente de transformação, seguido pelo setor da construção civil. O último setor a sentir o impacto da crise foi o que mais gera emprego: o terciário, especialmente o setor de prestação de serviços. Então, mesmo que a indústria talvez seja o primeiro setor a reagir, a capacidade de geração de emprego da indústria é limitada. Cerca de dois terços dos empregos no país é do setor terciário. A recuperação, quando vier, vai atingir os vários segmentos da economia, até porque a própria indústria demanda serviços.

P. Esses dois anos de aumento forte do desemprego já está gerando um impacto para a desigualdade de renda e para a precarização do trabalho?

R. Nos últimos anos, o movimento de distribuição de renda foi de melhora. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015 mostrou ainda que, mesmo com a crise econômica, esse movimento não se inverteu. A vantagem desse levantamento é que ele pega todas as rendas e é a melhor maneira de se avaliar a distribuição de renda. E mesmo quando você olha a PNAD Contínua até o terceiro trimestre do ano passado, que analisa só a renda do trabalhador, você confirma que não houve piora da distribuição de renda do trabalho. O que ela mostra é que, para as pessoas que continuam ocupadas, a renda não piorou. O que é um dado positivo. A minha primeira expectativa era de que o movimento tivesse invertido diante da crise. Ele perdeu força, mas não inverteu.

P. Por que não inverteu?

R. Acho que não houve uma mudança porque temos muitos mecanismos de transferência de renda na economia brasileira que estão protegidos pelo salário mínimo. E sabemos que o salário continuou protegido contra a inflação nesse período todo. Todas as pessoas, por exemplo, que recebem aposentadoria e pensões estão protegidas de não ganhar menos que um salário mínimo. Isso também vale para quem permaneceu no mercado de trabalho. Essas pessoas têm garantido um salário mínimo, mesmo que haja pessoas que ganhavam mais e não conseguiram manter o seu salário - ou porque perderam emprego ou porque não negociaram reajuste de salário bom na sua empresa. Ou seja, as pessoas de baixa renda conseguiram pelo menos o salário mínimo e quem ganha mais e não conseguiu o reajuste acabou contribuindo para a distribuição da renda não ter piorado.

P. Além da retomada da economia, você acha que há alternativa para aquecer novamente o mercado de trabalho?

R. O governo tentou aquele Programa de Proteção ao Emprego, mas o volume de empresas que quiseram aderir foi pequeno, voltado principalmente para o setor da indústria. O Governo está apostando, agora, nessa retirada do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para quem tem conta inativa desde 2015, já que isso poderia reativar a economia e portanto, reaquecer o mercado de trabalho. Acho, entretanto, que essa retomada vai vir muito devagar, porque estamos num quadro recessivo com uma capacidade ociosa enorme. Antes de novos investimentos, essa capacidade ociosa deve ser utilizada. Por essas e outras que a retomada deve vir muito lentamente e a do mercado de trabalho também. O desemprego ainda vai aumentar antes de reagir e cair. Para voltar ao patamar da economia e do mercado anterior a 2014, levaremos alguns bons anos.

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